sábado, 22 de agosto de 2020

A química de Georg Stahl

 

O alquimista Johann Joachim Becher no livro Physica Subterranea de 1667 apresentou uma teoria sobre os elementos, como desenvolvimento da teoria de Empédocles, considerando três tipos de Terras diferentes: terra mercurialis, terra lapida e terra pinguis, este último presente nos materiais combustíveis era libertado quando esses materiais ardiam[1]. Assim um pedaço de madeira é composto de cinza e terra pinguis; quando é queimado a terá pinguis é liberada restando apenas a cinza. Georg Stahl denominou esta terra pinguis de flogisto[2], considerado como um fluido expelido durante a combustão e a calcinação (atualmente conhecida como oxidação) de metais[3]. Stahl considerou que quando um material entrava em combustão, sofria corrosão ou era calcinado perdia o seu flogisto (phlogiston): quanto mais combustível for um material, mais flogisto liberta na combustão[4]. Materiais combustíveis como papel e madeira se harmonizavam com o previsto pela teoria do flogisto pois quando queimavam grande parte de sua substância desaparecia restando apenas cinzas, com respectiva redução de peso. No entanto ao se queimar metais eles acumulavam ferrugem de modo que o peso final era maior que o do metal original. A explicação para os defensores da teoria do flogisto era simples, para tais materiais o flogisto tinha peso negativo, ou seja, quando ligado ao material ele fazia o conjunto pesar menos.[5] Outros como Chardenon distinguiam entre gravidade específica e absoluta e supunha que o flogístico diminuía a segunda em todos os corpos em que se unisse.[6] René Taton observa que por não ter uma teoria rival à altura, a teoria do flogístico, embora não conseguisse explicar o paradoxo do porque a transformação do metal em cal era acompanhada de um aumento de peso ainda que envolvesse a perda de flogístico, contando com a adesão de cientistas como Priestley, Scheele, Cavendish, Macquer, Kirwan e Richter: “parece mais justo considerar que a teoria de Stahl foi, na realidade, uma grande teoria”.[7] Immanuel Kant na Crítica da razão pura menciona a teoria de Stahl ao lado de Galileu e Torricelli como um marco da ciência.[8] Paolo Rossi mostra que Stahl marca um período em que a química estava consciente de seu desenvolvimento independente do pensamento místico alquímico. Em 1723 Stahl escreve: “A química ao longo de mais de duzentos anos foi domínio exclusivo dos charlatães que produziam uma infinidade de vítimas. Hoje algumas pessoas começaram a se ocupar seriamente nessa ciência. Não deve surpreender o seu número pequeno. Era óbvio que os impostores, as falsas promessas dos fabricantes de ouro, os supostos arcanos, os remédios universais, ou os preparados farmacêuticos muitas vezes nocivos dos alquimistas tornassem a química odiosa às pessoas honestas e sensíveis, despertando nelas uma sensação de desgosto por um saber caracterizado pela fraude e pela impostura”.[9]



[1]STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.178

[2]GOLDFARB, Da alquimia à química, Sâo Paulo:Edusp, 1987, p.223

[3]ABRIL Cultural, Medicina e Saúde. História da Medicina, v.II, São Paulo, 1970, p. 343

[4]BELL, Madison Smartt. Lavoisier no ano um. São Paulo: Cia das Letras, 2007, p. 51

[5]STRATHERN, Paul. O sonho de Mendeleiev: a verdadeira história da química, Rio de Janeiro:Zahar, 2002, p.181

[6]DAUMAS, M. Nascimento da química moderna, In: TATON, René. A ciência moderna: o século XVIII, tomo II, livro 3, Sâo Paulo:Difusão Europeia, 1960, p. 134

[7]TATON, René. A ciência moderna: o século XVII, tomo II, v.2, São Paulo:Difusão, 1960, p.167

[8]BELL, Madison Smartt. Lavoisier no ano um. São Paulo: Cia das Letras, 2007, p. 52

[9]ROSSI, Paolo. O Nascimento da ciência moderna na Europa, Bauru:Edusc, 2001, p. 283


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