domingo, 14 de agosto de 2022

Testamento de ex escravo beneficiando ex senhor

 

Na pesquisa em inventários do Rio de Janeiro de 1790-1830 Manolo Florentino e João Gois encontram apenas 4% dos inventariados que não tinham escravos, sendo claramente assimétrico o acesso a tais escravos o que reforçava a posição social de uma elite mostrando se tratar muito mais do que uma sociedade possuidora de escravos, mas uma sociedade escravista, que usa a posse de escravos como elemento de diferenciação social. A ex escrava Maria da Conceição em 1836 em seu testamento deixou como herança de seus bens (entre os quais cinco escravos e uma casa) a sua amiga parda Roza Eufrásia.[1] José Reis destaca que nos testamentos de ex escravos é comum encontrar os ex senhores como beneficiários como por exemplo o testamento de 1828 do ex escravo Manuel Vieira: “deixo a meu Senhor, o Reverendo Padre Jerônimo em reconhecimento da sua escravidão, 4 mil reis o qual se for falecido no tempo do meu falecimento  se dará essa quantia a seus herdeiros e caso estes  não queiram aceitar por ser diminuta quantia se distribuirá em missas pela alma do dito Senhor”. José Reis conclui: “o sistema estava tão bem ideologicamente montado que este escravo, decerto bem tratado, agradecia sua escravidão e quiçá desejava-a eternizada no outro mundo”.[2]



[1] REIS, João José. A morte é uma festa, São Paulo: Cia das Letras, p. 128

[2] REIS, João José. A morte é uma festa, São Paulo: Cia das Letras, p. 264



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