sexta-feira, 26 de agosto de 2022

O alquimista de Notre Dame

 

Para Fulcanelli a catedral de Notre Dame em Paris está repleta de representações alquímicas entre as quais “O pilar central, que divide em dois o vão da entrada, oferece uma série de representações alegóricas das ciências medievais. Face à praça — e em lugar de honra — a alquimia aparece figurada por uma mulher cuja fronte toca as nuvens. Sentada num trono, tem na mão esquerda um cetro — insígnia de soberania — enquanto à direita sustem dois livros, um fechado (esoterismo) outro aberto (exoterismo). Mantida entre os seus joelhos, e apoiada no seu peito, ergue-se a escada dos nove degraus — scala philosophorum — hieróglifo da paciência que devem possuir os seus fiéis no decurso das nove operações sucessivas do labor hermético. “A paciência é a escada dos Filósofos, diz-nos Valois e a humildade é a porta do seu jardim; porque a quem perseverar sem orgulho e sem inveja, Deus fará misericórdia”. [1] Laurent Ridel mostra que esta imagem não tem origem na construção da catedral no período medieval, mas foi introduzido numa reforma apenas setenta anos de Fulcanelli escrever seu livro.[2] A coluna anterior onde se encontra a imagem havia sido voluntariamente destruído pelo arquiteto Soufflot em 1771, porque o pilar obstruía a entrada das procissões. No século XIX, a equipe de Viollet-le-Duc o restaurou, mas sem se preocupar em reproduzir fielmente o antigo, introduzindo a imagem do alquimista. Segundo Leurent Ridel a imagem em Notre Dame foi adaptada numa imagem da representação da filosofia, tal como aparece em um vitral da catedral de Laon, mas desta vez para representar a alquimia na imagem em Notre-Dame de Paris, a escada tem um degrau adicional para corresponder às 9 etapas do processo alquímico, em que a figura tem numa das mãos os livros da sabedoria, na outra o ceptro e apoiada no seu peito a escada que, tal como a escada de Jacob, permitirá chegar à esfera do conhecimento divino. Além disso, a mão da mulher carrega um livro fechado em referência ao conhecimento esotérico, portanto oculto. Um livro de Gilbert que mostra a coluna antes da reforma de Viollet-le-Duc se pode observar nitidamente que a imagem que constava não era a do alquimista.



[1] FULCANELLI. O mistério das catedrais, Lisboa: Edições 70, 1964, p. 86, 126

[2] RIDEL, Laurent. Les cathédrales sont-elles des monuments alchimistes ? https://decoder-eglises-chateaux.fr/cathedrales-monuments-alchimistes/



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