Joahan
Huizinga (figura) mostra que na literatura, artes e pintura a transição para era moderna
se fez de forma gradual: “é-nos difícil
imaginar que o espírito pudesse cultivar as antigas formas de pensamento e de
expressão medievais e aspirar ao mesmo tempo à visão antiga da razão e da
beleza”[1].
Petrarca na literatura, Nicolas Oresme na filosofia e van Eyck na pintura são
exemplos de homens da idade média que já mostram claramente traços de
modernidade em seus trabalhos. Oresme rompeu o equilíbrio entre razão e
experiência insistindo nos limites da razão.[2] Decamerão
de Boccaccio, A Divina Comédia de Dante são outros exemplos de obras de autores
medievais um período que eles próprios consideravam de desprovido de valor
cultural.[3] Peter
Burke mostra que os livros do século XVI O
Cortesão de Castiglio e O Príncipe
de Maquiavel estão mais próximos da idade média do que parece[4]. João
Salisbury, Dante e os poetas goliardos das universidades medievais[5] eram
entusiastas da literatura grega como qualquer outro autor renascentista[6]. Dante
tomou Virgílio como guia no inferno. Erasmo tinha Cícero como um santo[7] Para
José Silveira da Costa: “deve ser
definitivamente ser descartada a interpretação do Renascimento como antítese
absoluta à Idade Média em geral e à Escolástica em particular. Apesar da
euforia inicial com que foi celebrada o que parecia ser a verdadeira libertação
das forças criativas do espírito humano, ainda estavam muito próximas as fontes
que haviam preservado e garantido esse mesmo potencial”. Nesse sentido José
Silveira da Costa analisa o Renascimento como um movimento de continuidade ao
invés de ruptura com o passado: “mais do
que contrapô-lo, convém considerar o Renascimento e a Idade Média com duas
épocas distintas, mas ligadas entre si por relações profundas, principalmente
nos aspectos religiosos e filosóficos”.[8] Frances
Gies mostra que muitas das obras artísticas na pintura e literatura da
Renascença encontram seus fundamentos em artistas do período medieval como
Giotto, Dante, Petrarca, Boccaccio e Chaucer, que viveram antes de 1400[9]. Frances
Yates mostra que o Renascimento busca a sabedoria dos antigos: “a história do homem não representa uma
evolução da primitiva origem animal para a complexidade e progresso, sempre
crescentes; o passado era sempre melhor que o presente e o progresso era a
revivescência, o renascimento da Antiguidade. O humanista clássico recuperava a
literatura e os monumentos da Antiguidade Clássica com os sentimentos de
retornar ao ouro puro de uma civilização melhor e mais elevada que a sua”.[10] Roland Mousnier na mesma linha
argumenta que a França do século XII e a Itália do século XVI demonstraram
interesse pela antiguidade clássica sendo as escolas catedrais de Reims,
Chartres, Órleans de Paris centros do humanismo e Chartres o centro dos estudos
latinos na Europa. O teólogo cristão João Salisbury ao lado de Hugo de São
Vitor, Anselmo de Cantuária e Pedro Abelardo, foi um dos responsáveis pela
transformação ocorrida no século XII com relação ao modo como se encarava o
conhecimento e a filosofia ao fim da Idade Média.
[1] HUIZINGA, Johan. O
declínio da idade média, Rio de Janeiro:Ulisseia, s/d, p.327
[2] JÚNIOR, Hilário Franco.
A idade média nascimento do Ocidente, São Paulo:Brasiliense, 2004, p.122
[3] CORNELL, Tim; MATHEWS,
John. Renascimento v.I ,Grandes Impérios e Civilizações, Lisboa:Ed. Del Prado,
1997, p. 41
[4] BURKE, Peter. O
renascimento, Lisboa:Textos&Grafia, 1997, p.13
[5] ECO, Umberto. Idade
média: bárbaros, cristãos e muçulmanos, v.I, Portugal:Dom Quixote, 2010,
p.11-12; HASKINS, Charles. A ascenção das universidades, São Paulo: Danúbio,
2015, p.1417/1743
[6] BURNS, Edward McNall.
História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1959, p.391
[7] PERNOUD, Régine. Idade
Média: o que não nos ensinaram, Rio de Janeiro:Agir, 1994, p. 20
[8] COSTA, José Silveira
da. A escolástica cristã medieval, Rio de Janeiro, 1999, p.190
[9] GIES, Frances &
Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 239
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