Em 1952, o historiador português Jaime Cortesão foi nomeado
para dirigir a organização da “Exposição Histórica de São Paulo dentro do quadro
histórico do Brasil”, no âmbito das comemorações do IV Centenário da fundação
da cidade de São Paulo (1954-1955) em que legitima o mito bandeirante.[1] Apesar da
coragem bandeirante os marcos territoriais do Brasil tiveram como delimitação principalmente
questões naturais geográficas do que propriamente o avanço bandeirante cujo
número reduzido de homens não conseguiria justiçar a presença no Brasil
meridional de forma tão ampla: “que algumas bandeiras, por vezes reduzidas a
um número muito exíguo de homens tenha atravessado, nas duas direções esses
obstáculos, prova apenas a têmpera sobre humana desses pioneiros. Trata-se de
exceções, cujo esforço titânico excede a craveira comum e, por isso mesmo, justificam que a formação territorial estacasse
(firmasses suas estacas) à volta desses grandes marcos naturais”.[2] Para
Jaime Cortesão a bandeira foi o resultado da fusão de uma ideia força que
integrava o sentimento expansionista português com o conceito de “ilha Brasil” já
presente entre os índios, segundo o qual haveria uma comunicação entre os rios Madeira
e Guaporé através de uma lagoa chamada Eupana, de modo que o Brasil seria uma
ilha continente formada pelo encontro dos dois grandes rios Amazonas e e Prata fragmentada
por rios como o São Francisco. Havia, portanto, uma bandeira oficial que se
radicou no Amazonas e uma segunda bandeira livre cujo foco foi São Paulo. Segundo
o depoimento do padre Simão de Vasconcelos (1597-1671): “Contam os índios
versados no sertão que bem no meio dele são vistos darem-se as mãos estes dois
rios o Amazonas e o Prata em uma lagoa famosa”.[3] Demétrio
Magnoli desenvolve a noção de ilha-Brasil, o espaço mítico em que se inscrevia
a formação do território como um importante eixo estruturador da história
brasileira[4]. Alexandre
Gusmão cita o livro “Provas da História Genealógica da Casa Real Portuguesa”
em que se refere a crença de muitos geógrafos da época de que o Brasil fosse
envolvido pelo Prata e o Amazonas para justificar sua tese de “fronteiras
naturais” nos acordos para o Tratado de Madrid.[5] Segundo
Jaime Cortesão: “aquela preciosa referência ao que temos chamado o mito da
ilha Brasil deixa-nos seguir, assim, o processo mental, que o levava a conceber
uma nova ilha, bem mais real, orgânica e viável que a primeira. Essa nova ilha
dos limites naturais tinha a vantagem de atender conjuntamente às realidades
geográficas e às realidades humanas e históricas que se opunham ao condomínio
do estuário platino e aconselhavam um compromisso e partilha entre as bacias do
Prata e do Amazonas”
[1] ALVES, Daniel Vecchio.
Reconsiderações Historiográficas sobre a Teoria do Sigilo de Jaime Cortesão. Revista
Expedições, Morrinhos/GO, v. 9, n. 3, mai./ago. 2018
[2] CORTESÃO,
Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.II, São Paulo: Funag, 2006, p.382
[3] CORTESÃO, Jaime.
Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.II, São Paulo: Funag, 2006, p.143
[4] MAGNOLI, Demétrio. O corpo da Pátria
imaginação geográfica e política externa no Brasil. São Paulo: Ed. Unesp, 2007
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