Para William Wallace não há dúvidas de que a condenação contra as teses averroistas publicada pelo bispo de Paris Estevão Tempier de 1277 diz respeito a matérias ensinadas por Tomás de Aquino: “em oposição ao ensinamento popular de que todo o conhecimento vem de iluminação divina, [Tomás] concedeu que o homem, por observação sensorial e utilizando puramente a razão, podia chegar à verdade e à certeza”.[1] Segundo Ruy Nunes: “Essa condenação do ensino do aristotelismo e da doutrina de Santo Tomás sob pena de excomunhão teve efeitos danosos para o estudo de filosofia no fim da Idade Média, pois atrasou-o e impediu que muitos filósofos sinceramente cristãos se lançassem nas novas sendas do pensamento abertas pelo gênio do Aquinate [Tomás de Aquino] [...] o decreto de 1277 sufocou a vida intelectual de Paris durante meio século, retardou o progresso da filosofia, revitalizou o aristotelismo eclético superado por Tomás de Aquino, assim como envenenou as polêmicas nas escolas”.[2] Para Pierre Duhem: “Se devêssemos determinar uma data para o nascimento da ciência moderna, escolheríamos, sem dúvida, esta data de 1277. Compreendida como uma condenação do necessitarismo grego, esta condenação conduzirá numerosos teólogos a afirmar como possíveis, em virtude da onipotência do deus cristão, posições científicas ou filosóficas tradicionalmente consideradas impossíveis devido à essência das coisas. Permitindo experiências mentais novas, a noção teológica de um Deus infinitamente poderoso libertou os espíritos do quadro finito em que o pensamento grego encerrava o universo”.[3] Paolo Rossi, por outro lado, entende que, muito embora as universidades ao permitir os docentes de ensinar em qualquer lugar (licentia ubique docendi) e fomentar o fluxo de estudantes tenha contribuído para se colocar como centro de estudos internacional, a ciência moderna nasceu fora das universidades e muitas vezes em polêmica com ela.[4] Daniel Rops mostra que as divergências dentro da Igreja em torno das teses averroistas do dominicano Tomas de Aquino irá se prolongar. Na defesa de Tomás de Aquino irão se posicionar o cisterciense Humberto de Brouilly, o carmelita Gerardo de Bolonha e o agostinho Giles de Roma este último demonstrando a possibilidade de conciliar Santo Agostinho com Santo Tomás de Aquino. O irlandês Duns Scoto (1274-1308) seguindo os passos de São Boaventura irá reforçar o papel espiritual corrigindo os excessos de intelectualismo de muitos dos seguidores de Tomás de Aquino. Para Duns Scoto (figura) a criação não é regida por leis fixas as quais cabe a razão humana revelar, pois isso significaria uma fixidez que se oporia a onipotência divina, e que à última consequência vedaria a possibilidade de milagres.[5]
[1] GILLISPIE, Charles.
Dicionário de biografias científica, volume 1, Rio de Janeiro:contraponto,
2007, p.88
[2] NUNES, Ruy Afonso da
Costa. História da educação na idade média, Campinas:Kirion, 2018, p.282, 283
[3] TATON, René. A ciência
antiga e medieval: a Idade Média, tomo I, v.III, São Paulo:Difusão, 1959, p.
133; SHANK, Michael. Mito 2: Que a igreja cristã impediu o avanço da ciência.
In: NUMBERS, Ronald. Terra plana, Galileu na prisão e outros mitos sobre a ciência
e religião, Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020, p. 45
[4] ROSSI, Paolo. O
nascimento da ciência moderna na Europa, Bauru:Edusc, 2001, p. 10, 16
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