quinta-feira, 16 de junho de 2022

O papel das pequenas empresas na inovação

Robert Merges[1] lembra que a propriedade de empresas não necessariamente significa propriedade de grandes empresas e argumenta que as pequenas empresas persistem como uma importante fonte de inovação. Uma mostra disso é o movimento de Open Innovation que busca a integração entre grandes e pequenas empresas. Neste cenário os direitos de propriedade intelectual são um elemento chave para o sucesso das pequenas empresas.[2] Outro aspecto que Merges destaca é que as grandes empresas são o nascedouro de pequens empresas. Estudos mostram que 70% de todos os empresários nos Estados Unidos vieram de empresas estabelecidas de onde receberam treinamento e inspiração para novas ideias.[3] Para Merges sob uma perspectiva mais ampla a grandes empresas estão longe de ser a anátema do trabalho criativo. Pelo contrário tais empresas são indispensáveis. [4] A história do vale do Silício mostra diversas empresas start ups surgindo de empresas maiores tais como a Fairchild Semiconductor, entre as quais a Intel, AMD e a National Semiconductors entre outras, conhecidas como Fairchildren.[5] François Chesnais observa que o capital de risco financiou algumas das empresas mais bem sucedidas dos Estados Unidos como Microsoft, DEC, Fedex, Intel, Genentech e Cisco.[6] A DEC em 1957 foi financiada inicialmente pela empresa de capital de risco American Research and Development Corporation (ARDC) fundada por Georges Doriot, ex reitor da escola de administração de Harvard em parceria com Karl Compton, ex presidente do MIT. O valor investido aumentou em cinco vezes quando a DEC fez sua IPO onze anos depois. A Intel recebeu investimentos de Arthur Rock.[7] O Google recebeu investimentos de capital de risco da Sequoia Capital e Kleiner Perkins.[8] Mariana Mazzucato mostra que o capital de risco privado nos Estados Unidos entra numa fase posterior do desenvolvimento da empresa onde o risco embora alto é menor do que nas fases inciais da empresa. Segundo o prêmio Nobel Paul Berg os investidores de capital de risco não estavam disponíveis quando do surgimento das empresas de biotecnologia: “Onde estavam vocês nas décadas de 1950 e 1960, quando foi preciso fazer todo o financiamento em ciência básica ? A maioria das descobertas que tem alimentado a indústria foi feita nessa época”.[9] Na área de telas LCD, Peter Brody buscou sem sucesso o apoio de grandes empresas como Apple, IBM, 3M, Xerox, DEC e Compaq para Dra continuidade as suas pesquisas com transistores de película fina (TFT). Em 1988 depois de um acordo com a agência do governo DARPA Peter Brody criou o Magnascreen que deu origem as telas TFT-LCD. [10] Mariana Mazzucato conclui: “O Estado está por trás da maioria das revoluções tecnológicase longos períodos de crescimento”.[11]

O financiamento do governo por programas como o de Pesquisa e Inovação em Pequenas Empresas (SBIR) e o Programa de Tecnologia Avançada (ATP) chega a ser de duas a oito vezes superior a quantia investida pelo capital de risco privado.[12] Para Mariana Mazucato o surgimento da Nasdaq e o mercado de ações de tecnologia em ação conjunta com o capital de risco foi um modelo criado sob pressão política para tornar tais empresas menos dependentes do capital externo. O modelo altamente especulativo dos Estados Unidos a sua abordagem imediatista do capital de risco, por sua vez, prejudicam a inovação segundo Mariana Mazzucato[13]. Roger Cullis mostra a ação deireta de investimentos do Estado em inovaçao no Japão com 30 bilhões de ienes do MITI no porjeto VLSI, na Inglaterra em 1960 o governo investiu em projetos na área de semicondutores em empresas como Plessey e Ferranti. Segundo o senador Joseph Lieberman o Departamento de defesa dos Estados Unidos comprou mais de metade da produção de semicondutores de 1965 sendo um fator decisivo para a alavavanvagem do setor.[14] A franco italiana SGS-Thomson recebeu aportes significativos do governo em 1990 e na Alemanha a Siemens recebeu investimentos do governo alemão de 40 milhões de dólares para aumentar sua capacidade em microeletrônica. A Coreia do Sul investiu 60 milhões no South Korean Institute or Electronics Technology (KIET) para desenvolvimento de tecnologia a ser transerida para indústrias privadas[15]

