domingo, 28 de fevereiro de 2021

Lagar de azeite

 

Um lagar de azeite encontrado na vila de Pyrgos no Chipre data da Idade do Bronze (2500–2000 aC) onde se pode observar uma prensa primitiva para amassar as azeitonas. Lagar é o local onde se pisam frutos para separar sua parte líquida da massa sólida, como as azeitonas para fazer azeite ou as uvas para elaborar vinho. Tales de Mileto (624-548 a.c.) alugou todos os lagares das cidades de Mileto e Chio tendo pago pouco pelo aluguel porque porque ninguém oferecera preço melhor e ele dera algum adiantamento, segundo testemunho de Aristóteles em A política. Com isso Tales faturou um bom dinheiro cobrando dos produtores de azeitona um preço elevado e conseguindo grande fortuna na operação. Aristóteles conclui: “Em geral, o monopólio é um meio rápido de fazer fortuna. Assim, algumas cidades, quando precisam de dinheiro, usam desse recurso. Reservam-se a si mesmas a faculdade de vender certas mercadorias e, por conseguinte, de fixar seus preços como querem [,,,] É bom que os que governam os Estados conheçam esse recurso, pois é preciso dinheiro para as despesas públicas e para as despesas domésticas, e o Estado está menos do que ninguém em condições de dispensá-lo.” O poeta grego Antíparo, elogiava a invenção do moinho hidráulico para moagem de cereais como libertadora de escravas e criadora da Idade do Ouro.[1] O geógrafo grego Estrabão (63 a.c. a 24 a.d.) registra a presença de um moinho d’água em Cabira no palácio de Mitridates, rei do Ponto no século I a.c.[2]. Vitrúvio (81 a.c. a 15 a.c.) elogia Arquitas como um exímio construtor de máquinas. [3] No Novo testamento A palavra Getsêmani significa “lugar do lagar de azeite”. Ausonius em Mosella escrito em 369 descreve o uso de um moinho para moer grãos [4] e para cortar mármore perto de Tréveri, embora David Lynn e Frances Gies questionem a autenticidade deste trabalho [5]. Ausonius descreve o moinho poeticamente como cerealia saxa em sua função de moer cereais.[6]



[1] MARX, Karl. O capital, livro I: o processo de produção do capital,São Paulo:Boitempo, 2013, p.481

[2] GIMPEL, Jean. A revolução industrial da Idade Média, Rio de Janeiro:Zahar, 1977, p.14

[3] SEDGWICK, W.; TYLER, H; BIGELOW, R. História da ciência: desde a remota antiguidade até o alvorescer do século XX, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1952, p.71

[4] DERRY, T.; WILLIAMS, Trevor. Historia de la tecnologia: desde la antiguidade hasta 1750, Mexico:Siglo Vintuno, 1981, p.242

[5] WHITE, Lynn. Medieval technology & social change. Oxford University Press, 1964, p.83; SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.II, Oxford, 1956, p.31; FINLEY, Moses. Economia e sociedade na Grécia antiga, São Paulo:Martins Fontes, 2013, p. 208; GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 35

[6] SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.II, Oxford, 1956, p.597, 600



Jeronimo de Albuquerque e os Cavalcanti

 

Em Pernambuco o primeiro engenho de açúcar foi o de Jerônimo de Albuquerque cunhado do donatário Duarte Coelho.[1] Jerônimo de Albuquerque ficou conhecido como o “Adão pernambucano” por ter reconhecido vinte e quatro filhos em 1584 muitos filhos da índia Maria do Espírito Santo Arco Verde ou Muyrã-Ubi, que Charles Boxer compara com a Pocahontas da Virgínia. [2] Jerônimo de Albuquerque foi casado com Felipa de Melo e teve como uma de suas filhas Catarina de Albuquerque e Melo que casou com Filipe Cavalcanti, fidalgo de Florença da qual descendem os Cavalcanti de Pernambuco. [3]

[1] GOMES, Laurentino. Escravidão, v.I, São Paulo: Globo, 2019. p.317

[2] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 107

[3] PITA, Sebastião da Rocha. História da América portuguesa. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976 https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/574177/000970492_Historia_America_portuguesa.pdf



Escrita maia

 

