Quando do atentado do rei de Portugal D. José em
setembro de 1758 Pombal lançou suspeitas sobre o envolvimento de padres
jesuítas desencadeando uma perseguição que iria culminar em 1759 com a extinção
da Companhia de Jesus em Portugal.[1] Em
janeiro de 1759 seis nobres e cinco plebeus foram executados acusados de
participar da tentativa de assassinato. O jesuíta Gabriel Malagrida, confessor
de uma das nobres executadas marquesa de Távora, também teria participação no
atentado, segundo Pombal. Para o padre Gabriel Malagrida, que esteve em missão
no Maranhão e Bahia, o terremoto de Lisboa de 1755 fora um sinal da indignação
de Deus aos escândalos de desordens da Corte uma vez que nas cidades vizinhas,
onde a ruína não foi tão grande, “fizeram e ainda fazem maravilhas de
penitências, pés descalços, cruzes, açoites, jejuns a pão e água e outras
mortificações infinitas”.[2] Segundo
Malagrida em “O Juízo da verdadeira causa do terremoto que padeceu
a corte de Lisboa” a causa do terremoto “[…] não são Cometas; não são Estrelas; não são
vapores, ou exalações, não são Fenômenos, não são contingenciais ou causas
naturais; mas são unicamente os nossos intoleráveis pecados”. Como forma de aplacar
a ira de Deus, Voltaire em Cândido publicado em 1759 relata a realização de um
ato da fé em Lisboa de modo a evitar a repetição do terremoto do 1755: “decidiu-se
na Universidade de Coimbra que o espetáculo de algumas pessoas queimadas aos
poucos na fogueira em uma grande cerimônia é o segredo infalível para impedir
que a terra trema”.[3] Essa
passagem, reproduzida por Fernando Cacciatore como histórica, na verdade é
trecho de uma estória ficcional do conto de Voltaire, ao contrário, houve uma
mobilização intensa para abrigo e assistência à população atingida.[4] Francisco
Bethencourt mostra que enquanto a média de processos por ano em Lisboa eram de
37 no período 1675-1750, este número cai à metade e chega a 18 entre 1751 e
1767, ou seja, após o terremoto o número de processos diminuiu[5]. O
marquês de Pombal em 1759 decide expulsar os jesuítas do Brasil, em 1768 irá
suprimir a diferença entre cristãos novos e cristãos velhos e em 1769
transformar o tribunal da Inquisição em tribunal dependente do governo real
reforçando o poder central e secularizando a justiça. Segundo Oliveira Martins:
“Abolindo as distinções entre cristãos novos e velhos, abolindo a
escravidão no reino, equiparando os canarins [nascidos nas ilhas Canárias] aos
portugueses, dando por uma vez a liberdade aos índios do Brasil – o reformador
nivelava todas as classes perante o trono absoluto, varrendo parte do sistema
de categorias individuais legado pelas tradições da Idade Média”[6]. Ao combater
o poder religioso dos jesuítas e do Santo Ofício, a tirania absolutista de
marquês de Pombal se constitui um “instrumento de liberdade” nas palavras de
Oliveira Martins.[7] Gabriel Malagrida foi entregue ao tribunal do Santo Ofício de Lisboa acusado de
heresia e posteriormente condenado ao garrote e fogueira em 1761, no Rossio, a
praça principal de Lisboa.[8] Para
José Eduardo Franco, a morte de Malagrida resultado da perseguição aos jesuítas
imposta por Pombal representou foi um ato o qual “simbolizando a fogueira que o queimou a
destruição de toda a Companhia de Jesus”[9]. Em
1777, após a queda de Pombal o padre Pedro Homem denunciou que o livro sobre
Santa Anna onde supostamente o padre Malagrida teria feito profecias contra a
Igreja identificando-a como o anti Cristo, que fundamentou o processo de
heresia, na verdade foi uma construção arquitetada por Pombal: “Quanto
á obra sobre o Anti-christo—acrescentou o padre Homem, não foi auctor d'ella
Malagrida ; mas sim o infame padre Platel, o ex-capuchinho Norbert,
estipendiado por Pombal para caluniar os seus adversários. Este miserável
recebia pelo seu infame mister uma pensão de 1:300$000 rs.”[10]. Entre a sentença dos Távaros incriminando
judicialmente os jesuítas e 1773 quando a Companhia foi extinta por Roma,
houve uma campanha antijesuítica capitaneada pelo marquês de Pombal, ao ponto
de José Eduardo Franco se referir a um “antijesuitismo de Estado”. Numa das
imagens da época Pombal aparece como o herói iluminado a vencer o monstro da
Ordem dos Jesuítas, representado por uma Hidra de Lerna que Hércules exterminou
em um de seus doze trabalhos, demonstrando o pioneirismo português no
extermínio do mal jesuítico. Muitos dos livros antijesuítas eram impressos em
Roma com falsas indicações de terem sido impressos em Paris, Lisboa, Genova,
Veneza, Nápoles para inflar a rede de oposição aos jesuítas. Miguel Sotto Mayor
sugere que esta campanha envolveu a negociação da ilha de Santa Catarina aos espanhóis
ocupada por tropas do general Ceballos entre 1762 e 1777. Pombal teria proposto
a invasão dos Estados Pontíficios para forçar o papa a decretasse o fim da
ordem dos jesuítas.[11] Pedro
Ceballos foi governador da Província de Buenos Aires de 1757 a 1766, e com a
criação do Vice-Reinado do Rio da Prata, em 1776, foi nomeado seu primeiro
vice-rei. Na França a ordem dos jesuítas foi extinta em 1764, na Espanha em 1767,
Nápoles e Sicília em 1768.[12] Entre
as colônias espanholas, os jesuítas da cidade de Assunção do Paraguai que
trabalhavam com povos guaranis já haviam sido expulsos do colégio em 1612,
1649, 1724 e 1732 de modo que esta será quinta expulsão.[13] O
papa Clemente XIV tendo cedido as pressões e "em nome da paz da Igreja e para evitar uma
secessão na Europa" suprimiu a Sociedade de Jesus pelo breve Dominus
ac Redentor de 21 de julho de 1773, ano em foi decretada a abolição da escravatura
em Portugal. Para José Franco o ato representou uma vitória do pensamento iluminista
contra a Igreja redefinindo as relações entre Igreja e Estado no caminho da
secularização da sociedade. Wilson Martins observa que o fato de uma das
principais aplicações da triaga brasílica fabricada pelos
jesuítas era como antídoto a envenenamentos, alimentava no imaginário popular
as suspeitas contra os jesuítas de terem envenenado o papa Clemente XIV, poucos
meses depois, em 1774. O marquês de Pombal ao saber da morte do papa acusa os
jesuítas “que o teriam envenenado com a sua mítica e
indetectável acqua toffana para vingar esta medida papel [a extinção da Ordem
dos jesuítas]”. [14]
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