Bernhard Topfer mostra que não houve qualquer psicose geral por volta do ano mil, por outro lado um pressentimento de fim de mundo se encontra presente por exemplo na dita “cruzada popular” de 1095.[1] Christopher Dawson destaca o caráter político das cruzadas pois as grandes ordens militares, tais como os cruzados, construíam uma ponte entre a sociedade leiga e eclesiástica de modo que o cavaleiro se encontrava separado de suas obrigações feudais e territoriais tornando-se um soldado da Igreja.[2] Na Inglaterra o bispo Wulstan de York compôs em 1014 o sermão do lobo para o inglês: “Este mundo tem pressa e se aproxima cada vez mais do seu fim. Sempre acontece que quanto mais dura, pior se torna. E assim deve ser, porque o advento do AntiCristo se torna ainda mais terrível por causa dos pecados das pessoas. Com isso, será brutal e se espalhará terrível pelo mundo inteiro”.[3] Segundo Guiberto de Nogent o papa Urbano II em seu discurso de convocação da primeira cruzada em 1095 teria feito referências ao anticristo e ao retorno glorioso de Cristo, no entanto, outros cronistas omitiram tal trecho. A perspectiva escatológica continuará presente nos trabalhos de Joaquim de Fiori que previa a mudança de século XIV como uma nova era de paz e prosperidade. Para Joaquim de Fiori a história da humanidade é marcada pelo progresso em três etapas: a primeira presidida pelo Pai e narrada no Antigo Testamento. A segunda conduzida por Jesus e narrada no Novo Testamento e finalmente a terceira etapa presidida pelo Espírito Santo que trará a compreensão das escrituras em especial do Apocalipse que em seus cálculos teria início efetivo em 1260.[4] A bula papal do ano do jubileu assinada pelo papa Bonifácio VIII em 1300 concedia remissão dos pecados aos romanos que visitassem os santuários de São Pedro e São Paulo em Roma.[5] Daniel Rops observa que no século XII de Joaquim de Fiore (1135-1202) o número de videntes e profetas aumenta significativamente, entre as quais se destacam Santa Hildegarda de Bingen (1098-1179) canonizada no século XVI e Santa Isabel de Schonau (1129-1164).[6] Gerhoh de Reichersberg denuncia o final dos tempos e a ansiedade pelo retorno de Jesus diante da “avareza farisaica e pagã que reina no próprio reino de Cristo”. Christopher Dawson aponta um sentimento de crise iminente que percorre todo pensamento religioso no século XII, que a nós pareceria um século de ouro do catolicismo medieval com Santo Anselmo, São Bernardo, as cruzadas, as catedrais, as novas ordens religiosas e as universidades, mas que para seus contemporâneos era visto de forma sombria à espera do juízo final. Bernardo de Morlais escreve em versos: “o mundo é maligno, os tempos estão se esgotando, esteja sóbrio e mantenha a vigília, o Juiz está nos portões”. Segundo Christopher Dawson: “Essas tendências não foram, de forma alguma, uma prova de declínio cultural ou religioso. Pelo contrário, mostraram quão profundamente a mente dos homens tinha sido revolvida pelo despertar religioso a indicar a iminência de uma nova era. Tampouco esteve confinada à minoria educada dos líderes do movimento no clero e nas ordens monásticas, pois já começara a afetar a nova sociedade laica que brotava nas cidades medievais”.[7]
[1] TOPFER, Bernhard.
Escatologia e milenarismo. In: LE GOFF, Jacques;
SCHMITT, Jean Claude. Dicionário
analítico do Ocidente medieval. v.I, São Paulo:Unesp, 2017, p. 397
[2] DAWSON, Christopher. Criação do Ocidente, São Paulo: É Realizações, 2016, p.
190
[3] LACEY, Robert. O ano
1000: a vida no final do primeiro milênio, Rio de Janeiro: Campus,1999, p.155
[4] COSTA, José Silveira
da. A escolástica crsitã medieval, Rio de Janeiro, 1999, p.52
[5] CASAGRANDE, Carla;
VECCHIO, Silvana. Pecado. In: LE GOFF, Jacques;
SCHMITT, Jean Claude. Dicionário
analítico do Ocidente medieval. v.II, São Paulo:Unesp, 2017, p. 402; ROPS,
Daniel. A Igreja das catedrais e das cruzadas. São Paulo: Quadrante, 2012, p.
90
[6] ROPS, Daniel. A Igreja das catedrais e das cruzadas. São Paulo: Quadrante,
2012, p. 54
Nenhum comentário:
Postar um comentário