quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Astronomia árabe dos séculos XII e XIII

 

Gerberto monge de Aurillac futuro papa Silvestre II no ano 999 adotou a astronomia de Ptolomeu, reintroduziu o ábaco e a esfera armilar e escreveu um tratado sobre o astrolábio em que chama o instrumento de um grande presente de Deus, que teria chegado a Europa pelos muçulmanos da Espanha que teriam aperfeiçoado o instrumento dos gregos antigos. [1] Gerberto fo o primeiro grande sábio a vulgarizar na Europa o uso dos algarismos arábicos e o uso do astrolábio.[2] Segundo Gerberto: “orientado para a astronomia, o estudo dos números e das concordâncias tonais, mostrava a ordem profunda do universo, refletida pelo movimento circular dos astros, por relações matemáticas e por ritmos concordes”.[3] Adelardo de Bath no século XII tradutor de textos árabes escreve “Sobre o uso do astrolábio”. Raimundo Lullio em Arte de navegar em 1295 descreve os aperfeiçoamentos recebidos pelo astrolábio[4]. Com o astrolábio era possível determinar latitudes, horas do nascer e do pôr do sol, funcionando com um relógio de bolso. As instruções para usar o astrolábio, escritas em 1391 pelo poeta Geoffrey Chaucer em sua obra Tratado sobre o astrolábio foram copiadas de um astrônomo árabe do século VIII.[5] O quadrante horário com cursos móvel foi inventado em Bagdá no século IX e redescoberto na Europa medieval.[6] Os primeiros astrolábios foram desenvolvidos pelos gregos Apolônio de Perga (262-180 a.c.) e Hiparco (150 a.c.)[7], no entanto a primeira referência escrita ao instrumento surgiria apenas com Ptolomeu (92 – 168 d.c) em sua obra Tetrabiblos que serviu como guia de astrologia e no livro V do Almagesto[8]. Segundo versão de Ibn Khallikan os astrolábio planisférico teria sido inventado por acaso por Ptolomeu ao deixar cair um globo celeste de sua mão[9]. Astrólogos como al Battani procuraram a solução de problemas astrológicos com uso de soluções trigonométricas rigorosas, corrigindo muitos dos cálculos de Ptolomeu no Almagesto.[10] Mesmo nos séculos XVI e XVII Copernico e Kepler mencionam os trabalhos de Battani em astronomia o que revela sua qualidade.[11] Uma versão avançada da esfera armilar, o torquetum foi inventado pelos árabes entre 1000 e 1200 d.C. Uma esfera armilar consiste numa reunião de anéis (do latim armillae) cada qual representando um círculo da esfera celeste, sendo possível medir posições com este instrumento.[12] Noah Efron e David Lindberg observam que o heliocentrismo de Copernico pode ter sido influenciado pelos trabalhos do astrônomo de Damasco Ibn al Shatir (1305-1375) que propôs correções no modelo ptolomaico, uma vez que a Polônia localizava-se muito próxima dos limites do império otomano naquele tempo.[13] Nasir al Din al Tusi (1201-1274) construiu um observatório em Maraga, no nordeste do Irã e inventou um método geométrico que converte dois movimentos circulares uniformes em uma linha reta que vai e volta, conhecida como “casal-Tusi”. O casal Tusi é um dispositivo matemático no qual um pequeno círculo gira dentro de um círculo maior com o dobro do diâmetro do círculo menor. As rotações dos círculos fazem com que um ponto na circunferência do círculo menor oscile para frente e para trás em movimento linear ao longo de um diâmetro do círculo maior. O modelo “casal-Tusi” foi usado no modelo de Copérnico.[14]



[1] LYONS, Jonathan. A casa da sabedoria, Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p.60; GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 159

[2] TATON, René. A ciência antiga e medieval: a idade Média, tomo I, livro 3, São Paulo:Difusão Europeia, 1959, p. 106

[3] DUBY, Georges. O ano mil. Lisboa:Edições 70, 19967, p. 56

[4] COELHO, Latino. A ciência na idade média, Lisboa:Guimarães Editores, 1988, p.151

[5] BRONOWSKI, J. A escalada do homen, São Paulo:Martins Fontes, 1979, p.166; READERS'S DIGEST. Da idade do ferro à idade das trevas: de 1200 a.c. a 1000 d.c, Rio de Janeiro, 2010, p.74

[6] TERESI, Dick. Descobertas perdidas, São Paulo:Cia das Letras, 2008, p.141-145

[7] BURNS, Edward McNall. História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1959, p.206; MAHAJAN, Shobhit. História das invenções, Berlim:Verlag, 2008, p. 28

[8] SARTON, George. Ciencia antigua y civilizacion moderna, Buenos Aires, Fondo de Cultura, 1960, p.58, 78

[9] LYONS, Jonathan. A casa da sabedoria, Rio de Janeiro: Zahar, 2011, p.60

[10] TATON, René. A ciência antiga e medieval: a Idade Média, v. III, São Paulo:Difusão, 1959, p. 47; RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência, v.II Oriente, Roma e Idade Média, Rio de Janeiro:Zahar, 2001, p. 97

[11] LINDBERG, David C.. The Beginnings of Western Science. University of Chicago Press. Edição do Kindle.2007, p.179

[12] RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência: Oriente, Roma e Idade Média. v.2, São Paulo:Jorge Zahar, 2001, p.49

[13] EFRON, Noah. Mito 9: que o cristianismo deu à luz a ciência moderna. In: NUMBERS, Ronald. Terra plana, Galileu na prisão e outros mitos sobre a ciência e religião, Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020, p. 122

[14] LINDBERG, David C.. The Beginnings of Western Science. University of Chicago Press. Edição do Kindle.2007, p.179



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