quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Copernico desbancou o antropentrismo ?

 

O livro de Copérnico Revolutionibus sobre o heliocentrismo publicado em 1543 alguns dias após sua morte [1] só recebeu reimpressão em 1566 [2] embora tenha sido lido nas melhores universidades católicas.[3] Paolo Rossi mostra que as teses heliocêntricas de Copermico foram primeiro recebidas por místicos como o cabalista John Dee ou Giordano Bruno. Na Universidade Salamanca em 1561 ficava a cargo dos estudantes escolher o curso de astronomia segundo Ptolomeu ou Copérnico sendo muito poucos os que escolhiam este último.[4] Tycho Brahe rejeitou a astronomia de Copérnico como inaceitável e sua autoridade constitui um grande obstáculo para difusão do copernicanismo.[5] Embora alguns autores associem e tese geocêntrica como um reflexo do pensamento antropocêntrico, Dennis Danielson observa que estar no centro do universo não era visto como uma glória, mas ao contrário. Maimônides (1135-1204 afirmou que “no caso do Universo, quanto mais próximas estão as partes do centro, maior é sua turbidez, solidez, inércia, obscuridade e e escuridão porque mais longe estão do elemento mais elevado, da fonte de luz e brilho”. No comentário ao De Caelo de Aristóteles, Tomás de Aquino conclui no mesmo sentido: “no universo, a Terra – em torno do qual todas as esferas circulam e que, como localização, está no centro – é o mais material e grosseiro de todos os corpos”.[6] Denis Danielson mostra que ao colocar o Sol no centro do universo Copernico estava exaltando o homem e rebaixando o Sol segundo esta visão tradicional do centro status do centro de universo como algo negativo.  No entanto Denis Danielson mostra que para escapar essa acusação Copernico precisou redefinir a posição do centro do universo como lugar de glória de modo a não rebaixar o Sol quando em seu livro De revolutionibus orbium coelestium apresenta a tese heliocêntrica exalta a posição do Sol: “Imóvel, no entanto, no meio de tudo está o Sol. Pois nesse mais lindo templo, quem poria esse candeeiro em outro ou melhor lugar do que esse, do qual ele pode iluminar tudo ao mesmo tempo ? Pois o Sol não é inapropriadamente chamado, por alguns povos, de lanterna do universo; de sua mente, por outros; e de seu governante, por outros ainda [Hermes] o Três Vezes Grande, chama-o de um deus visível, e Electra, de Sófocles, de onividente”.[7] Para Frances Yates “o intenso realce dado ao Sol, nessa nova visão de mundo, era a força propulsora que induziu Copérnico a empreender cálculos matemáticos, sob a hipótese de que o Sol estava realmente no centro do sistema planetário; ele desejava tornar aceitável a sua descoberta apresentando-a dentro do quadro de referências dessa nova atitude”. Para Denis Danielson a ideia de que modelo heliocêntrico de Copernico destronou o homem de sua posição privilegiada no centro do universo foi um mito propagado no século XIX pelo iluminismo como se observa, por exemplo, em Goethe que que em 1810 escreve: “nenhuma descoberta ou opinião jamais produziu maior efeito no espírito humano que o ensino de Copérnico, pois este obrigou a Terra a abrir mão do privilégio colossal de ser o centro do universo”.



[1]THOMAS, Henry. Living biographies of great scientists, New York:Blue Ribbon Books, 1946, p. 32

[2]DELUMEAU, Jean. A civilização do Renascimento, Lisboa:Estampa, 1984, v.II, p.129

[3]BOORSTIN, Daniel. Os descobridores, Rio de Janeiro:Civilização Brasileira, 1989, p.281

[4]ROSSI, Paolo. O Nascimento da ciência moderna na Europa, Bauru:Edusc, 2001, p. 127

[5]ROSSI, Paolo. O Nascimento da ciência moderna na Europa, Bauru:Edusc, 2001, p. 131

[6]DANIELSON, Dennis. Mito 6: que as ideias de Copérnico removeram os seres humanos do centro do Cosmos. In: NUMBERS, Ronald. Terra plana, Galileu na prisão e outros mitos sobre a ciência e religião, Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2020, p. 83

[7]RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência: Da Renascença à Revolução Científica. v.3, São Paulo:Jorge Zahar, 2001, p.68; STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.64, 98; McCLELLAN III, James; DORN, Harold. Science and technology on world history: an introduction. The Johns Hopkins University Press, 1999, p.210; BRONOWSKI, J. A escalada do homen, São Paulo:Martins Fontes, 1979, p.197; BRAGA, Marco; GUERRA, Andreia; REIS, Jose Claudio. Breve historia da ciência moderna, v.II, Rio de Janeiro:Zahar, 2011, p. 73; TATON, René. A ciência moderna: o Renascimento, tomo II, v.I, São Paulo:Difusão, 1960, p. 70; CORNELL, Tim; MATHEWS, John. Renascimento v.II ,Grandes Impérios e Civilizações, Lisboa:Ed. Del Prado, 1997, p. 132; BURTT, Edwin Arthur. As bases metafísicas da ciência moderna. Brasília: UNB, 1984, p. 44



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