A ênfase no papel dos senhores de engenho na sociedade colonial de autores como Gilberto Freyre e Oliveira Vianna reforçou a tese do feudalismo no Brasil, incorporada por autores marxistas como Nelson Werneck Sodré.[1] Para Nelson Werneck Sodré: “a confusão entre capital comercial e capital como funciona no modo capitalista de produção induziu alguns intérpretes da história brasileira à conclusão de que a empresa da colonização teria assumido aqui, traços capitalistas, uma espécie de capitalismo diferente das normas clássicas, o capitalismo colonial. Carece de fundamento tal conclusão. Não havia capitalismo na metrópole, não havia capitalismo na colônia. Nem poderia haver, por inexistirem as condições para isso. Na Europa mesmo, tais condições começavam apenas a surgir. O fato de serem feudais as relações predominantes em Portugal, de outro lado, levou outros intérpretes a conclusão que teria sido feudal o sistema de produção aqui instalado. Esta conclusão também carece de fundamento, embora seja indiscutível que a legislação inicial, que presidiu o lançamento da colonização, a referente as donatarias, em particular - tenha se revestido de caráter feudal. Oriunda de uma sociedade feudal, com a portuguesa, traduziria, naturalmente a ética e os direitos feudais”.[2] Para Nelson Werneck Sodré será no pastoreio sertanejo e posteriormente nas áreas escravistas em decadência da economia açucareira que irão se desenvolver e ampliar as áreas feudais. Será no sertão que a sociedade apresenta os traços que a assemelham com a sociedade medieval. A implantação de relações feudais no Brasil, portanto, surge depois da implantação do escravismo. Em Minas Gerais a progressiva transformação dos mineradores em criadores de gado e em agricultores de subsistência é um dos indícios do avanço das relações feudais. Nelson Werneck Sodré compara com o medievalismo europeu: “o vasto mundo da servidão no campo é um espetáculo dos nossos dias, no Brasil. Tem raízes ancoradas longe, no tempo, começou com a própria colonização. Não surgiu de um processo semelhante ao que ocorreu na Europa quando, passando pelo colonato, emergiu das ruínas do escravismo romano, fundindo a deterioração deste com a decomposição da comunidade gentílica dos bárbaros. Teve outras origens aqui, ou apareceu desde o primeiro momento, ou decorreu da estagnação da produção escravista. De uma ou de outra forma, ampliou sua dominação e chegou aos nossos dias, entravando o processo ascensional do capitalismo em nossos dias. A característica mais evidente do processo de expropriação que permite a disponibilidade de trabalhadores assalariados, aqui, está em que, na sua maioria, eles não foram despojados da propriedade de seus meios de produção: já era eram despossuídos”. Acusado de etapismo tal qual a ortodoxia intelectual stanilista que previa a evolução das sociedades do comunismo primitivo ao escravismo, feudalismo, capitalismo e socialismo, Nelson Werneck Sodré irá argumentar que no Brasil houve uma adaptação desse modelo na medida em que a transição do escravismo para o feudalismo no Brasil não pode ser considerado um progresso mas uma regressão econômica na medida em que representou o domínio do poder pelos grandes latifundiários feudais com a independência do país, o que mais tarde representaria um entrave para que posteriormente pudesse se desenvolver uma burguesia nacional ou que possibilitasse a acumulação nacional necessária para ascensão de tal burguesia. Ademais no caso brasileiro o que se observa é convivência de áreas ajustada à condição feudal enquanto outras à condição de escravismo. José Carlos Reis aponta que na obra de Nelson Werneck Sodré não fica claro quando teria havido tal regressão econômica, se no século XVII com o declínio das minas ou se a abolição do tráfico representou tal regressão. O capitalismo surgiria no final do século XIX do "ventre do feudalismo", mas bloqueado pelas relações feudais que se ampliaram. [3]
[1] SCHWARTZ, Stuart.
Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo: Cia
das Letras, 1988, p. 216
[2] SODRÉ, Nelson Werneck.
História da burguesia no Brasil, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1976,
p. 17;
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