Keila Araújo[1] mostra como
a tomada de Ceuta de 1415 foi descrita de forma laudatória pelo cronista-mor do
reino, Gomes Eanes de Zurara, na década 1450, pelo rei D. Afonso V na obra Cronica
da Tomada de Ceuta por el rei D. João I contribuindo para a construção da
identidade nacional portuguesa. Faria de Souza por sua vez ao escrever no
período da União Ibérica (1580-1640) creditou o esforço marítimo do
empreendimento a D. Henrique ao invés da Coroa portuguesa. Em 1437 uma campanha
mal sucedida em Tanger no norte da Africa levou a uma rendição pela qual as
forças portuguesas se retiraram, deixando o infante D. Fernando, irmão de D.
Henrique, como preço da liberdade para o exército e penhor da devolução de
Ceuta (conquistada pelos portugueses em 1415). D. Henrique retornara à Portugal
deixando o irmão preso, recusando-se a entregar Ceuta[2]. D.
Fernando acaba morrendo no cativeiro em 1443, de tal modo que, pelo seu
sacrifício em nome dos interesses nacionais, viria a ganhar o epíteto de
Infante Santo. Nas palavras de Oliveira Martins: “O pobre infante é o
primeiro mártir da nossa epopeia, e se nos honramos do muito que fizemos, é
agora o momento de deixar aqui uma lágrima de saudade e pena por esse infeliz
precursor do nosso império!”.[3] O
infante d. Fernando, irmão de D. Henrique, tornou-se objeto de culto em
especial entre os dominicanos no mosteiro da Batalha, ao ponto do bispo de
Leiria D. Martim Afonso Mexia (1605-1615) proibir as festas em sua homenagem
uma vez que a bula Coelestis Hierusalem do papa Urbano VIII de 1634
proibia o culto de pessoas que não tivessem sido beatificadas pela igreja, a
não ser que se provasse um culto imemorial. O cronista frei João Alvares (1406-1490), por
sua vez, absolveu D. Henrique de qualquer culpa pelo destino trágico do irmão.
[1] ARAÚJO, Keila. A Construção e desconstrução de um símbolo: leituras sobre a
conquista de Ceuta, Historia & Parcerias, ANPUH, 2019,
https://www.historiaeparcerias2019.rj.anpuh.org/anais/trabalhos/apresentacaoemst#K
[2] MARTINS, Oliveira. História de Portugal, Lisboa:Versial, 2010, p. 139 Edições
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