sábado, 23 de janeiro de 2021

O segredo nas técnicas de construção naval portuguesas

 

Os primeiros tratados técnicos de navegação começam a surgir apenas em 1570 uma vez que a técnica de construção das caravelas era mantida em sigilo pelos navegadores portugueses e transmitida oralmente.[1] Jaime Cortesão mostra que a tecnologia dos artesãos portugueses era mantida em sigilo. O carvalho para as quilhas vinham do Alentejo próximo ao Algarve que tornou-se importante construtor naval, o pinho para os casos vinham das costas de Portugal onde as árvores eram abatidas exclusivamente para construção naval. Velas e cardames eram produzidas em Lagos.[2] As Ordenações Manuelinas opuseram-se que pilotos, mestres e marinheiros portugueses servissem a nações estrangeiras. D. Manuel condenou Diogo Pires de Sines à perda de seus bens por haver vendido uma caravela a estrangeiros. Em 1454 um comerciante foi executado por ter vendido sua caravela a um comprador inglês [3]. Durante a construção da base naval de São Jorge da Mina em Gana o rei mandou destruir duas urcas de 400 toneladas para sustentar o mito de que somente as caravelas dispunham dos meios para fazer a viagem de ida e volta à costa da Guiné. [4] Apesar de navegadores genoveses Antoniotto Usodimare e Antonio de Noli e o veneziano Luis / Alvise de Cadasmoto terem navegado em naus portuguesas Jaime Cortesão alega que eles não tiveram acesso aos segredos de construção das caravelas. [5] Um reflexo desta política de segredo nas navegações foi a carta da Pero Vaz de Caminha mantida em segredo na Torre do Tombo por três séculos.[6] O mapa/planisfério de Cantino de 1502 que mostra o Brasil e a linha de Tordesilhas foi mantido em sigilo e descoberto casualmente pelo diretor da Biblioteca Estense no forro de uma salsicharia em 1859.[7] A carta náutica mostra copiado possivelmente por um espião italiano de um original português  mostra uma descrição bastante precisa da costa africana em especial da costa ocidental a norte do rio Congo.[8] As informações de navegação eram mantidas em segredo pelos portugueses. Um agente italiano, depois do regresso de Pedro Álvares Cabral da Índia em 1500 queixava-se “È impossível obter uma carta de viagem, porque o rei decretou a pena de morte para quem mandasse alguma para o estrangeiro”.[9] A cartografia era a arma secreta dos príncipes. No século XVI João Frederico recusou-se a publicar o mapa da Saxônia mesmo estando no centro da Europa e não alguma região distante da Europa.[10]

[1]Caravelas e Naus – Um Choque Tecnológico nos séculos XV e XVI, Panavideo produções, 2013 https://www.youtube.com/watch?v=7xUEZt0_osc&fbclid=IwAR0rNrUVqKNBWO-LhM9yrGnOJygRRTSScS966pXJShrpvorh7CUA7p-V5P8

[2]MIGLIACCI, Paulo. Os descobrimentos: origens da supremacia europeia, São Paulo:Scipione, 1994, p. 41; BOORSTIN, Daniel. Os descobridores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1989, p.158

[3]COSTA, Sergio Correa da. Brasil, segredo de Estado, São Paulo:Record, 2001, p. 104

[4]COSTA, Sergio Correa da. Brasil, segredo de Estado, São Paulo:Record, 2001, p. 103

[5]CORTESÂO, Jaime. Os descobrimentos portugueses, Lisboa: Livros Horizonte, v.II, p. 389, 400

[6]GOMES, Laurentino. Escravidão, v.I, São Paulo: Globo, 2019. p.111

[7]BARDI, Pietro, O ouro no Brasil, São Paulo:Banco Sudameris, 1988, p. 11

[8]BOXER, Charles. O império colonial português, Lisboa: Edições 70, 1969, p. 50

[9]BOORSTIN, Daniel. Os descobridores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1989, p.250

[10]MOUSNIER, Roland. Os séculos XVI e XVII. Tomo IV, 2° volume, História Geral das Civilizações, São Paulo:Difusão, 1957, p. 20



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