A escrita maia era pictográfica mas que incorpora uma parte fonética. Os maias conheciam a escrita hieroglífica [1]. Dos escritos maias restam apenas o Codex Dredensis/Dresden da região do norte da Guatemala, o códice de Paris de Chiapas, o código de Madrid [2] e o de Yacatán [3], o códex Peresianus e os códices Troano (guardado no Museo de America em Madrid) e Cortesianos.[4] O bispo de Yucatán (1524-1579) Diego de Landa analisou a escrita maia fazendo a transcrição com a língua castelhana, por exemplo a, b, c correspondem aos sons ah, bay, say representados por meio de símbolos maias.[5] Segundo Beuchat “os caracteres maias se compõem de agregados de pequenos sinais de forma quadrada com os cantos arredondados, com o que se parecem pequenos seixo” (por isso conhecidos como escrita calculiforme). [6] Em 1882 Cyrus Thomas demonstrou que a forma correta de se ler os hieróglifos maias é de cima para baixo em colunas dois a dois e da esquerda para a direita. [7] Eric Thompson demonstrou a existência de mais de 300 glifos maias.[8] A análise do alfabeto maia feita por Yuri Knorosov a partir dos textos do bispo Landa mostra mais de um mesmo símbolo para um fonema, de modo que qualquer sinal pode ter tantas referências quanto as imaginadas pelo sacerdote, único capaz de interpretar os símbolos sagrados de modo que trata-se de uma escrita muito mais ritualística do que linguística o que guarda muitas semelhanças com a escrita egípcia. Trata-se de um sistema logográfico misto combinando elementos fonéticos e semânticos.[9] Os glifos maias representam sílabas ou combinações de som acrescidas de ideogramas par remover ambiguidades.[10] Filólogos posteriores como Floyd Lounsbury parecem confirmar as teses de Knorosov de que muitos glifos maias representam sílabas que podem ser combinados para formar palavras que não necessariamente refletem a soma dos símbolos individualizados.[11] Segundo o Código Dresden [12] do norte da Guatemala o deus Itzamná é representado como um homem envelhecido inventor da escrita e patrono da aprendizagem e das ciências. Além dos deuses haviam patronos das classes e das profissões como caçadores, mercadores, agricultores, pescadores entre outros. O Código Dresden relata rituais, histórias e cantigas maias, e teria sido escrito segundo Knorosov no período tolteca maia de Chichen Itzá [13] capital maia a partir de 1000 d.c [14], último baluarte da civilização maia. A escadaria hieroglífica em Copán em Honduras foi construída em 770 d.c. tem 63 degraus cada um com trinta centímetros de altura e gravações com 2500 hieróglifos.[15] Em Copán os arqueólogos John Loyd Stephens e Frederick Catherwood descobriram em 1839 diversas colunas maias ornamentadas com inscrições em hieróglifos. [16] Copán era a capital astronômica do velho império maia, em que foram encontrados em um baixo relevo uma representação de um encontro de sacerdotes astrônomos em 6 caban 10 mol do calendário maia, que corresponde a 2 de setembro de 503 d.c. [17] O Templo dos Guerreiros em Chichen Itzá dos maias usa técnicas puuc e denuncia influência de tempos toltecas como a pirâmide de Xochicalco em Monte Albán. [18]


[1] MacGREGOR, Neil. A história do mundo em 100 objetos, Rio de Janeiro:Intrínseca, 2013, p.374; GOWLETT, John. Arqueologia das primeiras culturas. Barcelona:Folio, 2008, p.190

[2] LONGHENA, Maria. O México antigo, Barcelona:Folio, 2006, p. 110

[3] SANTOS, Yolanda Lhuillier dos. Convite à Ciência. São Paulo:Logos, 1965, p.110

[4] CERAM, Walter. Deuses, túmulos e sábios, Rio de Janeiro:Bib. Exército, 1971, p.316

[5] HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.50

[6] TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 41

[7] HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.59

[8]  HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.329

[9] COE, Michael, Os maias, Editorial Verbo:Lisboa, 1968, p.175

[10] MEGGERS, Betty. América pré histórica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979, p. 87

[11] HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.69, 330, 331

[12] FAGAN, Brian. Los setenta grandes inventos y descobrimentos del mundo antiguo, Barcelona:Blume, 2005, p. 232

[13] COE, Michael, Os maias, Editorial Verbo:Lisboa, 1968, p.155

[15] LONGHENA, Maria. O México antigo, Barcelona:Folio, 2006, p. 51

[16] BAITY, Elizabeth Chesley. A América antes de Colombo. Belo Horizonte:Itatiaia, 1963, p.160; COE, Michael. Antigas Américas, mosaico de culturas, v. I Madrid:Ed. Del Prado, 1997, p. 125; LEONARD, Joathan. América pré colombiana, Rio de Janeiro:José Olympio Editora. Biblioteca de História Universal Life, 1971, p.48

[17] CERAM, Walter. Deuses, túmulos e sábios, Rio de Janeiro:Bib. Exército, 1971, p.305

[18] BRION, Marcel. A ressurreição das cidades mortas, Rio de Janeiro:Ferni, 1979, p.170

[19] CERAM, Walter. Deuses, túmulos e sábios, Rio de Janeiro:Bib. Exército, 1971, p.386; HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.282



Calendário asteca

 

Os astecas usavam dois calendários, o primeiro tonalpohualli / tonalpouali ("contagem dos dias") de 260 dias divididos em vinte semanas de treze dias cada e um (mostrado no Códice Bourbônico [1]). Cada dia era provido de um signo e de um algarismo que se continuava a usar as datas do ano solar de 360 dias, desta forma, em 72 anos de 260 dias teremos um total de 18720 dias que correspondem a 52 anos de 360 dias, repetindo-se, portanto, o ciclo a cada 52 anos solares de 360 dias. O  segundo calendário Xiuhpohualli (calendário solar) era constituído de 18 períodos de 20 dias cada com um período extra de cinco dias conhecido como aziago. Desta forma os astecas contabilizavam ciclos solar de 52 anos de 365 dias [2] Os astecas não possuíam relógios, clepsidras ou quadrantes solares.[3] Os povos mesoamericanos tinham o conhecimento do ciclo venusiano em 584 dias.[4] O grande calendário de pedra construído por Axayacatl em 1479 demonstra o conhecimento dos astecas em astronomia.[5] O Códice Tovar, atribuído ao jesuíta mexicano Juan de Tovar de 1585, contém informações detalhadas sobre os ritos e cerimônias dos astecas (também conhecidos como mexicas) e inclui um calendário civil asteca com os meses, semanas, dias, letras dominicais e festividades religiosas de um calendário cristão de 365 dias. O calendário solar asteca de 365 dias conhecido como Xiuhpohualli era dividido em 18 períodos de 20 dias, sendo cada período chamados cempuali, seguidos do nemontemi que eram os últimos cinco dias do calendário que encerravam o ano e eram considerados dias de mau agouro e por este motivo não se trabalhava nestes dias [6]. Cada cempuali era dividido em 4 períodos de cinco dias, perfazendo o equivalente a quatro semanas: cali, rechtli, aatli e tecpatli. A ilustração do Código Tovar da terceira seção descreve um mês asteca, e mostra na parte superior uma imagem de um homem com seu torso de escama de peixe e pluma de quetçal, de pé na água e segurando um talo de milho e um vaso, provavelmente indica que o mês mostrado aqui seja o sexto mês, Etzalcualiztli (Refeição de milho e feijões). Hyatt Verril em “Old Civilizations of the New World” tendo em vista a semelhanças entre ao calendários astecas e maias, sugere que ao calendário maia por ser de uma civilização mais antiga possa ter de alguma forma servido de base ao calendário asteca, no entanto o calendário zapoteca, anterior tanto ao calendário asteca como maia, contém elementos comuns aos dois calendários.  

