sexta-feira, 12 de novembro de 2021

A nomenclatura alquímica e o nascimento da química

 

Químicos consagrados como Joseph Black e Bertholet logo abandonaram a teoria do flogisto diante das vantagens evidentes da nova teoria química e toda uma nova nomenclatura química foi elaborada por Lavoisier, Guyton de Morveau[1], Antony Fourcroy e Berthelot publicada em 1787 como Metodo de nomenclatura química, substituindo os nomes usuais dos componentes usados na alquimia: “óleo de vitríolo” que também aparece em alguns textos alquímicos como “óleo de enxofre” tornou-se ácido sulfúrico[2], “vitríolos” sulfatos, “vitríolo de Vênus” sulfato de cobre, “vitríolo de marte” para o sulfato de ferro[3], “aqua fortis” ácido nítrico[4], “espírito de nitron” ácido nítrico, “espirito de sal” ácido clorídrico, “espírito de Saturno” acetona, “açúcar de Saturno” acetato de chumbo[5], “metal de Saturno” chumbo[6], cinabre por sulfeto de mercúrio HgS[7], “leão vermelho” ou “chumbo sagrado” por sulfureto de antimônio[8], o “lobo cinzento” o antimônio, a “águia branca” o amoníaco, a “gralha negra” o chumbo[9], não sendo incomum a inconsistência no uso destes termos. Segundo Basílio Valentino a palavra chamada vitríolo tinha um significado oculto na forma de um anagrama: Visita interiore terrae; rectificando invenies occultum lapidem (“Visite o interior da terra, através da purificação você encontrará a pedra escondida”). Titus Burckhardt explica: “O interior da terra é também o interior do corpo, isto é, o centro íntimo e indiferenciado da consciência. A pedra escondida não é outra senão a matéria prima [ou pedra fisolofal]”.[10] Na literatura alquímica o “sangue do leão verde” representa o mercúrio hermético.[11] Em alquimia a cor verde er encontrada na incineração de diversas substâncias. Em combinações do tipo leão verde e dragão verde caracteriza os solventes capazes de dissolver até mesmo o ouro. Os alquimistas viam no processo de transmutação uma interação de duas esferas simbolizadas pelo vermelho masculino e pelo verde feminino.[12] Em geral os ácidos eram conhecidos como espírito, os termos cal e terra designavam os óxidos, enquanto que o termo vitríolo designava todos os sulfatos, régula designava o antimônio e o arsênico.[13] Outros nomes presentes em tratados de alquimia incluíam, manteiga de arsênico, açúcar de chumbo, flores de zinco, fígado de enxofre, entre outros nomes esotéricos como sal de alembroth, pó de algoroth, entre outros[14]. Segundo Olivier Lafont: “a poesia desaparece face às exigências da ciência”.[15] Para Lavoisier em Traité elementaire de chimie, o objetivo é “sempre dispor os fatos, e as concussões derivadas deles, numa ordem que facilite sua compreensão completa aos principiantes no estudo de química”.[16]



[1] DAUMAS, M. Nascimento da química moderna, In: TATON, René. A ciência moderna: o século XVIII, tomo II, livro 3, Sâo Paulo:Difusão Europeia, 1960, p. 132; BELL, Madison Smartt. Lavoisier no ano um. São Paulo: Cia das Letras, 2007, p. 124

[2] STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.58; SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.IV, Oxford, 1958, p.242; TATON, René. A ciência moderna: o Renascimento, tomo II, v.I, São Paulo:Difusão, 1960, p. 133

[3] TATON, René. A ciência moderna: o Renascimento, tomo II, v.I, São Paulo:Difusão, 1960, p. 133

[4] STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.61

[5] McCLELLAN III, James; DORN, Harold. Science and technology on world history: an introduction. The Johns Hopkins University Press, 1999, p.299

[6] RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência: Da Renascença à Revolução Científica. v.3, São Paulo:Jorge Zahar, 2001, p.126

[7] BRONOWSKI, J. A escalada do homen, São Paulo:Martins Fontes, 1979, p.123; MACHADO, Jorge. O que é alquimia ? Coleção primeiros passos, São Paulo: Brasiliense, 1991, p. 29

[8] FILGUEIRAS, Carlos. Origens da química no Brasil, Campinas:Ed. Unicamp., 2015, p.250

[9] MANGOLD, Lydia Mez. Imagens da história dos medicamentos, Basileia:Hoffman La Roche, 1971, p.57

[10] BURCKHARDT, Titus. Alquimia: ciência do cosmos, ciência da alma. Londres: Fons Vitae, 1967, p.90; LEXIKON, Herder. Dicionário de símbolos, São Paulo:Cultrix, 1990, p. 208; CASTELLANI, José. A ciência maçônica e as antigas civilizações, Santos:Traço Editora, 1990, p.17

[11] DE ROLA, Stanislas. Alquimia. Lisboa:Ed. Del Prado, 1996, p. 51

[12] LEXIKON, Herder. Dicionário de símbolos, São Paulo:Cultrix, 1990, p. 203

[13] TATON, René. A ciência moderna: o século XVII, tomo II, v.2, São Paulo:Difusão, 1960, p.162

[14] SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.IV, Oxford, 1958, p.221

[15] LAFONT, Olivier. A química. In: COTARDIÈRE, Philippe. História das ciências: da antiguidade aos nossos dias, Rio de Janeiro:Saraiva, 2011, p.180

[16] BELL, Madison Smartt. Lavoisier no ano um. São Paulo: Cia das Letras, 2007, p. 132



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