Segundo
Ernesto Ennes, no tempo do quilombo de Palmares as pilhagens das propriedades e
engenhos eram frequentes. [1] Sobre o quilombo de Palmares Rocha Pita descreve que “roubaram aos senhores
delas os vestidos, roupas e armas que lhes achavam, ameaçando violar-lhes as
mulheres e filhas, se as não remiam com dinheiro ou outras dádivas .... Alguns moradores
daqueles distritos, por temerem os danos que recebiam e segurarem as suas
casas, famílias e lavouras dos males que os negros de Palmares lhes causavam,
tinham com eles secreta confederação, dando-lhes armas, pólvora e balas”.[2] Segundo Décio Freitas os palmarinos faziam suas incursões não somente para roubar
armas e ferramentas, mas para exercer sua vingança contra seus antigos senhores
depredando engenhos e incendiando
plantações.[3] Segundo
o depoimento do holandês Gaspar Barleus os ataques dos palmerinos levaram aos
holandeses a planejar a destruição do quilombo, porém Edson Carneiro contesta
que os prejuízos pudessem justificar a custosas entradas de choque armado.[4] A obra de Gaspar Barleus Rerum per octeninum in Brasilia, ilustrada por
Franz Post mostra uma representação de Palmares em Pernambuco convivendo lado a
lado com um engenho de açúcar.[5] Mario Martins de Freitas menciona um documento encontrado na Torre do Tombo em
Portugal escrito pelo Conselheiro Drummond que relata os ataques dos palmerinos
aos engenhos e conclui: “era de fato um inimigo portas a dentro, inimigo
terrível porque organizado, inimigo terrível porque vingativo”.[6] Para o padre Antonio Vieira em sermão proferido em 1680 na Igreja de Nossa
Senhora do Rosário dos Pretos, ele retoma o argumento que já manifestara em
sermões anteriores de que a escravidão era um estado de graça para os que
estavam no cativeiro e que aqueles que serviam à escravidão sem resistir eram “verdadeiros servos de Cristo”. Um
documento encontrado na Biblioteca de Évora com o título Carta de Antonio
Vieira a um certo fidalgo datada de 2 de julho de 1691 recomenda a
destruição de Palmares numa repressão “fortíssima e total, porque sendo
rebelados e cativos, estão e perseveram em pecado contínuo e atual, de que não
podem ser absolvidos, nem receber a graça de Deus, nem se restituírem ao
serviço e obediência de seus senhores, o que de nenhum modo hão de fazer”.
Para Antonio Vieira o reconhecimento da liberdade dos negros em Palmares suscitaria
a fuga de negros por todo o Brasil desestruturando a ordem econômica: “Esta
mesma liberdade se concedida seria a total destruição do Brasil, porque
conhecendo os demais negros que por este meio tinham conseguido ficar livres,
cada cidade, cada vila, cada lugar, cada engenho, seriam logo outros tantos
Palmares, fugindo, passando-se aos matos com todo o seu cabedal, que não é mais
do que o próprio corpo”[7].Flávio
Gomes mostra que a historiografia dos anos 1930 a 1950 em autores como Nina
Rodrigues em “Os africanos no Brasil” e Edison Carneiro em “O
quilombo de Palmares” destacam os quilombos como foco de resistência
cultural dos negros. Nos anos 1960 e 1970 ganha importância a perspectiva
materialista de autores como Clovis Moura em “Rebeliões da senzala” e “Os
quilombos e a rebeldia negra” e Décio Freitas em “Palmares: a guerra dos
escravos” que destacam o aspecto de revolta e resistência em oposição a
visão idílica do negro integrado à sociedade proposta nas teses de Gilberto Freyre.[8]
[1] BRITO, José Gabriel
Lemos. Pontos de partida para a história econômica do Brasil. Brasiliana v.
155, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1980, p.62
[2] PITA, Sebastião da
Rocha. História da América portuguesa. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976,
p.215
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/574177/000970492_Historia_America_portuguesa.pdf
[3] FREITAS, Décio.
Palmares a guerra dos escravos, Rio de Janeiro: Graal, 1978, p. 38
[4] CARNEIRO, Edison. O
quilombo de Palmares, São Paulo: Martins Fontes, 2011, p. 59
[5] AQUINO, Fernando,
Gilberto, HIran. Sociedade brasileira: uma história, São Paulo: Record, 2000,
p.143
[6] FREITAS, Mario Martins.
Reino negro de Palmares, Rio de Janeiro:Bibliex, 1988, p. 210
[7] VAINFAS, Ronaldo. Perfis brasileiros: Antonio Vieira. São Paulo: Cia das
Letras, 2011, p. 279, 280
[8] GOMES, Flávio. Sonhando com a terra, construindo a cidadania. In: PINSKY, Jaime. História da cidadania, São Paulo: Contexto,
2021, p. 450
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