terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Bernardo de Clairvaux e o trabalho entre os cistercienses

 

Jacques le Goff destaca a adoção de inovações técnicas pelos monges dos mosteiros diante da valorização do trabalho manual [1]. A invenção do moinho de água é atribuída a Orêncio de Auxh que o construiu no lago de Isaby no século IV, enquanto que Cesário de Arles instala um moinho em Saint Gabriel no século VI [2]. O monastério cisticercense em Velehrad na República Tcheca registra o uso de rodas dágua para fabricação de ferro em 1269. A invenção dos moinhos movidos a água liberou as mulheres escravas da tarefa de passar uma grande parte do dia e da noite movendo as mós com seus próprios braços.[3] Jacques le Goff relata o testemunho de um monge de Clairvaux no século XIII que exalta o papel dos moinhos em poupar trabalho como uma benção de Deus: “Bom Deus Quantos consolos conferis a vossos pobres serviçais para impedir que uma tristeza grande demais os abata. Como aliviais as penas de vossos filhos que se penitenciam e como lhes evitais a sobrecarga de trabalho !”.[4] São Bernardo de Claraval / Clairvaux em 1150 destaca o papel dos moinhos: “quando a energia do rio faz girarem velozmente todos as rodas do moinho, ele gera espuma e parece que moeu a si mesmo e ficou mais cansado. Depois ele entra no curtume, onde dedica seus cuidados e seu trabalho à preparação do material necessário para o calçado dos monges, divide-se então em vários pequenos rios, e em sua corrida apressada passa por inúmeros compartimentos chegando até onde os seus serviços são necessários  para os mais diversos escopos: cozinhar, girar as engrenagens, fracionar, banhar, lavar, moer, suavizar, sempre oferecendo de nom grado os seus serviços; por fim, para merecer completamente os agradecimentos e para não deixar nada incompleto, transporta consigo os detritos, deixando tudo limpo”.[5] Durante a vida de Bernardo de Clairvaux (1090-1153) os cistercienses fundaram dezenas de novas abadias e experimentaram uma expansão significativa.[6] O monge ideal era aquele que dominava todas as habilidades e trabalhos dos camponeses, carpintaria, alvenaria, jardinagem e tecelagem, conciliando de forma equilibrada o trabalho e a contemplação, em um retorno à regra dos beneditinos [7].



[1]LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p.74

[2]LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 184

[3]BONNAISSE, Pierre. Liberdade e servidão. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do Ocidente medieval. v.II, São Paulo:Unesp, 2017, p. 76

[4]LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 209

[5]FRUGONI, Chiara. Invenções da Idade Média, Rio de Janeiro:Zahar, 2007, p. 116; MUMFORD, Lewis. A cidade na história, São Paulo:Martins Fontes, 1982, p. 283

[6]MURPHY, Tim Wallace. O código secreto das catedrais. São Paulo:Pensamento, 2007, p. 152

[7]GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and water wheel, New York:Harper Collins, 1994, p.9



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