No jardim botânico instalado em Recife situado ao redor do palácio Vrijburg, residência oficial do conde Maurício de Nassau, o biólogo Guilherme Piso e o matemático Georg Marcgraf descreveram 668 espécies ou variedades até então desconhecidas das quais 422 foram ilustradas no "Historia Naturalis Brasiliae" editado em 1648 e organizada por Johannes de Laet, diretor da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais. A obra foi difundida na obra por entusiastas como o médico Christian Menzel, e teve impacto na obra de Georges Cuvier que enviou um assistente para obter a descrição de seres aquáticos “feitas pelo genial investigador da missão científica holandesa”. Um segunda obra a India eutrius quere naturaliet medica, foi editada em 1658. Heloisa Gesteira se refere as redes de trocas de conhecimentos com eruditos europeus com o envio de exemplares e estampas da flora americana para Europa. Nassau presenteou homens ilustres com os quais visava estabelecer laços políticos, como é o caso do conjunto de estampas que ficou conhecido como Teatro das coisas naturais do Brasil, atribuído ao pintor Albert Eckhout. Heloísa Gesteira observa que os holandeses procuravam extrair o máximo de informações dos indígenas observando seus hábitos, visto que eram reveladores da maneira pela qual se deveria proceder para identificação e preparação das plantas medicinais. Ademais diversas plantas receberam nomes tupis na obra. O médico Piso em sua obra De medicina Brasiliensi é descrita por Juliano Moreira como “uma das mais lídimas glórias da literatura médica”, onde mostra a ação terapêutica de diversos produtos encontrados no Brasil junto aos indígenas como a copaíba, tipo, sassafrás, capeba ou pariparoba e o jaborandi.[1] Um capítulo em "Historia Naturalis Brasiliae" é dedicado à “caapeba”, nome dado pelos indígenas à erva-de-nossa-senhora, também denominada cipó-de-cobra: “A raiz é excelentíssima contra cálculos; era a que um português dava ao senhor Vander Dussen com ótimo resultado”. Heloísa Gesteira mostra que havia a circulação de conhecimentos entre indígenas e europeus, o que coloca em debate a historiografia etnocêntrica que enxerga o conhecimento como sempre tendo origem na Europa e transmitido numa via de mão única para as colônias na América: “Estas [as áreas coloniais] ganham protagonismo em suas análises, ao defender que a circulação, no seu entendimento, não é sinônimo de movimento, de trânsito, mas traduz-se no fato de que as ciências se formam numa constante troca entre lugares, pessoas, práticas, artefatos, as áreas coloniais, e os indivíduos, que não podem ser considerados receptores passivos, mas passam a ter papel de produtores de conhecimento, ainda que numa rede hierárquica e assimétrica”.[2]
[1] MOTOYAMA, Shozo.
Prelúdio para uma história, São Paulo: USP, 2004, p.96; MARTINS, Wilson.
História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 91
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