[1] LONGHENA, Maria. O México antigo, Barcelona:Folio, 2006, p. 74

[2] Instituto Nacional de Antropologia e História. Guia Oficial do Museo Nacional de Antropologia, Mexico:Inah Salvat, 1998, p.104; COE, Michael. O México. Lisboa:Editorial Verbo, 1970, p.96, 172; DAVIES, Nigel. The astecs: a history, London; Folio Society, 1973, p. 31; Guia dos segredos do império: o povo asteca, Barueri:On Line, 2016, p. 67

[3] SOUSTELLE, Jacques. A vida quotidiana dos astecas. Belo Horizonte:Itatiaia, 1962, p.212

[4] TATON, René. A ciência antiga e medieval: a Idade Média. São Paulo:Difusão, 1959, p. 14

[5] TOTH, Max; NIELSEN, Greg. A força das pirâmides, São Paulo:Record, 1976, p.42

[6] Guia dos segredos do império: o povo asteca, Barueri:On Line, 2016, p. 67; TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 37



Triaga Brasilica

 

Os missionários jesuítas cultivavam plantas medicinais e faziam a manipulação de medicamentos. A triaga brasílica, composta por elementos da flora nativa  ganhou fama internacional devido á difusão pelos jesuítas do medicamento.[1] Bruno Leite argumenta que os jesuítas, formados na tradição escolástica e embuídos da influência humanista, como destacam François Dainville e Serafim Leite, souberam agregar novos conhecimentos que levaram ao desenvolvimento da triaga brasílica que, desta forma, não pode ser entendida como a mera reprodução de conhecimentos indígenas e tampouco o resultado de um empirismo puro da parte dos jesuítas. A Triaga Brasílica era uma versão atual da antiga Teriaca / Teriaga / Theriaga inventada pelo médico pessoal do imperador Nero, Andrômaco, difundida por Galeno e lembrada por Avicena no seu Canon. Contudo, muitos dos ingredientes do remédio não erm descritos de forma precisa no poema de Andrômaco e nos cometários de Galeno o que suscitou a busca de equivalentes pelas boticas europeias, de modo que dentro desta perspectiva, os jesuítas buscaram substituições na flora brasileira entre as quais o jaborandi, a pagimirioba, a ipecacuanha, a angélica, a pindaíba e o bálsamo. O padre Serafim Leite, nos seus estudos sobre a ordem jesuítica no Brasil, encontrou, nos arquivos da Companhia de Jesus em Roma o manuscrito de 1766, Colleção de várias receitas e segredos particulares das principaes boticas da nossa Companhia de Portugal, da India, de Macao, e do Brazil, que descreve a fórmula original da triaga brasílica do Colégio dos jesuítas da Bahia. Segundo Bruno Leite: “A criação (inventio) do novo medicamento pelos jesuítas dependeu inteiramente da tradição médica, fortemente humanista, que eles haviam trazido consigo da cultura dos médicos europeus. O nome do remédio, os ares de sua composição e as tonalidades de seus ingredientes comprovam isto. Mas, por outro lado, esta invenção não foi serva da tradição, na medida em que estes elaboraram uma nova lista de ingredientes que fosse mais condizente com os problemas e as necessidades vividas pelos jesuítas no Brasil”.[2] Segundo Lourival Ribeiro no livro Medicina no Brasil Colonial: “A triaga Brasílica é um atídoto ou panaceia composta à imitação da Triaga de Roma e de Veneza, de várias plantas e ervas, raízes e drogas do Brasil” com inúmeras aplicações no tratamento contra venenos de animais peçonhentos, dores no estômago, cólicas, estancar sangramentos, dores de cabeça e febres malignas diversas. Para Wilson Martins: “A Triaga Brasilica representa o triunfo final da flora brasiliense na farmacopeia universal, desde o título, o milagroso produto proclama com orgulho suas origens e acentuava-se na sua bula superior ao da Europa[3]. Quando do sequestro dos bens dos jesuítas expulsos do Brasil em 1760, o desembargador responsável afirmou que haveria na cidade quem oferecesse quatro mil cruzados pela fórmula triaga brasílica, medicamento produzido pelos jesuítas e mantido em segredo. Um documento de 1766 mantido nos arquivos da Companhia de Jesus revela as preocupações de se manter a propriedade intelectual de remédios produzidos pelos jesuítas: “Amigo e caríssimo leitor, não fiz esta coleção de receitas particulares de nossa botica senão para que  se não perdessem tão bons segredos e estes não andassem espalhados por todas as mãos,  pois bem sabes, que revelados estes,  ainda que seja de uma botica para outra, perdem toda a estimação: e que pelo contrário o mesmo é estar em segredo qualquer receita experimentada, que fazerem dela todos um grande apreço, e estima com fama, e lucro considerável da botica a que pertence. Pelo que peço-te que sejas muito acautelado e escrupuloso em não revelar alguns destes segredos, pois em consequência não se pode fazer, advertindo que são coisas estas da religião, e não tuas”.[4] Os remédios secretos foram ainda mais perseguidos com a criação da Junta do Protomedicato em 1782 no reinado de Maria I.[5]

