sexta-feira, 11 de junho de 2021

Os ataques aos indígenas nas missões do Guaíra no século XVII

 

A bandeira de 1629 de Raposo Tavares teria feito nove mil prisioneiros índios no Guaíra e os trazidos para São Paulo dos quais muitos morreram pelo caminho. Novas incursões aumentaram o número de cativos para um total estimado entre trinta e sessenta mil. As primeiras missões atacadas foram a de Santo Antônio com uma fúria segundo o relato de jesuítas “com tal crueldade que não parecem ser cristãos, matando as crianças e velhos que não conseguem caminhar” inclusive cometendo assassinatos dentro das igrejas dos que ali se refugiavam.[1] Segundo relato do padre espanhol Justo Masilla: “Em que terra estamos, que vassalos de Sua majestade católica fazem guerra a vassalos da mesma majestade, também católicos, sem outro motivo senão fazê-los escravos e cativos ? Em que terra estamos, que se permite seja feito o que nem entre hereges e mouros se faz? “. Para o padre Mansilla São Paulo era uma vila “de gente desalmada e rebelde, que não faz caso nem das leis do Rei nem das de Deus”. Em 1637 com as missões do Guaíra destruídas por completo os bandeirantes liderados por Raposo Tavares e Fernão Dias Paes iniciam os ataques a tape mais ao sul com a mesma fúria destruidora, segundo o relato de reunião da Companhia de Jesus realizada em Córdoba “feras mamelucas, compostas todas de homens facínoras, ímpios e tolerados ladrões”.[2] Em resposta aos ataques dos paulistas às missões em Guaíra em busca do apresamento de índios, o padre Francisco Diaz Tano conseguiu junto ao papa em Roma uma breve Commissum Nobis (1639) de Urbano VIII  mandando publicar no Brasil a bula Veritas ipsa de 1537 que determinava a liberdade dos indígenas da América com a proibição de serem escravizados na medida em que são reconhecidos como “verdadeiros homens – veros homines” de modo que “declaramos, que os ditos Índios, e todas as mais gentes que daqui em diante vierem à noticia dos Cristãos, ainda que estejam fora da Fé de Cristo, não estão privados, nem devem sê-lo, de sua liberdade, nem do domínio de seus bens, e que não devem ser reduzidos a servidão”.[3] Em 1640 o padre Tano apresentou o referido breve ao administrador eclesiástico Pedro Albernaz para que desse publicidade as orientações de Roma. Isso gerou a reação da Câmara Municipal de São Paulo, que expulsou todos os jesuítas inacianos da cidade e organizou uma nova expedição contra os índios. No entanto em maio de 1641, após o fim da União Ibérica 1580-1640 e consequente elevação ao trono português de D. João IV os vicentinos apresentaram ao novo rei as consequências negativas da liberdade dos índios em outras capitanias, onde teriam se aproveitado da mesma para se aliar a estrangeiros e promovido ataques a povoações e fazendas. Em 1647 o rei português decretou anistia para todos que cumprissem suas determinações no sentido de garantir a liberdade aos indígenas.[4]

[1] TOLEDO, Roberto Pompeu de. A capital da solidão, Rio de Janeiro: Objetiva, 2012, p. 164

[2] TOLEDO, Roberto Pompeu de. A capital da solidão, Rio de Janeiro: Objetiva, 2012, p. 168

[3] VIANNA, Helio. História do Brasil, primeira parte, período colonial. São Paulo: Melhoramentos, 1972, p.208

[4] VIANNA, Helio. História do Brasil, primeira parte, período colonial. São Paulo: Melhoramentos, 1972, p.209



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