domingo, 24 de julho de 2022

A civilização do couro

 

O historiador Capistrano de Abreu se refere a "Civilização do Couro"[1] para descrever a importância da pecuária no interior nordestino. A criação de gado esteve diretamente ligada a viabilização de estradas que ligavam Maranhão à Bahia com prolongamentos pelo Piauí e Goiás. Salvador se integrava à chapada Diamantina bem como os sertões de Ilhéus e Porto Seguro, ou seja, a criação de gado foi um importante fator de integração nacional[2]. Antonil em sua obra Cultura e Opulência de 1711 já registra a exportação de couros do Brasil para a Lisboa. Uma carta dos Oficiais da Câmara de Olinda em 1729 registra a importância da sola e do açúcar no comércio local. A Companhia Gera de Comércio de Pernambuco e Paríba registra exportações de meios de sola, couros em cabelo e atanados no período de 1751 a 1775. Na capitania da Bahia de 1714 uma carta dirigida ao el-rey  pelos Oficiais da Câmara se queixa da falta de gados para carne diante da crescente utilização na indústria do couro diante da demanda no mercado interno e para Lisboa. A mesma queixa está presente em outros documentos da época. Oliveira Lima um documento datado de 1792 que registra na Capitania de São Pauloa presença de “muita coirama”[3]. John Mawe assinala que em 1807 São Paulo exportava couros e sola para o Rio de Janeiro. A sola era parte do couro bruto, jâ seco, e destinava-se, principalmente, às sapatarias. O couro em cabelo era o couro bruto e salgado. Também chamado de vaqueta, sola ou soleta tanino, o coro atanado é o principal tipo de couro usado em projetos artesanais, feitos a mão. Trata-se de couro totalmente natural, sem coberturas ou acabamentos. Segundo Roberto Simonsen o comercio do gado bovino e a movimentação de tropas muares pelo país foi um fator de unidade econômica brasileira: “alargadas as fronteiras econômicas, ocupadas as vastas regiões dos sertões brasileiros, as economias e os capitais nacionais estavam representados, em fins do período colonial, nos engenhos, na escravaria e na pecuária. Foi a acumulação destes dois elementos, pela mineração, que facilitou a rápida expansão da cultura cafeeira, cultura esta que, por sua natureza especial, exigiria fartos braços e amplos meios de transporte”.[4] Para Roberto Simonsen: “foi o gado o elemento de comércio por excelência por toda a hinterlândia brasileira, na maior parte da fase colonial. Indústria mais pobre, relativamente, que a do açúcar, apresentava, porém, uma feição caracteristicamente local, formadora de gente livre e com capitais próprios. A indústria açucareira, com outra organização social, funcionava, em grande parte com capitais da metrópole, aos quais eram atribuídos  os maiores proventos. A produção da pecuária, e o seu rendimento ficavam incorporados ao país. As suas feiras, entre as quais a de Sorocaba, exerceram uma função inconfundível na formação de nossa infra estrutura econômica unitária, antes da independência”.[5]

[1] BOXER, Charles. A idade de ouro do Brasil: dores de crescimento de uma sociedade colonial. São Paulo:Cia Editora Nacional, 1969, p. 246

[2] VIANNA, Helio. História do Brasil, primeira parte, período colonial. São Paulo: Melhoramentos, 1972, p.234

[3] GOULART, José Alípio. Brasil do boi e do couro, Rio de Janeiro: Edições GDR, 1966, p. 34

[4] SIMONSEN, Roberto. História Econômica do Brasil, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1962, p.187

[5] SIMONSEN, Roberto. História Econômica do Brasil, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1962, p.17, 186



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