[1] EDLER, Flavio Coelho. Boticas & Pharmacias: uma história ilustrada da farmácia no Brasil, Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2006, p. 17

[2] LEITE, Bruno Martins Boto. Mezinhas antigas e modernas: A invenção da Triaga Brasílica pelos jesuítas do Colégio da Bahia no período colonial. https://www.13snhct.sbhc.org.br/resources/anais/10/1345053666_ARQUIVO_Mezinhasantigasemodernas.pdf

[3] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 244, 246

[4] EDLER, Flavio Coelho. Boticas & Pharmacias: uma história ilustrada da farmácia no Brasil, Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2006, p. 33

[5] EDLER, Flavio Coelho. Boticas & Pharmacias: uma história ilustrada da farmácia no Brasil, Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2006, p. 41



sábado, 27 de fevereiro de 2021

Cimento pozzolana - o cimento romano

 

Os romanos desenvolveram em Pozzuoli uma mistura de água e cal que servia como liga tanto para alvenaria como para concreto. A mistura com areia vulcânica abundante nas proximidades do Vesúvio formava um produto final chamado pozzolana, puzolana[1] ou pulvis puteolanus em referência a cidade de Puteoli onde era maior sua ocorrência[2], muito próximo ao cimento atual. A descoberta foi feita quando os habitantes de Pozzuoli misturaram essa terra vulcânica local com cal e água sendo a mistura aperfeiçoada ainda no tempo de Adriano em 137 d.c.[3]. O produto foi usado na construção de portos, pontes e aquedutos. Uma argamassa mais simples com areia, cal e água já havia sido adotada em Creta antes de 1000 a.c. e em colônias gregas do sul da Itália.[4] Os romanos construíam em concreto simples (sem ferros) e com taipal (tábuas de escoramento) de tijolos ou blocos de granito que atuavam como moldes. Aplicando tais técnicas mesmo para construção de arcos, abóbodas ou cúpulas.[5] Apenas no ano de 1414 que manuscritos descrevendo as técnicas para se fazer o cimento pozolânico foram encontrados, reacendendo o interesse em se construir com concreto. A tecnologia, contudo, foi perdida e redescoberta apenas no século XVIII,[6] com os trabalhos de L. Vicat.[7] Gaius Plinius Secundus (23-79 a.c) se refere ao concreto dos antigos romanos como “uma massa rochosa única, impermeável ás ondas e a cada dia mais forte”. O porto Palestina Cesareia foi construído ao tempo do rei Herodes em menos de uma década (23 a 15 a.c.) usando-se o concreto romano, tendo sido o maior porto artificial já feito em mar aberto até então, conhecido como “Cesareia sobre o Mar”. A pozolana tinha sido transportada por embarcações da Baía de Nápoles, distante 2000 km do local de construção. Outra construção usando este concreto é o Panteão de Roma com sua cúpula de 43,4 metros e construído por Agripa entre 118 e 125 d.c Por acidente ou a partir de observações na formação de rochas vulcânicas, os construtores romanos descobriram que quando areia de cinza vulcânica oriunda de pedreiras ao redor da Baía de Pozzuoli era misturada com cal, dava-se origem a uma argamassa bem dura, a pozolana, que poderia ser depositada e curada debaixo da água. As argamassas pozolânicas são feitas com um componente aluminossilicato altamente reativo. Vitrúvio já se referia a argamassa pozolânica: “Existe um tipo de pó que por causas naturais produz fantásticos resultados. É encontrado nas vizinhanças de Baiae e em cidades que circundam Monte Vesuvius. Essa substância, quando misturada com cal e cascalho, não apenas fortalece construções diversas, mas também garante que pilares construídos no mar se tornem extremamente duros e resistentes”. Plínio o Velho se disse “maravilhado” diante da invenção do concreto por sua facilidade de preparação e utilização.[8] O segredo da constituição do cimento romano se perdeu e foi recuperado apenas no século XIX quando o francês Vicat desenvolveu uma mistura de componentes argilosos e calcários.[9]



[1]DERRY, T.; WILLIAMS, Trevor. Historia de la tecnologia: desde la antiguidade hasta 1750, Mexico:Siglo Vintuno, 1981, p.242

[2]CAMP, L. Sprague de. The ancient engineers, New York: Ballantine Books, 1963, p. 182

[3]BOORSTIN, Daniel. Os criadores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1995, p.144, 146; PERKINS, John; CLARIDGE, Amanda. Pompeii AD79, London:Carlton Cleeve Limited, 1976, p.46

[4]Time Life. Roma: ecos da glória imperial, Rio de Janeiro:Abril, 1998, p. 25

[5]CARVALHO, Benjamin de Araújo. A história da arquitetura, Rio de Janeiro:Edições de Ouro, p.165

