Em Portugal a botica conventual teve o seu apogeu no
final do século XVII. Médicos e cirurgiões são formados em Coimbra no século
XVIII em um ambiente de decadência e atraso da medicina na metrópole portuguesa
sob influência poderosa dos jesuítas. Serafim Leite relata que o Colégio dos
Jesuítas no Rio de Janeiro em 1706 era uma espécie de laboratório central
abastecendo as boticas da cidade.[1] Entre os
escravos negros, Katia Mattoso observa que o senhor de engenho tão logo
soubesse que um escravo era feiticeiro conhecedor de ervas ou magia, tratava de
vendê-lo com receio de que pudesse ser envenenado.[2] Mario Sá
argumenta que “Apresentando soluções de seus repertórios de magia e
feitiçaria, fruto de dinâmica cultural entre europeus, americanos e africanos,
conseguiram ocupar alguns espaços em uma sociedade que não lhes oferecia muitas
possibilidades”.[3] Gilberto
Freyre cita o caso do curandeiro africano “preto Manoel” que no século
XIX foi autorizado tratar dos doentes de cólera no Hospital de Marinha do
Recife. Diante do óbito de muitos pacientes que compraram “por alto preço o
seu remédio” a polícia o advertiu de que não deveria mais exercer tal
ofício, o que acabou sendo causa de sua prisão.[4] Roger
Sansi mostra que o termo feitiço é uma palavra portuguesa com origem no
latim facttitius e que aparece nos editos de D. João I de 1385 a 1403 condenando
tais práticas.[5] Segundo Flavio Edler os arquivos da Inquisição mostram que muitos portugueses
recorriam as artes de cura de negros.[6] André
Nogueira mostra diversos inquéritos junto aos tribunais eclesiásticos de Minas
Gerais do século XVIII contra “negros feiticeiros” que eram temidos por
muitos senhores, constituindo “um dos poderosos veículos de resistências contra
as condições do cativeiro”. Segundo James Sweet: “o poder religioso africano
não se limitava a ser uma forma de resolver os problemas locais ou tradicionais,
constituía uma ameaça real e perigosa aos proprietários portugueses no Brasil”.[7] André
Nogueira mostra os casos de negros escravos acusados de feitiçaria entre os
quais Pai Caetano, Matheus Monjolo, Páscoa e Domingos Calunduzeiro (escravo
alforriado que possivelmente teria aprendido seus conhecimentos em ervas
medicinais de seu antigo senhor que era cirurgião)[8] que
conseguiram, em grande medida ser “protagonistas de seus destinos e vidas,
graças aos seus reconhecidos saberes terapêuticos”.[9] A grande maioria dos negros acusados de feitiçaria pelos tribunais de
Inquisição portugueses não chegaram efetivamente a ser processados, e nenhum sofreu
a pena capital. Pedro Paiva mostra que no Reino entre os séculos XVII e XVIII
apenas 0,6% das denúncias de fato foram convertidas em processos e tiveram seus
réus sentenciados em autos de fé, o que não impediu que muitos tivessem sido
açoitados durante a fase de denúncia ou mesmo sido mortos por seus acusadores,
como o caso de Manoel Mina levado pelos capitães de mato para ser preso “a
ferros”.[10]
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