Na mineração as técnicas usadas eram rudimentares. Shozo Motoyama aponta que ainda que intelectuais como Domingos Vandeli conhecessem a obra De Re Metalica de Agrícola publicada em 1556 seu efeito era mínimo no desenvolvimento das técnicas diante do empirismo que predominava[1]. Em memória apresentada à Academia de Ciências de Lisboa em 1792 Vandelli afirma “a lavagem das terras ou areias no Brasil se faz com o método já escrito por Agrícola, por Ulloa em suas viagens”. Em Pluto Brasiliensis publicado em Berlin em 1833 Eschwege comenta a superficialidade das pesquisas em mineração no Brasil colônia: “falta-lhe, em compensação, paciência para realizar serviços que não produzem ouro logo nos primeiros oito dias”.[2] Eschwege salienta que a mineração do ferro no Brasil foi aprendida dos africanos.[3] Desde o século XVIII, a maior parte dos escravos na região de Minas Gerais eram originários da Costa da Mina, na África, onde os conhecimentos de mineração e metalurgia do ouro eram altamente desenvolvidos[4 de modo que era vendidos com grande prêmio nas regiões mineradoras.[5] Nos estados do Akan grupo ético do Gana e Costa do Marfim o ouro era a moeda local sendo bastante desenvolvida a metalurgia.[6] O livro Histoire générale des voyages de Antoine Prevost publicado em 1750 registra a técnica dos negros da Mina naturais do reino de Tombuco e Bambine / Bambuc.[7] Na atual Nigéria haviam os igbos peritos em metalurgia de barras e pulseiras de ferro e pequenas peças em miniatura conhecidas como anyu.[8] Os congoleses e os mbundu/ambundu sabiam trabalhar com ferro e cobre.[9] No século XVII o viajante europeu capuchinho italiano Giovanni Cavazzi destaca a habilidade dos artífices negros no trabalho de serralharia[10]. Eram negros os operadores dos dois fornos rústicos e da forja que em 1591 Afonso Vieira teria feito funcionar utilizando o ferro do Morro de Ipanema.[11] Russell Wood mostra que os portugueses tinham receio de contratar mineiros especializados da Hungria ou da Saxônia que poderiam colocar em risco as riquezas da colônia. Russell Wood mostra que o conhecimento dos negros em metalurgia era muitas vezes usado para adulteração do ouro misturando-o com enchimentos de prata, ferroe e cobre.[12] Em 1789 em carta de Luis Antonio de Sousa ao conde de Oeiras relata suas atividades numa fábrica de forja em Sorocaba, em que solicita um mestre ferreiro. Luis Antonio mandou trazer preso do Rio de Janeiro, o mestre Joao de Oliveira de Figueiredo, que estava se preparando para voltar para Angola e que na carta é referido como um negro “de rude inteligência”, porém hábil metalurgista. Na carta Luis Antonio solicitava também a vinda “de outros mestres de Biscaia para estas fábricas”[13]. Richard Burton relata as técnicas primitivas usadas no século XIX em Morro Velho: “o mineiro brasileiro sempre descuidou do estacamento e das paredes. Ignorava as bombas por completo e, assim, quando a mina se inundava, era compelido a abandoná-la. Rude, porém, como fosse o seu sistema, veremos que foi adotado por todos os mineiros ingleses dos dias presentes e que os últimos se contentaram com poucos e insuficientes melhoramentos”.[14] Roy Nasch aponta que aos negros africanos devemos a fundição do ferro: “os norte americanos de Pittsburg deveriam ir em romarias ao coração da África como os maometanos vão a Meca” em reconhecimento por esta invenção. [15] Segundo Calógeras: “o processo africano de colaboração direta do ferro, o método dos cadinhos, disseminou-se pelo distrito aurífero”.[16]
[1] MOTOYAMA, Shozo.
Prelúdio para uma história: ciência e tecnologia no Brasil, São
Paulo:Edusp2004, p. 104
[2] MOTOYAMA, Shozo.
Prelúdio para uma história: ciência e tecnologia no Brasil, São
Paulo:Edusp2004, p. 155
[3] FRYRE, Gilberto. Casa
grande e senzala, São Paulo:Global Editora, 2006, p.390; SCHWARCZ, Lilia;
STARLING, Heloisa. Brasil: uma biografia, São Paulo:Cia das Letras, 2015, p.66;
SIMONSEN, Roberto. Evolução industrial do Brasil e outros estudos. Brasiliana,
n.349, São Paulo: Cia Editora Nacional, 1973, p.42; BARSA PLANETA, História do
Brasil: primeiros povos brasileiros, descobrimento e colonização, 2009, v.1, p.
274; JÚNIOR, Caio Prado. Formação do Brasil contemporâneo. São
Paulo:Brasiliense, 1986, p.220; ABREU, Capistrano. Capítulos de História
Colonial. São Paulo: PubliFolha, 2000, p. 227
[4] CALÓGERAS, Pandiá.
Formação Histórica do Brasil, São Paulo: Cia Editora Nacional, 1938, p 58;
ARAUJO, Emanuel. Arte, adorno, design e tecnologia no tempo da escravidão.
Secretaria da Cultura de São Paulo, 2013, p.34; LEITE, José Roberto Teixeira.
As raízes na África negra da siderurgia brasileira. In: ARAUJO, Emanuel. Arte,
adorno, design e tecnologia no tempo da escravidão. Secretaria da Cultura de
São Paulo, 2013, p.75-81
[5] CALDEIRA, Jorge.
História do Brasil com empreendedores, São Paulo:Mameluco, 2009, p.284
[6] RUSSEL WOOD, A. Histórias do Atlântico português, São Paulo: UNESP, 2021, p. 296
[7] BRITO, José Gabriel
Lemos. Pontos de partida para a história econômica do Brasil. Brasiliana v.
155, São Paulo:Cia Editora Nacional, 1980, p.120; FIGUEROA, Sílvia. Metais aos
pés do trono: exploração mineral e o
início da investigação da terra no
Brasil, REVISTA USP, São Paulo, n.71, p. 10-19, setembro/novembro 2006
https://core.ac.uk/download/pdf/268320408.pdf
[8] GOMES, Laurentino.
Escravidão, v.I, São Paulo: Globo, 2019. p.144
[9] BOXER, Charles. O
império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 109
[10] LEITE, José Roberto
Teixeira. As raízes na África negra da siderurgia brasileira. In: ARAUJO,
Emanuel. Arte, adorno, design e tecnologia no tempo da escravidão. Secretaria
da Cultura de São Paulo, 2013, p.76; ROBERTS, J.M. history of the world, Oxford
University Press, 1992, p.121
[11] LEITE, José Roberto
Teixeira. As raízes na África negra da siderurgia brasileira. In: ARAUJO,
Emanuel. Arte, adorno, design e tecnologia no tempo da escravidão. Secretaria
da Cultura de São Paulo, 2013, p.80; LIMA, Heitor Ferreira. História político
econômica e industrial do Brasil. São Paulo:Cia Editora Nacional, 1978, p.44
[12] RUSSEL WOOD, A. Histórias do Atlântico português, São Paulo: UNESP, 2021, p. 296
[13] LIMA, Heitor Ferreira,
Formação Industrial do Brasil, período colonial, Rio de Janeiro: ED. Fundo de
Cultura, 1961, p. 129
[14] FIORE, Elizabeth.
Presença britânica no Brasil (1808-1914). São Paulo:Pau Brasil, 1987, p. 112
[15] NASH, Roy. A conquista
do Brasil. São Paulo:Cia Editora Nacional, 1939, p. 59
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