Aldo Janotti mostra que a estrutura agrária e o baixo nível
de instrução do clero português acabou condenando a Universidade de Lisboa fundada
por D. Diniz em 1290 a um isolamento das demais universidades e uma existência
intelectual apagada: “Portugal partiu para a descoberta geográfica do mundo
sem antes ter completado a descoberta intelectual da Europa”.[1] Para Aldo Janotti faltou a Portugal as condições sociais e econômicas
adequadas para integrar Portugal à Europa. Não houve renascimento urbano e a
ascenção do comércio que se observa a partir de Afonso III (1248-1279) esteve
sempre ligado a produtos agrícolas (azeite, cera, cortiça, mel, vinho, peles, frutas,
cevada e trigo). Vários concelhos
mantinham normas proibindo a exportação de pão e carne destinados ao consumo de
Lisboa ou a importação de produtos que a própria localidade produzia, o que
impedia um maior desenvolvimento do comércio. Na feira de Viana cuja concessão
foi outorgada por D. Dinis em 1286, os moradores da região ficavam proibidos de
comprar ou vender para outras feiras. Uma lei de D. Fernando de 1375 proibia
comerciantes estrangeiros de realizar qualquer operação de comércio em Portugal
exceto nos portos de Lisboa e Algarve. A indústria de panos conservará sua
característica de indústria doméstica, monopolizada pelas mulheres, destinada a
atender as necessidades locais. A exportação de panos de cor era proibida por
carta régia de 1254, sinal do reduzido quantitativo de produção. [2]
Oliveira
Marques mostra que o desenvolvimento de Lisboa no século XIII caracteriza o
final da Idade Média em Portugal
acompanhando o desenvolvimento do comércio com Londres seu principal
ponto de destino, Flandres e outras cidades europeias. As exportações
portuguesas consistiam em fruta, sal, vinho, azeite e mel principalmente ao
passo que de Londres e Flandres Portugal recebia principalmente têxteis[3]. A
primeira regulamentação dos ofícios em Portugal data de 1489, numa época em que
as guildas europeias já estavam em declínio, o que se explica segundo Marcelo
Caetano diante do incipiente desenvolvimento da indústria em Portugal.[4] Gama
Barros duvida que antes do século XVI
possam ter existido em Portugal corporações de ofícios, o que leva Aldo
Janotti conciur que não havia uma burguesia mercantil medieval, pois os
mercadores que existiam na época
estiveram longe de ser a classe mais numerosa da sociedade, o que revela
o arcaísmo social português, sem grandes núcleos urbanos (exceto por Lisboa e
Porto), ao colocar a economia portuguesa em atraso quando comparada com outras
economias medievais de sua época como a francesa ou italiana: “na realidade
a burguesia medieval portuguesa não seria um fato histórico e sim um fato
historiográfico. Não teria existência temporal, e sim existência livresca”.[5] Segundo
Costa Lobo: “nos princípios do século XV, Portugal pode descrever-se como um
vasto matagal, entressachado, afora algumas cidades e vilas, de pequenas
povoações, circundadas de breves arroteas”. Para Aldo Janotti este será um
elemento crucial faltante que terá impacto no desenvolvimento da Universidade
de Lisboa. **
Outros
historiadores, contudo, entendem que havia em Lisboa uma burguesia mercantil nascente
que teve um papel importante nos descobrimentos. Luís de Albuquerque mostra que
a criação de mercados começou a ser encorajada por Afonso III (1269) em
diversas localidades impulsionando o comércio interno de modo que já em 1282 há
registros de comerciantes portugueses em Flandres e algumas praças inglesas[6]. A
revolução de 1383 será a pedra de toque que marca o prestígio desta burguesia
mercantil: “ao iniciar-se o século XIV
a burguesia comercial está no vértice do seu poder, enriquecida e
próspera”.[7] A Casa dos Vinte e Quatro (figura) foi criada em 16 de dezembro de 1383, por D. João,
Mestre de Avis (futuro D. João I) com o objetivo de permitir que os mesteiraes
(termo do português medieval referindo-se aos mestres da corporação[8]) participassem
no governo da cidade elegendo um presidente chamado Juiz do Povo.[9] Entre os
vinte e quatro representantes em Lisboa e no Porto eram nomeados quatro deles,
os procuradores dos mesteres para representar os interesses da
corporação no Conselho Municipal com direito de voto[10]. O
termo mesteirais designa, na sociedade portuguesa medieval, um grupo de artífices
dentro de uma postura corporativista, profissional e organizada, dentro de
trabalhos artesanais, também chamado de corporação de ofício. A origem provém
dos povos godos pelo qual é o mister ou ofício que define a condição servil,
de modo que os servos eram designados ministeriales de onde teria origem
o termo mesteirais.[11]