Plínio em certa altura de
seu livro História Natural ao descrever os homens de um olho só que vivem na
Índia, entre outras estórias faz uma ressalva: “contudo, não vi todas essas coisas com meus próprios olhos. Se não
são verdadeiras, a culpa é dos autores de livros onde encontrei essas
informações”.[1] Lynn
Thorndike observa que Plínio parece incrivelmente crédulo e indiscriminado na
seleção de seu material de estudo marcado pela falta de qualquer padrão de
julgamento entre o que é certo e errado, o que o faz compor uma obra que Thorndike
descreve como “um conglomerado de fatos e ficção desordenados e
indiscriminados”.[2] Muitas vezes ele assume um tom de ceticismo e censura quanto à credulidade de
outros autores. Plínio se refere a possibilidade de se ensinar um elefante a
escrever, ou que um dente de hiena capturada quando a lua está em Gêmeos seria
um bom repelente de fantasmas, ou que esteve na Índia para assistir uma corrida
de homens sem boca que sobreviviam apenas em cheirar flores,[3] a existência de peixinhos do Mediterrâneo conhecidos como Remura, que fazia
parar os navios pela mera aderência a eles ou a existência de mulheres que
tinham filhos com cinco anos de idade[4].
Para Lynn Thorndlike no conjunto geral sua obra Historia Natural parece um “desordenado
e indiscriminado conglomerado de fato e ficção”.[5] Edward Gibbon a descreve como “um imenso
registro onde Plínio depositou as descobertas, artes e erros da humanidade”.[6] William Eamon concorda que Plínio se mostra não somente crédulo como muitas
vezes inclinado em direção ao bizarro, excepcional e maravilhoso [7].
Francesco Stella mostra que “aquilo a que
chamamos maravilhoso ou fantástico é, para os medievais, uma das dimensões do
sobrenatural, por sua vez entendido como uma das formas do real” e nesse
sentido destacam-se as descrições do sobrenatural (mirabilis) descritos nos bestiários e pela geografia fantástica, o
maravilhoso mágico (magicus) do
folclore e crenças demoníacas bem como o maravilhoso cristão (miraculosus) que permeia a biografia dos
santos.[8] No século III Julianus Solinus publicou a obra Maravilhas do Oriente descrevendo prodígios e monstros de grande
repercussão na idade média[9].
No século III Eusébio de Cesareia cita extensamente as obras de Maneto no
prefácio de Cronografia em que se refere a “seres
maravilhosos” no antigo Egito, híbridos de homem e animal reproduzidos nas
estátuas da esfinge[10].
Charles Singer observa que a História Natural de Plínio junto com a obra de
Isidoro de Sevilha gozou de muito prestígio na idade média,[11] muito embora não tenha sido muito criterioso em selecionar suas fontes. Sua
obra História Ntural foi reeditada dezoito vezes no século XV e cinquenta vezes
no século XVI[12]. Em
algumas passagens Plínio confere a experiência (experimentum) como o melhor mestre de todas as coisas, mas este
termo não se refere ao que denominaríamos de experimento científico, um arranjo
preparado para confirmar uma hipótese, mas as experiências do cotidiano. O
termo se refere ao conhecimento adquirido por observação direta em oposição
pelo que pode ser obtido através de um argumento racional. Dizer algo foi
provado por um experimento significa meramente que o fato foi testemunhado
pessoalmente[13]. Em
algumas poucas vezes o termo é usado no sentido científico como no experimento
de se colocar um ovo na água para se observar se ele boia ou afunda e assim
determinar se o ovo está fresco, ou no uso de uma lâmpada acesa para em um poço
ou mina se detectar a presença de gases nocivos. Plínio não se refere a
transmutação de metais ou alquimia exceto quando as trata de práticas
fraudulentas.[14] Para
René Taton: “Plínio e seus sucessores
tardios utilizam raramente observações pessoais, como se houvesse para ele um
corte entre o mundo tal como o contemplavam, no qual viviam e a imagem do mesmo
apresentada nos livros dos sábios”.[15]
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