quarta-feira, 28 de outubro de 2020

O tempo medieval

 

Marc Bloch em sua obra A sociedade feudal descreve a chamada “cultura do feudalismo” marcada entre outras características pela indiferença pelo tempo e sua falta de interesse em mensurá-lo acuradamente. [1] O registro de nascimento era transmitido por uma tradição oral por parte dos pais. Um negociante declara em 1299 ter nascido em 1254 “segundo a lembrança de minha mãe”.[2] Os cronistas da época se limitam em geral a se referir a “naquele tempo”, “pouco depois” sem precisar datas [3]. Lucien Febvre destaca que o “tempo do relógio” era muito menos significativo que o “tempo vivenciado” dentro visão de mundo medieval. [4] Jacques le Goff por sua vez aponta o “tempo dos tecelões” no século XIV como reorientando a percepção de tempo medieval diante da nova conjuntura do trabalho marcada pela ascenção social de mestres artesãos.[5] Jacques Rossiaud destaca que com a ascenção dos mercadores e das cidades no século XIV desenvolve-se uma preocupação de se contabilizar tudo. O florentino Lapo di Giovanni Niccoline contabiliza em 67 anos, 2 meses e 26 dias o tempo em que sua permeneceu na casa brasonada: “numa cidade mercantil, tudo é ratio; o citadino deve agir de uma forma razoável, após contabilização e dedução lógica”.[6]



[1]BURKE, Peter. A escola dos Annales 1929-1989: a revolução francesa da historiografia, São Paulo:Unesp, 1997, p.36

[2]RONCIERE, Charles. A vida privada dos notáveis toscanos no limiar da Renascença. In: ARIÉS, Philippe; DUBY, Georges. História da vida privada: da Europa Feudal à Renascença, v.2, São Paulo:Cia das Letras, 1990, p.267

[3]LE GOFF, Jacques. A civilização do Ocidente Medieval. Rio de Janeiro:Vozes, 2016, p. 159

[4]BURKE, Peter. A escola dos Annales 1929-1989: a revolução francesa da historiografia, São Paulo:Unesp, 1997, p.41

[5]GOFF, Jacques le. Para uma outra idade média. Rio de Janeiro:Vozes, 2013, p.89

[6]ROSSIAUD, Jacques. O citadino e a vida na cidade. In: LE GOFF, Jacques. O homem medieval, Lisboa: Editorial Presença, 1989, p.119



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