sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Rei Menes

 

Lewis Mumford observa que uma das grandes realizações do primeiro faraó Menes ao unificar os reinos do Norte e do Sul foi o desvio do curso do Nilo para regularização da irrigação: “aceitando esse duro desafio, as aldeias, numa antiga fase aprenderam as vantagens da ajuda mútua, do planejamento a longo prazo, da aplicação paciente a uma tarefa comum, tudo isso repetido estação após estação. A autoridade, sobrevivente por longo tempo, do Conselho de Anciãos denota uma antiga mobilização comunal da força de trabalho sob uma liderança competente, embora local”.[1] Etimologicamente o termo faraó representa uma grande casa, ou seja, um palácio [2]. Segundo Ciro Flamarion a irrigação não é causa do surgimento do Estado centralizado mas pelo contrário, a irrigação centralizada somente se tornou possível após a existência de um Estado centralizado.[3] Kurt Butzer mostra que embora a agricultura fosse praticada por quase dois milênios antes da unificação política dos Reinos do Alto e Baixo Egito por volta de 3000 a.c. a evidência mais antiga de irrigação artificial é uma cabeça de clava de calcário de cerca de 25 cm de altura, símbolo do poder real, que mostra o rei Escorpião (rei Narmer ou Menes, possivelmente [4]) um dos últimos reis pré dinásticos cortando um dique de irrigação para dar início a inundação dos campos datada de 3200 a.c.. Para Karl Butzer é difícil aceitar a tese de Baumgartel de que a cena mostra a construção de um templo.[5] Uma das distinções mais honoríficas no Antigo Egito era a de “Escavador de canal”.[6] Heródoto relata que o Alto Egito era um pântano até que o primeiro faraó Menes / Narmer [7] construiu diques ao sul de Mênfis o que permitiu que o delta do rio fosse drenado e transformado em uma imensa reserva de terra aumentando a área cultivada. [8] Uma inscrição de 1870 a.c. registra a construção de um canal de 150 côvados de comprimento, 20 côvados de largura e 15 de profundidade tornando possível a navegação à primeira catarata [9]. O grego Menes deriva do egípcio mena que significa “o fundador”, o que segundo alguns autores pode indicar que a Menes não é um personagem histórico. [10]

[1] MUMFORD, Lewis. A cidade na história, São Paulo:Martins Fontes, 1982, p. 70, 72

[2]CHILDE, Gordon. Early forms of society. In: SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, Oxford Clarendon Press, 1958, p. 53

[3]CARDOSO, Ciro Flamarion. O Egito antigo. Coleção Tudo é história, n° 36, São Paulo:Brasiliense, 1986, p.24, 47, 102

[4]MALKOWSKI, Edward. O Egito antes dos faraós. São Paulo:Cultrix, 2010, p. 168, 208; CHILDE, Gordon. Early forms of society. In: SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, Oxford Clarendon Press, 1958, p. 51; SHAFER, Byron. As religiões no Antigo Egito, São Paulo: Nova Alexandria, 2002, p. 110

[5]BUTZER, Karl. Early hidraulic civilization in Egypt, Chicago:University Chicago Press, 1976, p.47 https://oi.uchicago.edu/sites/oi.uchicago.edu/files/uploads/shared/docs/early_hydraulic.pdf

[6]JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 21

[7DUNAN, Marcel; BOWLE, John. Larousse encyclopedia of ancient & medieval history, Paris:Larousse, 1963, p.41

[8]JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 35;DROWER, M. water supply, irrigation and agriculture, In: In: SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, Oxford Clarendon Press, v.I, 1958, p. 529

[9]JOHNSON, Paul. História Ilustrada do Egito. Rio de Janeiro:Ediouro, 2002, p. 178

[10]WEST, John Anthony. The traveler’s key to ancient Egypt, New York:Quest, 2012, p. 6, 225



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Doação de Constantino

  Marc Bloch observa a ocorrência de falsificações piedosas tais como a pseudo doação de Constantino ( Constitutum Donatio Constantini ) ao ...