[6]READERS'S DIGEST. Da idade do ferro à idade das trevas: de 1200 a.c. a 1000 d.c, Rio de Janeiro, 2010, p.81

[7]SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.IV, Oxford, 1958, p.447

[8]Time Life. Roma: ecos da glória imperial, Rio de Janeiro:Abril, 1998, p. 26

[9]GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 67



A proposta de universidade no Brasil colonial

 

Segundo Maria de Lourdes Fávero “em matéria de ensino as diretrizes emanadas da Corte eram feitas como se visassem a estabelecer a rotina; paralisar as iniciativas, em vez de estimulá-las”.[1] Mesmo após a independência esta condição de atraso na educação se prolongou de modo que ao final do Império em 1879 o Brasil tinha seis instituições de ensino superior sendo que nenhuma universidade, ou seja, as Faculdades de Direito de São Paulo e do Recife; as Faculdades de Medicina do Rio de Janeiro e da Bahia; a Escola Politécnica do Rio de Janeiro e a Escola de Minas de Ouro Preto.  Na Bahia por diversas vezes, sem sucesso, foi pedido elevar ao estatuto de universidade o colégio local dos jesuítas por oposição dos jesuítas da Universidade de Coimbra. A primeira petição da Câmara da Bahia data de 20 de dezembro de 1662, sendo uma segunda petição encaminhada em 1671 “para conferir graus universitários aos estudantes de teologia” de modo que não fosse necessário enviar seus filhos para se formar em Coimbra.  Segundo Charles Boxer: “Essa atitude mesquinha em relação ao ensino das colônias contrasta desfavoravelmente com a dos monarcas espanhóis, que encorajaram a fundação de universidades no Novo Mundo no século XVI (Santo Domingo, 1511; Cidade do México, 1533; Lima, 1571)”.[2] Luiz Antonio Cunha (na figura) observa que há que se considerar que Portugal dispunha de menos recursos docentes do que a Espanha onde no século XVI haviam oito universidades famosas, enquanto que em Portugal havia apenas Coimbra e mais tarde da de Évora, esta de pequeno porte. Ademais a Espanha havia encontrado civilizações avançadas, de cultura superior no sentido antropológico, o que exigia uma ideologia de colonização mais sofisticada com a formação de locais para esta tarefa, ou seja, é um erro considerar que as universidades nas colônias espanholas serviam como instrumento de libertação, quando seu papel era exatamente o de reforçar tal estrutura colonial  [3]. Outro fator a se considerar é que a própria Companhia de Jesus mantinha uma rivalidade antiga com a Universidade de Coimbra e por esta razão os jesuítas fundaram um colégio em Évora em 1551 que terá sua equiparação como universidade apenas em 1573.  Alcides Bezerra observa que os autores da época, como padre Antonio Vieira, frei Manuel do Desterro ou frei Mateus de Encarnação eram mais teólogos do que filósofos propriamente, de modo que a cultura intelectual da época, segundo Wilson Martins, de qualquer maneira, continuou sendo exclusivamente eclesiástica. [4] Para Simon Schwartzman: “Ao opor-se a essa autonomia, as elites de Portugal e do Brasil foram deixadas só com um dos dois ingredientes principais das universidades europeias modernas --- a educação profissional. Faltou-lhes o outro --- sua tradição de autogoverno e liberdade intelectual e de pesquisa. Em suma, tanto ao Brasil como a Portugal faltava um movimento social mais profundo, que pudesse ver a renovação universitária como um instrumento de mobilidade e afirmação social. As transformações ocorridas foram tentativas, feitas a partir do topo para a base, de formar indivíduos qualificados tecnicamente para administrar os assuntos do Estado e descobrir novas riquezas. Como veremos mais adiante, isso se conseguiu em parte, mas não havia espaço para que as atividades científicas dessem fruto. Ao assumir um caminho independente, a cultura brasileira incorporava só um dos componentes da ideia progressista de ciência daquela época, aquela relativa à sua aplicação. Faltava outro componente essencial: a existência de setores amplos da sociedade que vissem no desenvolvimento da ciência e na expansão da educação o caminho para o seu próprio progresso”.[5]

[1] FÁVERO, Maria de Lourdes. Universidade do Brasil das origens à construção. Rio de Janeiro:UFRJ, 2000, p.9, 24

[2] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 328

[3] LOPES, Eliane. 500 anos de educação no Brasil, Belo Horizonte: Autentica, 2000, p.152

[4] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 167

[5] SCHWARTZMAN, Simo. Um espaço para a ciência, Sâo Paulo. Capítulo 2, http://www.schwartzman.org.br/simon/spacept/espaco.htm



Conhecimento indígena: história da copaíba

 

