Os portugueses mantinham relações com os governos locais africanos para o comércio de escravos. Um embaixador de Benim foi a Portugal em 1484 sendo recebido com pompa segundo o cronista Rui Pina “Era esse embaixador homem de bom repouso e natural saber, foram-lhe feitas grandes festas e mostradas muitas coisas boas deste reino”, muito embora o império de Benim nunca tenha se transformado em grande exportador de escravos.[1] O porto de embarque de São Jorge da Mina ou Elmina na costa de Gana foi erguido pelos portugueses em 1485 e é considerado a primeira construção de pedras feita pelos europeus nos trópicos tendo sido conquistada pelo holandeses em 1637[2]. Jacob Gorender mostra que o Estado de Daomé na área do atual Benim (o grande império de Benim da época colonial fica na atual Nigéria) surgiu por conta do desenvolvimento do comércio negreiro no século XVII fundado no monopólio estatal.[3] A região litorânea em torno de Daomé era conhecida pelos europeus, o nome de Costa dos Escravos. Foi do Porto de Uidá, o mais importante porto negreiro da África Ocidental, que saiu mais de um milhão de escravos desde o século XVII. Para garantir a obediência dos negros escravizados durante a viagem os traficantes difundiam histórias de canibalismo contra os rebeldes nos tumbeiros. Na edição de 4 de janeiro de 1839 o jornal abolicionista The Liberator se refere a um caso de canibalismo que teria ocorrido num navio negreiro de 250 escravos.[4] A partir de aliança políticas e comerciais e militar com as autoridades nativas africanas os portugueses trocavam manufaturados europeus ou tabaco e aguardente vindos da América por cativos capturados em constantes guerras tribais[5]. Em Daomé o soberano era conhecido como “pai de todos”, de modo que todos eram sua propriedade, e como posses do rei não poderia ser vendido, de modo que restava a conquista militar de outros teritórios em busca de escravos para venda entre os prisioneiros inimigos.[6] Na medida em que a comércio intenso de escravos se desenvolve, intensifica-se cada vez mais as guerras intestinas na África para dar conta da demanda por novos escravos.[7] Em 1726 o rei Agaja escreveu uma carte ao rei George I da Inglaterra se orgulhando de suas conquistas militares e da exibição das cabeças cortadas de seus inimigos. O escravismo doméstico tradicional cede lugar para as formas mercantis de escravidão.[8] Katia Mattoso ao tratar do contexto da escravidão na África presente antes da chegada dos portugueses: “nessas sociedades [africanas] muito hierarquizadas, o escravo já existia, mas só era comum no Benin e em regiões sudano sahelianas. O cativo, contudo, estava integrado à família e não podia ser vendido, sendo um escravismo quase patriarcal que excluía o tráfico”. Com os portugueses introduz-se o tráfico de escravos: “assim a escravidão africana nasceu do tráfico e pelo tráfico, pois era preciso alimentá-lo pelo sangue sempre renovado”.[9]
[1] NARLOCH, Leandro.
Escravos. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017. p.75
[2] MATTOSO, Katia M. Queirós. Ser escravo no Brasil. Rio de Janeiro: Editora
Vozes. Edição do Kindle, 2016, p.41
[3] FLORENTINO, Manolo. Em
costas negras, São Paulo: UNESP, 2014, p. 76
[4] NARLOCH, Leandro.
Escravos. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017. p.101; Rediker, Marcus. 2007. The Slave Ship: A Human History. London: Viking
[5] FLORENTINO, Manolo. Em costas negras, São Paulo: UNESP, 2014, p. 87
[6] GOMES, Laurentino.
Escravidão, v.II, São Paulo: Globo, 2021. p.157
[7] FLORENTINO, Manolo. Em
costas negras, São Paulo: UNESP, 2014, p. 90, 100
[8] FLORENTINO, Manolo. Em
costas negras, São Paulo: UNESP, 2014, p. 102
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