sexta-feira, 6 de agosto de 2021

A política "viradeira" de Maria I

 

O reinado de Maria I, iniciado em 1777, foi por muitos considerado o período da "viradeira", ou seja, de um retrocesso face à política reformista ilustrada do governo de José I e seu célebre ministro, Sebastião Carvalho e Melo, que se tornou marquês de Pombal em 1769. Homem da confiança de Sebastião Carvalho e Melo, Diogo Inácio de Pina Manique, foi nomeado Intendente-Geral da Polícia depois da queda do Marquês de Pombal, tornando-se quem de fato governou durante o reinado de D. Maria I até que, em 1799, o Príncipe D. João VI assumiu a regência, por incapacidade mental da mãe. Fernando Cacciatore observa que se com Maria se encerraria o período de Pombal, por outro lado, a política de reformas iniciado por Pombal prosseguiu com a criação em 1779 da Academia de Ciências de Lisboa pela influência do duque de Lafões. No Brasil em 1796 seria criado o Seminário de Olinda organizado pelo bispo José Joaquim de Azeredo Coutinho. No plano econômico as Companhias de comércio do Grão Pará e Maranhão e a Companhia de Comércio de Pernambuco e Paraíba inauguradas por Pombal seria extintas respectivamente em 1778 e 1779 extinguindo-se o monopópilio do qual gozavam tais companhias restabelecendo o livre comércio entre Portugal e Brasil, com a devida licença das autoridades do Reino. Com a guerra de independência nos Estados Unidos em 1777 e revolução de Santo Domingo no Haite em 1798 o Brasil foi favorecido respectivamente pela elevação dos preços do algodão e do açúcar. O alvará de 1785 que proíbe as manufaturas de tecidos finos no Brasil foi considerado um símbolo do retrocesso do reinado de Maria I[1] na medida em que consolida a posição da colônia como produtora de matéria prima enquanto a metrópole como produtora de manufaturas[2]. Para Rodrigo de Sousa Coutinho (figura): “a agricultura deve ainda por muitos séculos ser-lhes [aos luso brasileiros] mais proveitosa que as artes [indústrias] que devem animar-se na metrópole para assegurar e estreitar o comum nexo, já que a estreiteza da terra em Portugal lhes nega as vantagens de uma extensa agricultura”. Para Fernando Novais “Ao determinar a supressão das manufaturas existentes no Brasil (...), bem como ao intentar coibir a penetração de economias mais desenvolvidas no mercado ultramarino, a política colonial portuguesa reage a uma situação de fato, que deve ser encarada com objetividade, mas é indiscutível que ao fazê-lo procura preservar em moldes tradicionais o funcionamento do sistema, e nesse sentido é justo falar-se em persistência de uma orientação mercantilista”.[3] Encarregado de colocar em execução o Alvará de 1785 ao todo 13 teares foram apreendidos de propriedade de propriedade de Jacob Munier (5), José Antonio Lisboa (3), Miguel Xavier de Moraes (1), José Maria Xavier (1) e Sebastião Marques(2).[4] Em Minas Gerais o novo governador Luís da Cunha Menezes que assumiu em 1783 prendeu e espancou tecelões em cumprimento ao Alvará de 1785.[5] As escassas apreensões de teares que resultaram das buscas empreendidas pelas autoridades coloniais mostram que o impacto do Alvará foi reduzido. Um levantamento feito por Nicolau Moreira entre 1785 e 1808 mostra indústrias de panos grossos para uso pessoal de negros, sacos, mantas, cobertores e redes. No Rio Grande Sul é registrada a produção de tecidos grossos de lã. Na Barra do Rio Negro em 1797 há a produção de panos de algodão de rolo com 18 teares e 10 rodas de fiar. [6]



[1] Vice reinado de Luis de Vasconcelos: correspondência com a Corte, ano de 1788, RIGHB, 36, I, 1873, p.135-156

[2] GARCIA, Fernando Cacciatore. Como escrever a história do Brasil, Porto Alegre: Sulina, 2014, p. 421

[3] NOVAIS, F. "A proibição das manufaturas no Brasil e a política econômica portuguesa no fim do século XVIII". In: Aproximações: ensaios de história e historiografia. São Paulo: Cosac & Naify, 2005, pp. 153-155.

[4] EDMUNDO, Luiz. O Rio de Janeiro no tempo dos vice reis, Rio de Janeiro:Conquista, 1956, v.3, p.648; Revista Trimestral de historia e geografia, Jornal do IHGB, Rio de Janeiro: Laemmert, 1848, p.232; BRITO, José Gabriel Lemos. Pontos de partida para a história econômica do Brasil. Brasiliana v. 155, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1980, p.158; MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 521

[5] CALDEIRA, Jorge. História do Brasil, São Paulo:Cia das Letras, 1997, p.111

[6] Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, Informações sobre o estado da indústria nacional, p.12-23. Cf. CARONE, Edgar. O Centro Industrial do Rio de Janeiro e a sua importante participação na economia nacional (1827-1977), Rio de Janeiro:Ed. Cátedra, 1978, p.52




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