Alfred Chandler em seu livro The Visible Hand, ganhador do prêmio Pulitzer, defende a tese de que os grandes empreendimentos como a construção de ferrovias no século XIX foram os grandes alavancadores da industrialização nos Estados Unidos, por desencadearem mudanças importantes nos processos de gestão das empresas. Em Proprietary Capitalism, Philip Scranton desafia a ênfase de Chandler nas grandes empresas e argumenta que pequenas e médias empresas também tiveram um papel importante na industrialização do país. A impressionante estabilidade das grandes empresas norte americanas verticalmente integradas estudadas por Chandler nos anos 1960 e 1970 foram questionadas pelos japonses nas década seguinte que marcaria o fim das empresas de ciclos de produção longos. Segundo Charles Morris: “o longo ciclo de produção revelou-se um calcanhar de Aquiles, uma adaptação preguiçosa aos dias de pouco consumo, quando todo mundo ficava feliz co um telefone preto, e os concorrentes externos eram com frequência destruídos por guerras”. [16]

Um estudo realizado em 2000 por Robert Hart e cols. para subsidiar a Comissão Européia em sua Diretiva de Software mostra que a posse de direitos de propriedade intelectual ajuda as pequenas empresas desenvolvedoras de software a conseguir investimentos e desenvolver mercados para suas invenções. O estudo conclui: “não há evidências de que os desenvolvedores de software independentes europeus tenham sido afetdaos indevidamente pelas posições de patentes das grandes empresas ou mesmo de outros desenvolvedores de software [...] Os desenvolvedores independentes europeus de software estão desproporcionalmente fazendo pouco uso das possibilidades de patenteamento quando comparados com as grandes empresas”[17]



[1] MERGES, Robert. Justifying Intellectual Property, Harvard University Press, 2011, p. 3088/6102 (kindle version)

[2] GRAHAM, Stuart; MERGES, Robert; SAMUELSON, Pamela, SICHELMAN, Ted.. High Technology Entrepreneurs and the Patent System: Results of the 2008. Berkeley Patent Survey Berkeley Technology Law Journal,, v. 24, n. 4, p. 255-327, 2009

[3] HELLMAN, Thomas. When do employees become entrepreneurs ? Working Paper, University of British Columbia, 2006, http://strategy.sauder.ubc.ca/hellmann/pdfs/MSRevision_August_2006-All.pdf

[4] MERGES,Robert.op.cit.p.3284/6102 (kindle version)

[5] CULLIS, Roger. Patents, inventions and the dynamics of innovation: a multidisciplinary study, Edgard Elgar, 2007, p.187

[6] CHESNAIS, François; SAUVIAT, Catherine. O financiamento da inovação no regime global de acumulação dominado pelo capital financeiro. In; LASTRES, Helena; CASIOLATO, José; ARROIO, Ana. Conhecimento, sistemas de inovação e desenvolvimento, UFRJ:Rio de Janeiro, 2005, p. 200

[7] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 199-201

[8] ISAACSON, Walter. Os inovadores: uma biografia da revolução digital, São Paulo: Cia das Letras, 2014, p. 478

[9] MAZZUCATO, Mariana. O estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado, São Paulo:Portfolio Penguin, 2014, p.91

[10] MAZZUCATO, Mariana. O estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado, São Paulo:Portfolio Penguin, 2014, p.151

[11] MAZZUCATO, Mariana. O estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado, São Paulo:Portfolio Penguin, 2014, p.51

[12] MAZZUCATO, Mariana. O estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado, São Paulo:Portfolio Penguin, 2014, p.81

[13] MAZZUCATO, Mariana. O estado empreendedor: desmascarando o mito do setor público vs. setor privado, São Paulo:Portfolio Penguin, 2014, p.88

[14] CULLIS, Roger. Patents, inventions and the dynamics of innovation: a multidisciplinary study, Edgard Elgar, 2007, p.262

[15] CULLIS, Roger. Patents, inventions and the dynamics of innovation: a multidisciplinary study, Edgard Elgar, 2007, p.157

[16] MORRIS, Charles, R. Os magnatas: como Andrew Carnegie, John Rockfeller, Jay Gould e J.P.Morgan inventaram a supereconomia americana, Porto Alegre:L&PM, 2006, p.239

[17] HART, Robert; HOLMES, Peter; RAID, John. The economic impact of patentability of computer programs, Report to the European Comission http://ec.europa.eu/internal_market/indprop/docs/comp/study_en.pdf



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