Pela teoria
de poliedros formulada por Platão e exposta no Teeteto os elementos últimos da
matéria são corpos simples na forma de poliedros regulares. Desses sólidos
Platão considera apenas suas superfícies como triângulos elementares. O
tetraedro é a forma elementar do fogo, o octaedro do ar, o icosaedro da água, o
cubo da terra[1].
Dois corpúsculos de fogo poderão dar origem a um corpúsculo de ar (Timeu 56d).
A água, por sua vez, dotada de um poliedro de 20 triângulos pode dar origem a
um corpúsculo de fogo (4 triângulos) e dois de ar (8 triângulos cada)[2].
Aristóteles rejeita a teria dos poliedros uma vez que entre os poliedros
regulares o encaixe entre os poliedros nem sempre é perfeito restando alguns
espaços vazios, o que não seria possível devido a impossibilidade de se
constituir vácuo.[3] Douglas Jerolmack mostra que ao partir de uma forma poliédrica tridimensional e
fatiarmos aleatoriamente em dois fragmentos e, em seguida, cortar esses
fragmentos repetidamente, obteremos um grande número de formas poliédricas
diferentes, por´me na média, a forma resultante dos fragmentos será um cubo. As
rochas ao partirem-se tendem naturalmente à forma cúbica: "O
interessante aqui é que o que encontramos nas rochas, ou terra, é que existe
mais do que uma linhagem conceitual de volta a Platão. Acontece que a concepção
de Platão sobre o elemento terra sendo composta de cubos é, literalmente, o modelo
estatístico médio para a terra real. E isso é simplesmente alucinante"[4]
Para Platão
o fogo é representado por um tetraedro, o ar por um octaedro, a água por um
icosaedro e a terra por um cubo[5], o éter
como dodecaedro tal como exposto no Timeu: “Quando Deus começou a ordenar o
universo, o fogo, a terá, o ar e a água, antes de tudo dotou-os de formas e de
números”.[6] Eva Sachs demonstra que os pitagóricos só conheciam três destes poliedros
(cubo, pirâmide e dodecaedro) de modo que não procede o argumento de que a
relação com os cinco poliedros remonta Pitágoras, que é uma construção
posterior a Filolau e deve-se a
Teetetos.[7] Para
Platão a essência de uma coisa não são alcançadas pelas suas qualidades
sensíveis, mas pela forma geométrica que ela esconde de nossos sentidos, forma
que esta que é eterna, invariável e independente de qualquer transformação ou
deformação que os corpos materiais possam sofrer. A natureza pode ser lida e
compreendida a partir de uma linguagem puramente matemática.[8] Na
Dialética Platão explica a matemática, contudo, apreende apenas uma parte da
essência das coisas, pois caberá a dialética será capaz de compreender a
inteira essência de cada coisa levando em conta uma perspectiva teleológica[9]. A
pirâmide ou tetraedro, por apresentar várias pontas agudas e possuir menor
superfície, tem natureza mais móbil e cortante e é atribuída ao fogo. O cubo,
por ter a base mais ampla e ser o mais estável e mais plástico dos sólidos, é
atribuído à terra, “visto ser a mais imóvel das quatro espécies de corpo”. A água
e o ar encontram-se, em termos de mobilidade e de peso, entre a terra e o fogo
(a forma mais móvel e aguda e por isso atribuído à pirâmide), sendo a água
menos móvel e mais pesada do que o ar. Assim, o octaedro é atribuído ao ar, por
ser uma figura mais leve e penetrante que o icosaedro, o qual foi atribuído à
água.[10] Platão
no Timeu, considerada por Charles Singer como a obra mais influente da
antiguidade[11] e por Marco Zingano como o tratado de física e química da Antiguidade[12], irá
desenvolver esse conceito prevendo a possibilidade de transubstanciação podendo
o ar transformar-se em dois corpúsculos de fogo. Por um período na alta Idade
Média a obra mais conhecida de Platão em sua tradução latina era o Timeu, o que
segundo Bernard Williams pode explicar o aspecto místico com que Platão foi
assimilado[13].
Paul Kraus demonstrou que o Timeu inspirou boa parte da alquimia árabe[14]. Bertrand Russell destaca que os triângulos básicos de Platão são as
contrapartes das partículas nucleares da físca moderna.[15]
[1]TATON, René. A ciência
antiga e medieval, tomo I, livro 2, Sâo Paulo:Difusão Europeia, 1959, p. 54
[2]LAFONT, Olivier. A
química. In: COTARDIÈRE, Philippe. História das ciências: da antiguidade aos
nossos dias, Rio de Janeiro:Saraiva, 2011, p.130
[3]TATON, René. A ciência
antiga e medieval, tomo I, livro 2, Sâo Paulo:Difusão Europeia, 1959, p. 65; MONDOLFO,
Rodolfo. O pensamento antigo: desde Aristóteles até os neoplatônicos, São
Paulo: Mestre Jou, 1973, p. 41
[4]Plato’s cube and the natural
geometry of fragmentation, Gábor Domokos, Douglas J. Jerolmack, Ferenc Kun,
János Török, Proceedings of the National Academy of Sciences. https://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=platao-estava-certo-terra-feita-cubos
[5]THORNDIKE, Lynn. The place of magic in the intellectual history of
Europe. Columbia
University Press, 1905, p.60; ZINGANO, Marco. Platão & Aristóteles: o
fascínio da filosofia, São Paulo:Odysseus Editora, 2002, p.39
[6]MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo v.I. São Paulo:Mestre Jou, 1964, p.238
[7]MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: v.I , São Paulo: Mestre Jou, 1964, p.
67
[8]ZINGANO, Marco. Platão
& Aristóteles: o fascínio da filosofia, São Paulo:Odysseus Editora, 2002,
p.40
[9]ZINGANO, Marco. Platão
& Aristóteles: o fascínio da filosofia, São Paulo:Odysseus Editora, 2002,
p.42
[10]MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo v.I. São Paulo:Mestre Jou, 1964, p.248
[11]SINGER, Charles. From magic to science. New York:Dover, 1958, p.67
[12]ZINGANO, Marco. Platão
& Aristóteles: o fascínio da filosofia, São Paulo:Odysseus Editora, 2002,
p.15
[13]WILLIAMS, Bernard. Filosofia, In: MOSES, Finlay. O legado da Grécia,
Brasília: UNB, 1998, p.238; LLOYD, G. Ciência e matemática In: FINLEY, Moses. O
legado da Grécia. Brasília: UNB, 1998, p. 318
[14]KOYRE, Alexandre.
Estudos de história do pensamento científico. Brasília:Forense,1982, p.29
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