segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Agudás: ex escravos que retornaram a África

 

No Museu Nacional do Rio de Janeiro havia um zinkpo, também chamado trono real de Daomé, dado de presente por embaixadores do rei Adandozan ao príncipe D. João em 1810 o que mostra as boas relações dos dois reinos.[1] Um grande traficante de escravos em Ouidah (Uidá) no Benin no século XIX foi Francisco Felix de Souza, o Chachá, nascido na Bahia, a figura central do tráfico transatlântico de escravos[2] Pierre Verger em seu livro “Os escravos” relata o caso do traficante de escravos Joaquim d’Almeida em Daomé que havia sido no passado escravo na Bahia quando então tinha o nome de Gbego Sokpa. Outro traficante de escravos que também havia sido escravo é João de Oliveira que fundou dois entrepostos na Costa dos Escravos em Porto Novo no Benim e outro em Lagos. O negro brasileiro Antonio Vaz Coelho no século XVIII também se tornou traficante de escravos em Porto Novo. José Francisco dos Santos, o Zé Alfaiate era escravo na Bahia e tornou-se um dos últimos traficantes do porto de Ajuda no Daomé.[3] A comunidade dos agudás reunia os ex escravos que retornaram do Brasil.[4] Alberto Costa e Silva mostra que muitos destes ex escravos brasileiros se estabeleceram no Brazilian Quarter em Lagos e no Quartier Bresil de Ajudá no Benin como mestres de obras, pedreiros, marceneiros, pintores, alfaiate e costureiras e difundiram técnicas de arquitetura aprendidas no Brasil assim como comidas como o peixe com pirão e a cocada ou instrumentos musicais como o cavaquinho e o pandeiro.[5] Alberto da Costa e Silva mostra que muitos muçulmanos ex escravos vindos da Bahia se destacaram devido a habilidade nos ofícios adquiridos no Brasil. A mesquita Central em Lagos na Nigéria, já demolida[6], foi iniciada pelo brasileiro mestre de obras João Baptista da Costa e concluída por seu discípulo sarô Sanusi Aka[7]. Em Porto Novo em Benim há uma mesquita com estilo de igreja católica brasileira construída por pedreiros, marceneiros e mestres de obras do século XIX. Gilberto Freyre qualificou estes ex escravos como pioneiros do capitalismo na África.[8]



[1] GOMES, Laurentino. Escravidão v. II, Rio de Janeiro:GloboLivros, 2021, p. 171; Blog: Ensinar História - Joelza Ester Domingues https://ensinarhistoriajoelza.com.br/francisco-felix-de-souza-traficante-de-escravos/

[2] SILVA, Alberto da Costa. Francisco Félix de Souza, mercador de escravos , Rio de Janeiro: Nova Fropnteira, 2013, BUENO, Eduardo. O traficante dos traficantes, https://www.youtube.com/watch?v=8mkXSo2W6jc; NARLOCH, Leandro. Escravos. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017. p.89; LAW, Robin. A carreira de Francisco Félix de Souza na África Ocidental (1800-1849). Topoi 2001, vol.2, n.2, pp.9-40. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2237-101X2001000100009&lng=en&nrm=iso

[3] NARLOCH, Leandro. Escravos. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017. p.81

[4] NARLOCH, Leandro. Escravos. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017. p.18, 77

[5] SILVA, Alberto da Costa. A África explicada aos meus filhos, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2013, p. 114

[6] GOMES, Laurentino. Escravidão v.1, Rio de Janeiro:Globo Livros, 2019, p. 20

[7] COSTA E SILVA, Alberto da. O Brasil, a África e o Atlântico no século XIX. Estud. av. [online]. 1994, v.8, n.21, p.21-42. http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40141994000200003&lng=en&nrm=iso

[8] COSTA, Sergio Correa da. Brasil, segredo de Estado, São Paulo:Record, 2001, p. 56



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