sábado, 22 de maio de 2021

A Casa dos Vinte e Quatro em Lisboa

 

Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil destaca que no Brasil as corporações de ofícios, segundo moldes trazidos pela metrópole portuguesa, tiveram seus efeitos perturbados por conta da economia escravista no Brasil, a indústria caseira e a falta de artífices livres.[1] Em sua História de Portugal Oliveira Marques aponta que os artesãos lusitanos somente formaram confrarias religiosas pois não existia transformação de matéria prima em Portugal.[2] A Casa dos Vinte e Quatro foi criada em 16 de dezembro de 1383, por D. João, Mestre de Avis (futuro D. João I) com o objetivo de permitir que os mesteiraes (termo do português medieval referindo-se aos mestres da corporação[3]) participassem no governo da cidade elegendo um presidente chamado Juiz do Povo.[4] Entre os vinte e quatro representantes em Lisboa e no Porto eram nomeados quatro deles, os procuradores dos mesteres para representar os interesses da corporação no Conselho Municipal com direito de voto[5]. O termo mesteirais designa, na sociedade portuguesa medieval, um grupo de artesãos dentro de uma postura corporativista, profissional e organizada, dentro de trabalhos artesanais, também chamado de corporação de ofício. A primeira regulamentação dos ofícios em Portugal data de 1489, numa época em que as guildas europeias já estavam em declínio, o que se explica segundo Marcelo Caetano diante do incipiente desenvolvimento da indústria em Portugal.[6] A estruturação jurídica de tais corporações de ofícios de Lisboa ocorre com o “Regimento de todos os ofícios mecânicos da mui nobre e sempre leal cidade de Lisboa” de 1572 com uma divisão em 24 núcleos de acordo com o ofício que desempenhavam em sua cidade e que deu origem a “Casa dos vinte e quatro” criada por D. João I. Durante o século XVII a Casa do Vinte e quatro tinha grande prestígio político. Nos motins de 1664 em èvora em portesto a tomada de Évora pelos espanhóis e diante dos saques que se seguriam o Condede Catelo Melhor apresentou explicações ao Juiz do Povo da Casa dos Vinte e Quatro sobre as medidas para debelar a crise militar numa tentativa de acalmar a população.[7] Tais corporações não deixaram registros escritos de suas técnicas que eram mantidos em segredo.[8] Charles Boxer destaca que “os principais oficiais e artesãos elegiam anualmente dentre os membros de sua corporação doze representantes (conhecidos como os Doze do Povo), no caso da maioria das cidades, e 24, no caso de Lisboa e de algumas outras, onde formavam a casa dos vinte e quatro”. As regras da Santa Casa de Misericórdia em Lisboa que reuniam 600 membros dos quais a metade eram de mecânicos artesão de guildas representados pela Casa dos Vinte e Quatro.[9] Pela regra de 1618 eram aceites “homens de boa consciência e reputação, tementes a Deus, modestos, cariosos e humildes” além de ter “pureza de sangue” sem qualquer herança mourisca ou judaica. Segundo Charles Boxer “Deram-se certamente abusos e desvios, especialmente durante o século XVIII mas, no geral, as Misericórdias mantiveram padrões surpreendentemente elevados de honestidade e eficiência”.[10] Os artesãos da coroa portuguesa e suas possessões eram submetidos a rigoroso exame prescrito pelo Regimento dos Ofícios Mecânicos compilado por Duarte Nunes Leão de 1572. A Casa dos 24 de Lisboa que ficava em edifício próprio junto ao Hospital de Todos os Santos no Rossio reuniam-se em 1480 em confrarias religiosas tendo como patrono um Santo católico sendo conhecidos como Bandeira dos Ofícios. Entre uma das grandes decisões tomadas pela Casa dos Vinte e Quatro de Lisboa está o apoio a D. João IV para se tornar rei de Portugal na restauração da independência portuguesa em 1640 quanto Portugal até então estava sob domínio da coroa espanhola.

[1] BARDI, Pietro Maria. Mestres, artífices, oficiais e aprendizes no Brasil, Banco Sudameris Brasil, 1981, p. 24

[2] NUNES, Ruy Afonso da Costa. História da educação na idade média, Campinas:Kirion, 2018, p.202

[3] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 32

[4] http://arquivomunicipal.cm-lisboa.pt/pt/acervo/fundo-historico/fundo-camara-municipal-de-lisboa/casa-dos-vinte-e-quatro/

[5] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 264

[6] CUNHA, Luiz Antonio. Aspectos sociais da aprendizagem de ofícios manufatureiros no Brasil colônia. Forum:Rio de Janeiro, v.2, out/dez 1978, p.46

[7] CORTESÃO, Jaime. Alexandre Gusmão e o Tratado de Madrid, v.I, São Paulo: Funag, 2006, p.152

[8] MARTINS, Mônica de Souza Nunes. A Arte das corporações de ofícios: as irmandades e o trabalho no RIo de Janeiro colonial. CLIO. SÉRIE HISTÓRIA DO NORDESTE (UFPE), v. 30, p. 4, 2012.

[9] https://www.facebook.com/watch/?v=1363806454007789

[10] BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 276



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