terça-feira, 27 de julho de 2021

Os minutos medievais

 

No século XII surgem os sinos laicos para proclamação do tempo do trabalho, que se juntam aos sinos dos conventos das igrejas que marcavam as horas canônicas dos ofícios religiosos.[1] Segundo Paulo Miceli o controle do tempo foi uma das principais atribuições da Igreja medieval.[2] Com os primeiros relógios mecânicos o tempo deixa de ser marcado somente pelos sinos das igrejas e passa a ser marcado pelos relógios das torres de vigia[3]. Há uma secularização do tempo uma vez inserido no ambiente das atividades econômico e sociais que estavam florescendo no século XIII[4]. Jacques le Goff destaca que “o relógio comunal tornou-se um instrumento de dominação econômica, social e política exercido pelos mercadores que controlavam a comuna”. Em Paris em 1370 Charles V ordenou que todos os sinos da cidade fossem sincronizados com o relógio Conciergerie em Palais Royal. Até então, sem a precisão dos relógios mecânicos, as pessoas na idade média estavam acostumados com uma hora variável em função da estação ser inverno (dias mais curtos) ou verão (dias mais longos), além do que não tinham preocupação com a preocupação de dividir a hora em sessenta minutos, uma subdivisão usada apenas por astrônomos e que tinha origem na Babilônia.[5] Robert Delort que a cidade industrial e o mercado ao fim da idade média marca a “grande mutação intelectual” o advento do “tempo leigo” “tempo urbano”[6] o “tempo do mercador”.[7] O relógio colocado na torre comunal em Caen em 1317 mostra o triunfo do “tempo dos mercadores” sobre o “tempo da Igreja”.[8] Até a primeira metade do século XVI o “tempo vivido” relativo ao senso comum tornava desnecessária a marcação de tempo mais precisa[9] sendo demarcada por sinos dispostos nas igrejas ou mesmo pelas autoridades urbanas para anunciar e impor a sua definição de jornada de trabalho[10].  



[1] GOFF, Jacques. Trabalho. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do Ocidente medieval. v.II, São Paulo:Unesp, 2017, p. 629

[2] MICELI, Paulo. O feudalismo, São Paulo: Atual, 1986, p. 22

[3] LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 169

[4] NISBET, Robert. História da ideia do progresso. Brasília:UNB, 1980, p. 100; MORTIMER, Ian. Séculos de transformações. Rio de Janeiro:DIFEL, 2018, p. 151

[5] GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 215

[6] DELORT, Robert. La vie au moyen age, Lausanne:Edita, 1982, p.64

[7] LE GOFF, Jacques. O homem medieval, Lisboa: Editorial Presença, 1989, p.94

[8] FOSSIER, Robert. As pessoas da idade média, Rio de Janeiro: Vozes, 2018, p. 56

[9] ROSSI, Paolo. Os filósofos e as máquinas. São Paulo:Cia das Letras, 1989, p. 43

[10] PIPONNIER, Françoise. Cotidiano. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do Ocidente medieval. v.I, São Paulo:Unesp, 2017, p. 321



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