segunda-feira, 12 de julho de 2021

As mutilações sofridas pelos escravos dos engenhos de açúcar

 

Entre outras invenções de Manoel Jacinto de Almeida o texto O fazendeiro do Brasil, de José Mariano Velloso, também destaca i) invenção relativa à purga do açúcar que elimina a necessidade da chamada adagoada, ii) invenção de cilindro armado de quatro raios planos para reduzir o açúcar a o ponto preciso com seu movimento circular, iii) duas pequenas tábuas que postas verticalmente aos lados direito e esquerdo das moendas, por onde se espalham as canas já fraturadas, mas que devem passar novamente pela moagem, a fim de serem bem espremidas, e ao mesmo tempo com outra tábua empurrando para dentro das moendas as ditas canas fraturadas, livrando desta forma os trabalhadores de as impelirem com as mãos, causa de frequentes e terríveis acidentes segundo Antonil.[1] Por esta razão era comum manter-se um facão próximo para amputar um braço ou mão em caso de necessidade e assim evitar que o corpo inteiro fosse tragado pela máquina[2]. Gilberto Freire reporta anúncios de jornais de negros fugidos no século XIX que tinham as mãos comidas pelas moendas.[3] Os capuchinhos frei Miguel Gattina e frei Dionísio Piacenza em visita a engenho em Pernambuco em 1667 relatam os riscos dos escravos em terem suas mãos e braços colhidos pelo maquinismo.[4] O jesuíta irlandês Richard Fleck em um livro de memórias escrito em 1655 descreve os engenhos de açúcar que encontrou na sua passagem no Rio de Janeiro: “durante a estação da colheita, trabalha-se noite e dia sendo bastante perigoso o ofício de colocar as canas no moinho; se, por negligência um dedo é apanhado pela engrenagem, todo o corpo é carregado, razão pelo qual os negros usam sempre um machado, prestes a sacrificarem uma mão ou um braço se tal desgraça lhes suceder”.[5]



[1] O Patriota, março 1813, n.3, p.32; SCHWARTZ, Stuart. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial. São Paulo: Cia das Letras, 1988, p. 130; CAMPOS, Raymundo. Grandezas do Brasil no tempo de Antonil, São Paulo:Atual Editora, 1996, p. 21; MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 281

[2] GOMES, Laurentino. Escravidão, v.I, São Paulo: Globo, 2019. p.327

[3] FREIRE, Gilberto. O escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX, Brasialan v. 370, São Paulo: Ed. Nacional, 1979, p. 30

[4] JÚNIOR, Manuel Diegues. População e açúcar no Nordeste do Brasil, São Paulo:CNA, 1954, p.67

[5] BARDI, Pietro Maria. Mestres, artífices, oficiais e aprendizes no Brasil, Banco Sudameris Brasil, 1981, p. 40



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