Diogo Couto
em 1602 escreve: “Os reis de Portugal sempre procuraram na conquista do
oriente ao unirem os dois poderes, espiritual e temporal, que um não pudesse
ser exercido sem o outro”. Em Goa, onde em 1510 Afonso Albuquerque pela
primeira vez fundou uma cidade portuguesa, ao invés do estabelecimento de meras
feitorias, como até então vinha sendo feito[1],
o franciscano Paulo de Trindade escreve em 1638 “As duas espadas do poder
civil e do poder eclesiástico andaram sempre tão unidas na conquista do Oriente
que raramente encontramos uma a ser utilizada sem a outra; porque as armas só
conquistaram através do direito que a pregação do Evangelho lhes dava, e a
pregação só servia para alguma coisa quando era acompanhada e protegida pelas
armas”.[2] Uma
carta do primeiro vice rei Francisco de Almeida enviada a D. Manuel mostra os
interesses portugueses na quebra do monopólio de especiarias de Veneza: “Toda a nossa força seja no mar. Desistamos de
nos apropriar da terra. As tradições antigas de conquista, o império sobre
reinos tão distantes não convém [...] Com as nossas esquadras teremos seguro o
mar e protegidos os indígenas em cujo nome reinaremos de fato sobre a Índia; e se o que queremos
são os produtos dela, o nosso império marítimo assegurará o monopólio português
contra o turco e o veneziano”. Perguntado por dois mouros em Tunis que
falavam espanhol, ao chegar em Calicute (chamada Malabar pelos árabes e Querala
pelos hindus) em 21 de maio de 1498, conforme o relato de Álvaro Velho que
escreveu o diário de borde de Vasco da Gama: “Al diablo que te doy ! Quien
te triuxe acá ? / que diabos é que os trouxe aqui ?”[3],
Vasco da Gama respondeu: “Viemos procurar cristãos e especiarias”.[4][5] O samorim (do malabar samuttiri) se queixa diante de Vasco da Gama que
se seu interesse era de homens então teria de ter trazido alguns presentes. Os portugueses
haviam trazido apenas doze brasões, quatro colares de coral, quatro capuzes de
lã tingida de vermelho, seis chapéus, um fardo de bacias, uma caixa de açúcar e
quatro barris sendo dois de azeite e dois de mel ao qual o mouro que os respondeu
segundo o relato de Álvaro Velho: “Como aqui é costume que não se leve nada
ao rei sem antes mostrar ao mouro, o capitão assim o fez. Eles vieram e
começaram a rir, dizendo que nada daquilo era coisa para se mandar a el rei,
que o mais pobre mercador que vinha de Meca, ou dos índios, lhe dava muito mais
que aquilo. Se queria lhe oferecer algo, que lhe mandasse algum ouro, porque el
rei não havia de aceitar aquelas coisas”. [6] Em novo encontro com o samorim o relato de Álvaro Velho deixa claro que seu
interesse na Índia era fundamentalmente pela busca de especiarias: pois seu objetivo
era o de “meramente para fazer
descobertas. O rei perguntou-lhe então o que fora descobrir: pedras ou homens ?
Se fora para descobrir homens, por que não trouxera nada ?”[7]. Vasco da Gama informou ao samorim que o rei
português enviara seus navios para encontrar reis cristãos “por esta razão
mandavam navios para descobrir este terra, e não porque lhes fosse necessário
ouro e prata, que tinham em abundância”.[8] De Calicute Vasco da Gama, que não conseguira instalar uma feitoria como planejado,
partiu em agosto de 1498 “com grande regozijo
pela nossa sorte em termos feito tão grande descoberta [...] pois já tínhamos
achado e descoberto o que vínhamos buscar assim de especiarias como de pedras
preciosas”. Vasco da Gama envia ao rei português, sem a viagem de volta, uma
carta escrita por Diogo Dias: “Vasco da Gama, fidalgo de vossa casa, veio a
minha terra; com o qual eu folguei. Em minha terra há muita canela e muito cravo
e gengibre e pimenta e muitas pedras preciosas. E o que quero da tua é ouro e
prata, e coral e escarlata”. [9] No retorno a Lisboa haviam apenas 55 marinheiros, uma vez que 115 haviam
morrido na viagem.
[1[ MARTINS, Oliveira. História de Portugal, Lisboa: Versial, 2010, p.192. Edição
do Kindle
[2] BOXER, Charles. O
império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 224
[3] MARTINS, Oliveira. História de Portugal, Lisboa: Versial, 2010, p.162. Edição
do Kindle; VELHO, Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem
de Vasco da Gama, Rio de Janeiro: Objetiva, 1998, p. 75
[4] BOXER, Charles. O
império colonial português (1415-1825). Lisboa:Edições 70, 1960, p. 58
[5] CAMINHA. João Carlos.
História marítima. Rio de Janeiro: Bibliex, 1980, p. 60
[6] VELHO,
Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem de Vasco da Gama, Rio de
Janeiro: Objetiva, 1998, p. 84
[7] VELHO,
Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem de Vasco da Gama, Rio de
Janeiro: Objetiva, 1998, p. 86
[8] VELHO,
Álvaro. O descobrimento das Índias: o diário da Viagem de Vasco da Gama, Rio de
Janeiro: Objetiva, 1998, p. 83
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