sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Padre Antonio Vieira e os cometas

 

Muitos relatos dos jesuítas são permeados de superstições. Robert Southey descreve que “é difícil as vezes nas suas crônicas distinguir os efeitos da credulidade e imaginação dos da falsidade deliberada: é que jamais lhes parecia reprovado o engano que devia reproduzir um fim pio, ou causar uma boa impressão segundo ideias deles”.[1] Frei Valentine Extancel célebre astrólogo da Companhia de Jesus atribui a ocorrência de pestes no Brasil como previstos por eclipses.[2] Em 1686 a imagem de São Francisco Xavier (1506-1552) foi conduzida em procissão para por termo à febre amarela que atingia a cidade.[3] O aparecimento de cometas, como o que cruzou o Brasil em 1666, era considerado um mau presságio para as colheitas. O cometo foi descoberto em 15 de agosto no Pará por padres jesuítas. Este cometa está descrito nos versos do poeta Gregório de Matos que o teria observado na Bahia [4]: “Se é estéril, e fomes dá o cometa, Não fica no Brasil viva criatura, Mas ensina do juízo a Escritura, Cometa não o dar, senão trombeta. / Não creio que tais fomes nos prometa. Uma estrela barbada em tanta altura, Prometerá talvez, e porventura Matar quatro saiões de imperialeta. / Se viera o cometa por coroas, Como presume muita gente tonta, Não lhe ficar clérigo, nem frade, Mas ele vem buscar certas pessoas: Os que roubam o mundo com a vergonha, E os que à justiça falta, e à verdade”. Rocha Pita atribuiu a peste da varíola a passagem de um “horroroso cometa”. Em 1685 registra um “tremendo eclipse da lua, que naquela província da Bahia se viu com horror”.[5] O jesuíta Valentim Estancel atribui ao eclipse de 1685 do Sol e outro da lua que “grandes males ameaçavam o Brasil”. [6] Em Pernambuco o médico João Ferreira da Rosa no Tratado Único da Constituição Pestilencial de Pernambuco descreve em 1685 uma infecção contagiosa, que teria sido desencadeada a partir de um eclipses e da disposição dos planetas, o que teria sido a primeira descrição de febre amarela no Brasil [7].O padre Antonio Vieira dedicou um de seus sermões em 1695 ao cometa Jacob e se intitula: “Voz de Deus ao mundo, a Portugal e a Bahia. Juízo do cometa e visto em 27 de outubro de 1695 e continua ate hoje [...] Dei ao cometa o segundo nome de Voz de Deus. Se acaso o não entendes assim e és do número daqueles que chamam aos cometas  causas naturais  e não reconhecem neles outro mistério  ou documento mais alto, eu te afirmo que essa mesma incredulidade e dureza é já um defeito fatal do mesmo cometa e princípio dos castigos que por ele e como ele pode ser nos venham anunciados. Digo, pois, que a razão mais verossímel de faltarem as notícias dos cometas no decurso de tantos séculos não foi por negligência ou desatenção dos históricos, senão porque verdadeiramente em todas aquelas idades não houve cometas”. O padre Antonio Vieira viria a morrer dois anos depois em 1697.[8]

[1]SOUTHEY, Robert. História do Brasil, Brasília: Melhoramentos, 1977, v.2, p. 165

[2]SOUTHEY, Robert. História do Brasil, Brasília: Melhoramentos, 1977, v.2, p. 335

[3]SOUTHEY, Robert. História do Brasil, Brasília: Melhoramentos, 1977, v.2, p. 336

[4]MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. Dicionário Enciclopédico de astronomia e astronáutica, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p. 187

[5]PRIORE, Mary del. Histórias da gente brasileira, Vol. 1 Colônia. Rio de Janeiro:Leya, 2016, p. 158

[6]MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 241

[7]CAMENIETZKI, Carlos Ziller.Quando o ceu era perfeito. Revista de História da Biblioteca Nacional, n.75, dezembro 2011, p. 21; CUKIERMAN, Henrique. Yes, nós temos Pasteur. Rio de Janeiro: Faperj,2007, p. 172

[8]MOURÃO, Ronaldo Freitas. Dicionário Enciclopédico de astronomia e astronáutica, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1987, p. 842; MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira, v.I (1550-1794), São Paulo:USP, 1976, p. 191



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