As regras monásticas de São Bento de Núrsia no século VI destacam o valor do trabalho mas como obediência expiatória imposta ao homem em consequência do pecado original [1]. Pela Regra de São Bento capítulo 48(8): “quando eles vivem pelo trabalho de suas mãos, tal como nossos Pais e os apóstolos, então eles vivem como verdadeiros monges”.[2] Segundo o capítulo 48(1) da Regra (Regula) de São Bento: “a ociosidade é inimiga da alma; por isso, em certas horas devem ocupar-se os irmãos com o trabalho manual, e em outras com a leitura espiritual”.[3] A regra de São Bento contudo somente se tornou norma exclusiva dos mosteiros a partir do século IX. O texto da regra de São Bento é uma cópia do original feita por Tedomar, abade de Monte Cassino na época de Carlos Magno [4]. Segundo Jacques le Goff era a evolução de um trabalho penitência da Bíblia para um trabalho reabilitado que se tornava meio de salvação.[5] Reconhecendo o valor do trabalho manual na educação o monaquismo introduziu novos processos para os artífices de madeira, couro, metais e tecidos.[6] Foram alcançados progressos em muitas artes industriais como as de entalhe de madeira e fabricação de cerveja. [7] O evangelho Stonyhurst (na figura) ou Evangelho de São João segundo São Cuthbert, é um pequeno evangeliário do século VII, escrito em latim, e com encadernação sofisticada em couro [8]. A regra de São Bento assimila as ferramentas do mosteiro, aos vasos e às mobílias sagradas cuja perda ou dano era considerado um sacrilégio.[9] Em Cluny Georges Duby observa que a interpretação da regra de São Bento transformara o trabalho manual imposto aos monges como simbólico de modo que na abadia não haviam oficinas, o abastecimento cabia aos decanatos dispersos no campo.[10] Os monges além de tecer encarregavam-se de ofícios como carpintaria e artes de pedreiro que transmitiam à população ao redor do convento.[11] Entre seus tesouros um candelabro de bronze cuja parte central tinha mais de cinco metros. Na porta principal da catedral de Autun sob os pés de Cristo, o artista assina sem modéstia: “Gislebertus hoc fecit”.[12] Em 712, um “Ursus magister”, com os seus discípulos Juventino e Juviano, assina um cibório (um badalquino apoiado em quatro colunas montados sob o altar para proteger uma estátua) da igreja de S. Jorge de Valpplicella da mesma forma que existe uma inscrição com o mesmo nome “Ursus magister fecit” na fachada de um altar da abadia de Ferentillo.[13]
[1]LE GOFF, Jacques. Para
uma outra idade média, Petrópolis: Vozes, 2013, p.150, 171, 211
[2]GIES, Frances & Joseph. Cathedral,
forge and water wheel, New York:Harper Collins, 1994, p.9; http://www.movimentopax.org.br/saoBento/Regra%20de%20Sao%20Bento.pdf
[3]BOORSTIN, Daniel. Os
descobridores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1989, p.446
[4]COSTA, Ricardo da;
VENTORIM, Eliane; FILHO, Orlando Paes. Monges medievais, São Paulo:Planeta,
2004, p.18
[5]GOFF, Jacques. Para um
novo conceito de idade média. Lisboa:Editorial Estampa, 1979, p.14
[6]MONROE, Paul. História
da educação. São Paulo:Cia Editora Nacional, 1974, p.105
[7]BURNS, Edward McNall.
História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo,
1959, p.265
[8]SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.II, Oxford,
1956, p.169
[9]LE GOFF, Jacques. A
civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 191
[10]DUBY, Georges. A vida
privada nas casas aristocráticas da França feudal. In: ARIÉS, Philippe; DUBY,
Georges. História da vida privada: da Europa Feudal à Renascença, v.2, São Paulo:Cia
das Letras, 1990, p.58
[11]FREMANTLE, Anne. Idade
da fé. Biblioteca de História Universal Life. Rio de Janeiro:José Olympio,
1970, p.34
[12]CLARK, Kenneth.
Civilização, São Paulo:Martins Fontes, 1980, p.66
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