domingo, 26 de setembro de 2021

O conhecimento indígena dos astros

 

Em 1612 o monge capuchinho francês Claude d’ Abbeville publicou História dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão e Terras Circunvizinhas em que relatou: “Os tupinambás atribuem à lua o fluxo e o refluxo do mar e distinguem muito bem as duas marés cheias que se verificam na lua cheia e na lua nova ou poucos dias depois”. Quando em 1642 Galileu Galileu publicou seu livro sobre o movimento da terra explicava que as marés seriam causadas pela rotação da terra. A explicação da relação do movimento da marés com a lua viria apenas com Isaac Newton em 1687, ou seja, mais de setenta anos depois de Abbeville escrever seu livro. Um dos mitos indígenas associa a lua com o fenômeno da pororoca[1]. Entre os tupinambás certa estrela era denominada januare, cão, uma vez eu os índios ao deitarem-se a “estrela late em seu encalço como um cão para devorá-la”. Januare ou Jaguar é a estrela da tarde ou Vésper. Quando a lua permanece oculta por muito tempo devido a algum eclipse, acontece de surgir vermelha como sangue resultado de sua caçada.[2] A lua vermelha segundo a astronomia ocorre na primeira lua cheia do fim do mês de abril ou princípio de maio, na verdade trata-se de um fenômeno metereológico e não astronômico. [3] Os tupinambás utilizavam os conhecimentos dos movimentos do Sol e da Lua na navegação, pesca e agricultura.[4] Entre os tupis a lua era Jaci / Yaci[5] a mãe dos frutos que presidia todo o mundo vegetal.[6] Guaraci, Quaraci, Coaraci ou Coraci (do tupi kûarasy, "sol") na mitologia tupi-guarani é a representação do Sol. Tupã não era exatamente um deus, mas sim uma manifestação de um deus na forma do som do trovão. A cerimônia do Kuarup entre os índios do Alto Xingu se inicia somente com a lua em quarto crescente ou lua cheia.[7] Entre os caiapós o princípio do mundo está associado ao par Sol e lua, ambos do sexo masculino.[8] Para os antigos guaranis haviam um tigre no ceu que em certas ocasiões de eclipses devorava o sol ou a lua.[9] Um dos mitos dos guaraiu tem o nome de abaangui, um homem de nariz caído com o aspecto de uma lua metamorfoseada, enquanto que zaguayu é visto como uma encarnação do sol.[10] Para os bororos o sol e a lua pertencem ao clã dos badedgeba [11].  Ehrenreich encontra outras analogias dos mitos dos guaraiu e os astros como a analogia entre o tema dos gêmeos Arubiatá e Nanderiquey que representa respectivamente a lua e o sol. [12] O sol é igualmente descrito no mito dos tembés como um mancebo que usa botoque e tem a cabeça coroada com plumas brilhantes. As plumas sobre a cabeça representam os raios solares e seu uso identificaria o chefe da tribo.[13] O padre salesiano Alcionílio Bruzzi publicou em 1962 A civilização dos Uapés em que destaca, sob a ótica da catequese católica, a astronomia indígena na descrição do planeta Vênus e da Lua.

[1] AFONSO, Germano Bruno. Astronomia indígena. Revista de História da Biblioteca Nacional, outubro 2010, p. 32-36

[2] FERNANDES, Florestan . A função da social da guerra na sociedade tupinambá, São Paulo:Globo, 2006

[3] MOURÃO, Rogério Freitas. Dicionário enciclopédico de astronomia e astronáutica, Rio de Janeiro,Nova Fronteira, 1987, p. 483

[4] MIRANDA, Antonio Carlos. A dimensão do mito. São Paulo:Allprint, 2005, p.21

[5] COSTA, Angyone. Introdução à arqueologia brasileira: etnografia e história, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1938, p.257

[6] MOURÃO, Rogério Freitas. Dicionário enciclopédico de astronomia e astronáutica, Rio de Janeiro,Nova Fronteira, 1987, p. 415

[7] SANTOS, Yolanda Lhuillier dos. Convite à Ciência. São Paulo:Logos, 1965, p.179, 218

[8] GONTIJO, Silvana. O mundo em comunicação, Rio de Janeiro:Aeroplano, 2001, p.90

[9] METRAUX, Alfred. A religião dos tupinambás e suas relações com as das demais tribos tupi-guaranis, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1950, p. 101; SOUTHEY, Robert. História do Brasil, Brasília: Melhoramentos, 1977, v.2, p. 218

[10] METRAUX, Alfred. A religião dos tupinambás e suas relações com as das demais tribos tupi-guaranis, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1950, p. 66 http://www.brasiliana.com.br/obras/a-religiao-dos-tupinambas-e-suas-relacoes-com-as-das-demais-tribos-tupi-guaranis

[11] STRAUSS, Claude Lévi. O pensamento selvagem. São Paulo:Cia Editora Nacional, 1970, p. 264

[12] METRAUX, Alfred. A religião dos tupinambás e suas relações com as das demais tribos tupi-guaranis, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1950, p. 89

[13] MIRANDA, Antonio Carlos. A dimensão do mito. São Paulo:Allprint, 2005, p.31



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