domingo, 5 de setembro de 2021

A mumificação no antigo Egito

 

No Egito a alquimia desenvolveu técnicas para esmaltar e colorir vidros, fabricar perfumes, extrair óleos de plantas e tingir. Alguns papiros de Tebas do século III d.C. mostram experimentais alquímicos de transmutação de metais com informações práticas sobre como fazer diversas ligas metálicas. Os egípcios desenvolveram técnicas de embalsamamento muito embora o mérito de tais técnicas residia no clima seco das terras do Nilo e ausência de germes no ar e na areia.[1] As únicas fontes históricas de tais técnicas são Heródoto (484-425 a.c.)[2] e Diodoro quando a arte já estava em decadência.[3] Georde Rawlinson estima em cerca de 150 mil embalsamentos por ano, realizados tanto para classe pobre como para a opulenta, o que permite concluir que essa atividade gerava uma riqueza significativa. A prática era um ato mágico religioso[4] que se estendeu de 2000 a.c. a aproximadamente 700 d.c[5] e tem suas origens em métodos para defumação e curagem de peixes, de modo que, no grego Heródoto (que visitou o Egito em 450 a.c.)  e Diodoro de Siculus usam a palavra taricheuo para estes dois significados. Heódoto descreve as etapas com 1) remoção do cérebro e vísceras, exceto o coração e rins, 2) limpeza das vísceras com especiarias, 3) preenchimento das cavidades do corpo com mirra e outras substâncias armáticas e costuma da incisão, 4) tratamento do corpo com natrão e lavagem, 5) unção do corpo com óleos de cedro e colocação das bandagens. As etapas finais de mumificação aparecem representadas na tumba de Thoy de 1200 a.c.[6] Para secar todos os fluidos do corpo inicialmente os embalsamadores usavam areia, posteriormente natrão (uma mistura de carbonato de sódio e bicarbonato de sódio) um tipo de sal encontrado nas margens de lagos próximos ao Cairo, em particular em Uadi el Natrum[7] e com melhores resultados[8]. Strabo se refere a três centros de produção de natrão, o mais importante era um oásis chamado Wadi Natrun abastecido com as águas do Nilo. O segundo centro ficava próximo ao porto de naucratis no delta do Nilo. O terceiro em El Kab no Alto Egito. O natrão extraído destas três localidades era um importante monopólio estatal nos tempos de Ptolomeu (320 a.c.). Além da mumificação o natrão era usado como incenso em ritos religiosos e na fabricação de vidro.[9] Em 2018 foi encontrada em Saquar uma oficina de mumificação datada do período persa, entre 664-404 a.c contendo jarros que armazenariam os óleos e substâncias utilizadas para embalsamar os mortos. Ramadan Badry Hussein, diretor de excavações da necrópole de Saquar acredita que será possível analisar a composição química dos registros para encontrar as fórmulas utilizadas pelos sacerdotes do Egito Antigo da XXVI Dinastia.[10] David Silverman observa que, por volta da Quarta Dinastia, a prática de mumificação, ou seja, o método artificial de preservação dos mortos, estava começando a ocorrer regularmente,  embora métodos já estivessem sendo desenvolvidos mais cedo, durante o dinástico anterior.[11] John Harris argumenta que a extração abrupta das vísceras da cavidade abdominal e toráxica não proporcionava oportunidade para estudos na área de anatomia.[12] Segundo Heródoto: “tiram-lhe primeiro o cérebro, por meio de um ferro recurvado, que introduzem nas narinas, e com o auxílio de drogas, que injetam na cabeça”[13]. O Livro dos mortos apresenta diversos encantamentos, amuletos, imagens e palavras mágicas para proteger os mortos.[14] Para os egípcios os encantamentos presentes, por exemplo, nas paredes das pirâmides erigidas ao final da V e início da VI dinastia mostram a crença de que tais gravuras detinham um poder mágico[15]. Entre os amuletos encontrava-se o udjad, o olho de Hórus.[16]


[1] CERAM, Walter. Deuses, túmulos e sábios, Rio de Janeiro:Bib. Exército, 1971, p.155; COON, Carleton. A história do homem. Belo Horizonte:Itatiaia, 1960, p.205; MATTOS, Aníbal.O homem das cavernas de Minas Gerais, Belo Horizonte:Minas Gerais, 1961, p.29; CHILDE, Gordon. A evolução cultural do homem, Rio de Janeiro:Zahar, 1966, p.163

[2] Vatican Museums, Rome:Libreria Editrice Vaticana, 2011, p.107

[3] STROUHAL, Eugen. A vida no antigo Egito. Barcelona:Folio, 2007, p. 259

[4] FORBES, R. Chemical, culinary and cosmetic arts. In: SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, Oxford Clarendon Press, v.I, 1958, p. 266

[5] RAWLINSON, George. A history of ancient Egypt, London, 1881, p. 511

[6] FAGAN, Brian. Los setenta grandes inventos y descobrimentos del mundo antiguo, Barcelona:Blume, 2005, p. 266

[7] MOKHTAR, Gamal. História geral da África, II: África antiga, Brasília : UNESCO, 2010, p.135

[8] DEARY, Terry. Espantosos egípcios, São Paulo:Melhoramentos, 2004, p. 49

[9] FORBES, R. Chemical,, culinary and cosmetic arts. In: SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, Oxford Clarendon Press, v.I, 1958, p. 260

[10] https://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/oficina-de-mumificacao-revela-segredos-da-conservacao-dos-mortos-no-antigo-egito-22886655

[11] DAVID, Silverman. Introduction to Ancient Egypt and Its Civilization, Semana 6, Mummies and Mummification Part 1, 2021 https://www.coursera.org/learn/introancientegypt/lecture/tILst/mummies-and-mummification-part-1

[12] HARRIS, J. O legado do Egito, Rio de Janeiro:Imago, 1993, p.138; JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 190

[13] MATTOSO, Antonio. História da civilização, Lisboa:Ed Sá da Costa, 1952, p.76; FAGAN, Brian. Los setenta grandes inventos y descobrimentos del mundo antiguo, Barcelona:Blume, 2005, p. 266; JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 225; WEST, John Anthony. The traveler’s key to ancient Egypt, New York:Quest, 2012, p. 57; LANGE, Kurt. Pirâmides, esfinges e faraós, Belo Horizonte:Itatiaia, 1958, p. 122

[14] THORNDIKE, Lynn. A History of magic and experimental science, v.I, Columbia University Press, 1923, p.9

[15] EDWARDS, J. As pirâmides do Egito, Rio de Janeiro:Record, 1985, p.31

[16] Grande História Universal: o princípio da civilização, Barcelona:Folio, 2001, p.100






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