O médico Piso em sua obra De medicina Brasiliensi é descrita por Juliano Moreira como “uma das mais lídimas glórias da literatura médica”, onde mostra a ação terapêutica de diversos produtos encontrados no Brasil junto aos indígenas como a copaíba, tipo, sassafrás, capeba ou pariparoba e o jaborandi. [1] Gabriel Soares de Sousa em "Tratado descritivo do Brasil" em 1587 já se referia as propriedades da copaíba[2]. A primeira citação sobre o óleo de copaíba talvez tenha sido feita numa carta de Petrus Martius ao Papa Leão X publicada em 1534, em Estrasburgo. Naquela carta, faz-se referência ao "Copei" como uma droga indígena. O padre Jesuíta José Acosta (1539-1604) no seu livro "De Natura Novi Orbis", traduzido em 1606 do latim para o francês, e depois por José Maffeu para o português, que o intitulou "História Natural e Moral das Índias", assim se referiu ao óleo de copaíba: O bálsamo é celebrado com razão por seu excelente odor, e muito maior efeito para curar feridas, e outros diversos remédios para enfermidades, que nele se experimentam...nos tempos antigos os índios apreciavam em muito o bálsamo, com ele os índios curavam suas feridas e que delas aprenderão os espanhóis. Jean de Lery, que veio para o Brasil com Bois-Le-Comte, sobrinho de Villegagnon. De Lery o descreveu na "Histoire d'un Voyage fait en la Terre du Brésil", em que retratava a tentativa francesa no Rio de Janeiro de criação da França Antártica. Os padres Fernão Cardim, em 1584, Francisco Soares, em 1594 e Simão Travaços, em 1596, citam o óleo de copaíba como um excelente cicatrizante [3] Outro estrangeiro, o holandês Gaspar Barléu, em seu livro "História dos feitos recentemente praticados durante vinte anos no Brasil", dedicado ao Conde Maurício de Nassau, assim se referiu à copaíba, que considerava uma das árvores próprias da terra mais notáveis: "Vêem-se estas plantas esfoladas pelo atrito dos animais, que, ofendidos pelas cobras, procuram instintivamente este remédio da natureza". Theodoro Peckolt, que veio ao Brasil em 1846, um dos primeiros cientistas a investigar de modo sistemático as propriedades medicinais da flora brasileira, tinha a mesma opinião de Barléu sobre a copaíba. Ele a considerava uma das dez árvores genuinamente brasileiras mais úteis na Medicina. O óleo de copaíba já constava em 1677 da farmacopéia britânica e em 1820 da farmacopéia americana.



[1] MOTOYAMA, Shozo. Prelúdio para uma história, São Paulo: USP, 2004, p.96; MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 91

[2] MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 91

[3] VEIGA JUNIOR, Valdir F.  and  PINTO, Angelo C.. O gênero copaifera L. Quím. Nova [online]. 2002, vol.25, n.2 [cited  2021-02-27], pp.273-286. Available from: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-40422002000200016&lng=en&nrm=iso>



Escrita asteca

 

 

Os últimos soberanos astecas tornaram a instrução obrigatória mesmo para as classes mais pobres. Pais astecas levavam seus filhos ao tepochalli (“casa dos jovens”), escola pública[1]. As escolas religiosas também conhecidas como calmecac eram reservadas a elite sacerdotal, onde recebiam conhecimento de escrita, astronomia e adivinhação. Bernal Diaz segundo Raoul d´Harcourt em L´Amerique avant Colomb relata que os emissários de Montezuma II ao saudar Corteza eram acompanhados de pintores para retratar o encontro, assim como faziam com as batalhas, com intuito de informar aos generais astecas um relatório das atividades de guerra. Trata-se de uma escrita pictográfica e simbólica. Assim uma serpente (coatli) atravessada por facas (iztli) era escrita como ixcoatli. Assim temos os códice Oxford ou códice Mendoza (na figura) na Bodleian Library, o Codex Tellerio Remensis[2] produzido no século XVI e atualmente na Bibliothèque Nationale de France in Paris e o Codex Vaticanus que se refere a mitologia e ao calendário asteca.[3]



[1] LONGHENA, Maria. O México antigo, Barcelona:Folio, 2006, p. 79

[2] http://www.famsi.org/research/loubat/Telleriano-Remensis/thumbs0.html

[3] TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 35



sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Invenções da Grécia Antiga

 

Moses Finlay aponta outras invenções gregas como a engrenagem e o parafuso, a prensa de parafuso, a vela de popa à proa, a técnica de soprar o vidro[1] (Frances Gies mostra que a técnica teria sido desenvolvida na província romana da Síria no primeiro século a.d.)[2], a fundição de bronze oco, o concreto, a lente de vidro, a catapulta de torção, o relógio de água, o órgão de água, os autômatos movidos a água, vento e vapor em um período que atravessa cerca de mil e quinhentos anos o que revela um saldo muito pouco inventivo, especialmente se considerarmos a pouca difusão de muitos destes inventos, que serviram de mera curiosidade.[3] O sétimo livro de História Natural de Plínio cita algumas invenções, o que inclui não somente artes e ofícios, mas crenças e costumes, no entanto, enquanto que em outros campos os nomes dos indivíduos eram a regra nas artes industrias são raramente citados, geralmente quando muito apenas os locais das invenções são mencionados.[4] Héron de Alexandria inventou o sifão, o órgão hidráulico [5], o termoscópio. No século VI entre os gregos Anácarsis inventou a âncora marítima com duplo gancho, o fole a roda de oleiro, o escultor Glauco de Quios inventou a técnica de soldagem do ferro, o arquiteto cretense Quersifrão inventou as técnicas de transporte de colunas tendo participado da construção do Templo de Artemis em Éfeso (construído em 340 a.c. e tendo algumas de suas colunas trazidas para o British Museum [6] por John Wood, na figura), Teodoro de Samos o polimento do mármore e o torno [7] bem como o processo de fundição do bronze.[8]

 



[1] ANDERSON, Perry. Passagens da antiguidade ao feudalismo, Porto: Afrontamento, 1982, p. 82

[2] GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 25

[3] FINLEY, Moses. Economia e sociedade na Grécia antiga, São Paulo:Martins Fontes, 2013, p. 200

