quinta-feira, 20 de maio de 2021

Sangue limpo

 

A Ordem Terceira de São Francisco de Vila Rica tinha no seu estatuto de 1765 uma proibição para admissão de “mulatos, judeus, mouros, hereges e seus descendentes até a quarta geração”. A irmandade do Carmo de Ouro Preto admitia apenas os de “sangue limpo, boa vida e costumes e capazes de pagar sua subscrição anual”. O Colégio dos jesuítas em São Paulo registra na ordenação de Alexandre de Gusmão em 1721 que este estava apto pois “cristão velho e de limpo sangue, sem raça de nação infecta, sem rumor em contrário”. [1] Charles Boxer observa que tanto nos documentos oficiais portugueses como na correspondência privada até o século XVIII era muito comum a referência “pureza de sangue” e a “raças infectas”, no entanto, Edgar Prestage observa em estudo publicado em 1923: “É motivo de consideração o fato de Portugal, à exceção dos escravos e dos judeus, não fazer qualquer distinção de raça ou cor e todos os seus súditos, logo que convertidos ao catolicismo, serem elegíveis para postos oficiais”.[2] Russell Wood mostra que em seu conceito do Portugal do século XV a pureza de sangue se referia á pureza religiosa, “não corrompido” por uma ascendência judaica ou moura. Em 1749 um candidato à Ordem Terceira de São Francisco na Bahia garantiu diante de cinco testemunhas “que era de indubitável brancura e inquestionavelmente um cristão velho, puro de sangue sem sangue de judeu, mouro, mourisco, mulato ou qualquer outra nação infectada daqueles proibidos por nossa Sagrada Fé Católica”.[3] A Ordem dos Carmelitas descalços de Santa Teresa criada em 1686 em Olinda não admitia qualquer noviço nascido no Brasil por mais “puro” que fosse seu sangue.[4]



[1]CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.130

[2] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 242, 252

[3] RUSSELL WOOD, A. Histórias do Atlântico português, São Paulo: UNESP, 2021, p. 69

[4] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 252



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