Em
meio ao local de mineração era comum a presença de negras de tabuleiro para
venda ambulante de doces e comida, ainda que Russel Wood aponte que algumas
pudessem estar relacionadas a prática de prostituição ou ocultação de pepitas de
ouro e diamantes encontradas na lavra pelos faiscadores: “As mulheres
escravas também tinham uma liberdade considerável, sob o pretexto de especular
por ouro. Mestres inescrupulosos enviavam escravas para garimpar ouro, mas não
lhes davam nem mesmo uma picareta. No final da semana, o mestre exigia suas
receitas, totalmente ciente que estas foram ganhos pela prostituição, em vez de
garimpar. Uma variante era o acordo legal entre o mestre e uma escrava que ela
seria coartada, ou seja, que ela era obrigada a pagar dentro de um tempo
especificado, uma quantidade de ouro mutuamente acordada por ambos partes, ou
continuar em cativeiro. Essas escravas perambulavam pelas áreas de mineração,
retirando ouro em pó de todas as fontes possíveis”.[1] Muitas negras do tabuleiro eram alforriadas com vendinhas próximas nas zonas de
mineração. Em 1753 as Posturas das Câmara de Vila Bela se queixavam das negras que
traziam vendas pelas lavras.[2]
Russel Wood observa que embora o escravo coartado gozasse de maior mobilidade e
não estarem submetidos à supervisão rígida, sua condição não pode ser igualada
à liberdade condicional pois ainda eram considerados escravos.[3]
Entre 1758 e 1799 em Vila Rica cerca de 48% das alforrias pagas foram por
coartação, o que mostra segundo Donald Ramos que em Vila Rica a coartação
tornou-se “o meio mais importante de obter a liberdade”.[4]
Para o exercício legal como vendedores ambulantes elas tinham de ter uma
licença da Câmara Municipal, medida via de regra ignorada.[5]
Júnia Furtado mostra que em Serro Frio em 1736 sessenta vendas do pequeno
comércio de comestíveis e bebidas eram propriedade de mulheres, a maioria
pretas forras ou escravas, o que representa 80% das vendas desse comércio na
Comarca. As Devassas Eclesiásticas aponta
mulheres de comércio de tabuleiro junto dos serviços minerais entre as queixas.
Tais negras de tabuleiro foram alvo de perseguições acuadas de facilitar
extravios e de se envolver em prostituição e desordens.[6]
Douglas Libby e Eduardo Paiva mostram que algumas escravas lançavam mão de
práticas de concubinato e prostituição para conseguirem libertar-se da condição
de escravas.[7] Luciano
Figueiredo examina o papel de negras de tabuleiro e vendeiras nas Minas do século
XVIII e desfaz o conceito de que haveria possibilidades de democratização e
acesso à riqueza, quando na verdade o que havia era um “falso fausto” nos arraiais
auríferos.[8]
[1] RUSSELL WOOD, Escravos e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2005, p.66; RUSSELL-WOOD, Anthony J. R. Technology and
society: The impact of gold mining on the institution of slavery in Portuguese
America. The Journal of Economic History. Cambridge, v. 37, n. 1, mar. 1977, p.
60
[2] RUSSELL WOOD, Escravos
e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005,
p.319
[3] RUSSELL WOOD, Escravos
e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005,
p.294
[4] RUSSELL WOOD, Escravos
e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005,
p.304, 309
[5] RUSSELL WOOD, Escravos
e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005,
p.91
[6] FURTADO, Júnia
Ferreira. Homens de negócio, São Paulo: Hucitec, 2006, p. 237, 270
[7] NOGUEIRA,
André Luis Lima. Entre cirurgiões, tambores e ervas, Rio de Janeiro: Garamond,
2016, p.119
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