[4] FINLEY, Moses. Economia e sociedade na Grécia antiga, São Paulo:Martins Fontes, 2013, p. 205

[5] USHER, Abbott. Uma história das invenções mecânicas, Campinas:Papirus, 1993, p.187

[6] https://www.britishmuseum.org/collection/object/G_1872-0803-9

[7] BLOCH, Raymond; COUSIN, Jean. Roma e o seu destino. Rio de Janeiro:Cosmos, 1964, p.270, 150, 153

[8] TOYNBEE, Arnold. Helenismo: história de uma civilização, Rio de Janeiro: Zahar, 1963, p. 58



O Brasil e a nau Bretoa

 

José Silvestre Rebelo registra que o nome Brasil será oficialmente adotado pela primeira vez no Alvará de 1530 de D. João III que designava Martim Afonso de Sousa: “Faço saber que eu envio ora a Martim Afonso de Sousa do meu conselho por capitão-mor da armada que envio a terra do brasil e assim de todas as terras que ele dito Martim Afonso na dita terra achar e descobrir”.[1] No entanto, no Livro da viagem e regimento da Nau Bretoa de 1511, quando se autorizou a vinda às terras da América, já aparece na primeira página o nome "Brasil: "Livro da Nau Bretoa que vai para a terra do Brasil" que se encontrada em arquivo na Torre do Tombo em Portugal. O texto se refere também a: "Livro do dia que partimos da cidade de Lisboa para o Brasil, até que tornamos a Portugal".[2] A nau Bretoa armada por Fernando de Noronha e alguns sócios, que saiu de Lisboa, levou de regresso a Portugal uma carga contendo além de pau brasil e escravos também gatos silvestres, répteis, aves exóticas, saguis, macacos e papagaios e quarenta indígenas, sendo sua história narrada no Livro da viagem e regimento da Nau Bretoa.[3] Foram armadores Bartolomeu Marchioni, Benedito Morelli, Fernão de Noronha e Francisco Martins e capitão Cristóvão Pires.



[1] LUIS, Wasgington. Na capitania de São Vicente, Brasília : Senado Federal, Conselho Editorial, 2004, p. 59 https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/1086/690137.pdf

[2] fonte da imagem Torre do Tombo, Lisboa, Portugal https://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=4251565

[3] Holanda, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira, A época colonial, São Paulo: Difusão Editorial, 1960, p. 91; PRADO, Paulo. Retrato do Brasil,São Paulo:Cia das Letras, 1997, p. 101; SCHWARCZ, Lilia; STARLING, Heloisa. Brasil: uma biografia, São Paulo:Cia das Letras, 2015, p.32; BARSA PLANETA, História do Brasil: primeiros povos brasileiros, descobrimento e colonização, 2009, v.1, p. 170



O mercado de Tlatelolco

Hernan Cortez descreve um movimento com mais de 60 mil pessoas na capital Tenochtitlan: “Não posso dizer outra coisa senão que na Espanha nada existe de comparável”.[1] No século XVI na cidade de Tenochtitlan [2] fundada em 1345 e Tlatelolco encontravam-se bairros de artífices como Amantlan, em torno do templo, que reunia especialistas do mosaico de plumas (os amantecatl)[3] ou Pochtlan privativo dos mercadores.[4] Tlatelolco era o mercado mais importante do império asteca. O cronista da conquista Bernal Diaz del Castillo relata a presença de feiras com comércio intenso de calçados, cordas, peles de jaguar, joias de ouro, prata e pedras preciosas na praça central de Tlatelolco[5] conduzido pelos pochtecas, membros de poderosas corporações que detinham o monopólio do comércio exterior[6]. Entre os mexicas (como os astecas se chamavam entre si)[7] o comércio era realizado nos mercados tianquiztli.[8] Bernal Díaz descreve o mercado de Tenochtitlan e conta como se vendiam mel e um doce que ele chama de “muégados”, cobertores, peles de animais e facas de pedra que foram esculpidas ali por artesãos bem como cerâmicas utilitárias de luxo. A pochteca era uma espécie de corporação hereditária de mercadores de longa distância que negociavam artigos de luxo dos mercados estrangeiros[9]. Estas corporações controlavam o monopólio de importação de algodão da costa do golfo do México e de outros locais pata Tenochtitlan e seus membros viviam em bairros especiais[10]. A base da organização social dos astecas era o clã (calpuli) sendo a cidade dividida em vinte calpulis. [11]



[1] Guia dos segredos do império: o povo asteca, Barueri:On Line, 2016, p. 49; TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 31

[2] COE, Michael. Antigas Américas, mosaico de culturas, v. I Madrid:Ed. Del Prado, 1997, p. 150

[3] Guia dos segredos do império: o povo asteca, Barueri:On Line, 2016, p. 53

[4] SOUSTELLE, Jacques. A vida quotidiana dos astecas. Belo Horizonte:Itatiaia, 1962, p.37, 99

[5] SOUSTELLE, Jacques. A vida quotidiana dos astecas. Belo Horizonte:Itatiaia, 1962, p.59; HERRMANN, Paul. A conquista das Américas. Sâo Paulo:Boa Leitura, 1960, p.119

[6] SOUSTELLE, Jacques. A vida quotidiana dos astecas. Belo Horizonte:Itatiaia, 1962, p.98

[7] HAMMOND, Norman. La civilizacion Maya, New Jersey: Cambridge University Press, 1982, p.17

