sábado, 20 de fevereiro de 2021

O destino da ciência no Brasil colônia do final do século XVIII

 

Em suas viagens ao Brasil Sant Hilaire remeteria para Europa em 1822 coleção de 16 mil insetos, 2 mil aves, 129 mamíferos e herbário de mais de 30 mil números além de inúmeras amostras de minerais [1]. No século XIX Étienne Saint Hilaire foi enviado pelo Musée d’Histoire Naturelle de Paris para examinar as coleções mantidas no Museu de História Natural em Lisboa onde encontrou várias espécies encaixotadas da coleção de Alexandre Rodrigues Ferreira o “Humbolt brasileiro”. Alexandre Ferreira, nascido em Salvador e doutorando na Universidade de Coimbra foi enviado em 1783 pelo catedrático de História Natural, Domingos Vandelli, para estudo das riquezas naturais do norte do Brasil. Alexandre Ferreira chegou ao Brasil em Belém realizando extensa pesquisa pelos rios amazônicos por quatro anos escrevendo extensas memórias de caráter científicos para prestar contas às autoridades de Lisboa. Durante este período enviou para Lisboa vários espécimes etnográficos, zoológicos, botânicos e mineralógicos. No entanto o próprio Alexandre Ferreira ao retornar para Portugal como encarregado de administrar o Real Gabinete de História Natural pode observar o descaso com que seu material havia sido recebido: “os exemplares que coligira à custa de tantas fadigas e remetera com o maior desvelo para o gabinete da Ajuda, deteriorados na maior parte, e confundidos todos, perdidos ou trocados os números e etiquetas que trazia”.  Aproveitando-se da invasão do general Junot em Portugal, do que restava Saint Hilaire auxiliado pelo seu preparador Pierre Delalande [2] levou os melhores espécimes para Paris entre jacarés, papagaios e herbário amazônico.[3] Todo o material coletado por Alexandre Rodrigues Ferreira acabou sendo aproveitado pelo sábio francês como se suas fossem tais pesquisas. Saint Hilairie contudo nega que tenha se apropriado do trabalho de outros com relação aos herbários que encontrou no Museu d'Ajuda: "Todos são virgens; não se deram ao trabalho de abri-los: não resultaram em nenhuma planta, em nenhuma ideia botânica." Segundo Lorelai Kury “Classificados e estudados na França, esses herbários, inúteis em Portugal, poderiam ser úteis aos próprios naturalistas portugueses, que passariam a ter uma propriedade científica, quando anteriormente possuíam apenas ervas".[4] Segundo ele próprio informaria mais tarde, ao deixar Lisboa, em 15 de agosto de 1808, foram levados 68 mamíferos, 443 aves, 62 répteis, 162 peixes, 490 moluscos, 12 crustáceos e 722 insetos os quais apresentaria à comunidade científica como fruto de suas descobertas. Seus manuscritos e desenhos, com raras exceções, permaneceram inéditos até a década de 1970, embora o Brasil tenha tomado posse deles desde 1842.[5] Comandada pelo naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira, a "Viagem Filosófica de 1785 foi a mais importante expedição científica portuguesa do século XVIII. Ela percorreu o interior da América portuguesa durante nove anos e produziu um rico acervo, composto de diários, mapas populacionais e agrícolas, cerca de 900 pranchas e memórias (zoológicas, botânicas e antropológicas). Os diários, a correspondência e umas poucas memórias somente foram publicados a partir da segunda metade do século XIX, sobretudo na Revista do Instituto Histórico e Geográfio. Na década de 1870, os três primeiros volumes dos Anais da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro divulgaram uma enorme lista de manuscritos oriundos da viagem. No entanto, somente na década de 1970, o Conselho Federal de Cultura editou uma parte representativa das pranchas e memórias. Deve-se destacar, porém, que ainda há documentação da maior importância que continua inédita em arquivos portugueses e brasileiros. Na Fundação Biblioteca Nacional e no Arquivo Histórico do Museu Bocage estão depositados os principais registros textuais e visuais da expedição.[6]



[1]HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico: reações e transações, t.II, v.3, São Paulo:Difusão Europeia, 1967, p.451

[2]HOLANDA, Sérgio Buarque. O Brasil monárquico: reações e transações, t.II, v.3, São Paulo:Difusão Europeia, 1967, p.444

[3]WILCKEN, Patrick. Império à deriva: a Corte portuguesa no Rio de Janeiro 1808-1821, Rio de Janeiro:Objetiva, 2010, p.306

[4]KURY, Lorelai. Homens de ciência no Brasil: impérios coloniais e circulação de informações (1780-1810). História, Ciências, Saúde - Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 11, supl. 1, p. 109-129, 2004 https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702004000400006&lng=en&nrm=iso&tlng=pt

[5]HOLANDA, Sérgio Buarque. História Geral da Civilização Brasileira: A época colonial, administração, economia, sociedade, tomo I, volume 2, São Paulo:Difusão Editorial, 1982, p.172

[6]http://bndigital.bn.br/dossies/alexandre-rodrigues-ferreira/?sub=historico%2F



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