[8] Instituto Nacional de Antropologia e História. Guia Oficial do Museo Nacional de Antropologia, Mexico:Inah Salvat, 1998, p.72

[9] COE, Michael. Antigas Américas, mosaico de culturas, v. I Madrid:Ed. Del Prado, 1997, p. 146

[10] PHILLIPS, Ellen, Viagens de descobrimento 1400-1500, Rio de Janeiro:Time Life, 1991, p.153

[11] TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 31



Sambaquis

 

No sítio Tapeirinha sambaqui fluvial localizado perto de Santarém foram encontradas cerâmicas de 5.000 a.c.[1] Os sambaquis, termo de origem tupi que significa “monte de conchas” [2] são depósitos construídos pelo homem, colinas artificiais também conhecidas como mounds,[3] constituídos por materiais orgânicos e calcários (de origem marinha, terrestre ou de água salobra) empilhados ao longo do tempo, e nos quais alguns grupos indígenas utilizavam como santuário, enterrando neles os seus mortos ou escolhiam como locais especiais para construir suas malocas. No ano de 1847 os dinamarqueses Steenstrup, Forchhmmer e Vorsae lhes dão o nome de kjoekkmmondding (restos de cozinha).[4] Segundo Antonio Serrano: “Na parte superior de muitos sambaquis, que são claramente de origem natural, observei conchas e ossos de peixes e de mamíferos que são tipicamente restos de cozinha”.[5] Ladislau Neto destacou-se como defensor da teoria artificialista pela qual os sambaquis seriam o resultado de uma ação humana e não uma ocorrência natural.[6] Segundo Angyone Costa: “sambaquis são montes de carapaças de moluscos, geralmente e forma arredondada, onde se acumulam detritos deixados pelos primeiros homens e nos quais se encontram artefatos de barro e pedra, ossadas humanas, ossadas de animais, outros elementos que evocam a vida tribal”.[7] Segundo Batista Caetano o termo sambaqui tem origem no tupi tambaqui que significa peito de mulher devido a sua forma cônica, ou de sambá ou tambá que significa em tupi concha, ostra, ki que significa empilhar [8]. No sambaqui de Jaboticabeira II em Santa Catarina, um cemitério ativo por cerca de 800 anos [9] com 8 metros de altura foram encontradas cerâmicas.[10] No sambaqui de Guaíba foram encontrados  colares e pingentes feitos de conchas e dentes de animais.[11] Entre os artefatos líticos encontrados em sambaquis os bifaces são comuns como os encontrados na ilha de Santo Amaro não tendo sido encontrados cerâmicas na parte mais antiga do sambaqui [12]. O mais antigo sambaqui paranaense foi datado de 4900 anos.[13] Na zona litorânea de São Paulo o sambaqui de Marutuá foi datado em 7500 anos.[14] No sambaqui de Pedra Oca na Bahia foram encontradas as cerâmicas mais antigas datadas de 2850 anos [15]. No sambaqui de Mar Casado em São Paulo e Buracão no Guarujá foram encontradas amostras de agulhas, colar de dentes e pendentes em conchas de moluscos [16]. Entre os tupinambás havia a crença de que quem fabricava algum vaso devia ele próprio levá-lo ao fogo, caso contrário, o vaso terminava por partir-se.[17] A grande quantidade de artefatos líticos encontrados em Ilha Grande sugere que este local tenha servido como uma espécie de “fábrica lítica” para produção de artefatos difundidos pela região.[18] Por volta do ano 1000 os grupos caçadores coletores sambaquis foram dominados pelas culturas Tupi e Macro Gê que já dominavam a agricultura.[19]



[1]LUNA, Suely. Sobre as origens da agricultura e da cerãmica pré-histórica no Brasil, 2003 https://www.ufpe.br/clioarq/images/documentos/2003-N16/2003a4.pdf

[2] VAINFAS, Ronaldo; FARIA, Sheila; FERREIRA, Jorge; SANTOS, Georgina. História Volume único, São Paulo:Saraiva, 2010, p.19; MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 75

[3] LEAKEY, Richard. A evolução da humanidade, Brasília: UNB, 1981, p. 198

[4] COSTA, Angyone. Introdução à arqueologia brasileira: etnografia e história, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1938, p.77

[5]TAPAJÓS, Vicente. História da América, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1974, p. 18

[6] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 118

[7] COSTA, Angyone. Introdução à arqueologia brasileira: etnografia e história, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1938, p.86

[8] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 75

[9] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 73

[10] LOPES, Reinaldo. 1499 o Brasil antes de Cabral,Rio de Janeiro:Harper Collins, 2017, p. 77

[11] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 74

[12] MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 84, 93

[13] MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 86

[14] MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 141

[15] MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 104

[16] MENDES, Josué Camargo. Conheça a pré história brasileira, São Paulo: USP, Polígono, 1970, p. 95; ALVES, Daniela Maria. A indústria lítica do sambaqui Mar Casado e outros sítios do litoral do Estado de São Paulo. Dissertação de Mestrado Apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arqueologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo, 2010.

[17] METRAUX, Alfred. A religião dos tupinambás e suas relações com as das demais tribos tupi-guaranis, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1950, p. 292

[18] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 76

[19] HETZEL, Bia; MEGREIROS, Silvia. Prehistory of Brazil. Rio de Janeiro:Manati, 2007, p. 79



Doação de Constantino

  Marc Bloch observa a ocorrência de falsificações piedosas tais como a pseudo doação de Constantino ( Constitutum Donatio Constantini ) ao ...