quinta-feira, 30 de julho de 2020

Heráclito

A doutrina de Platão exposta em Crátilo é profundamente influenciada por Heráclito de Éfeso que viveu por volta de 500 a.c, segundo o qual (fragmento n° 91) não se pode entrar no mesmo rio duas vezes[1]. Crátilo aprofunda a afirmação de Heráclito ao dizer que nem mesmo uma só vez podemos entrar no rio, tão rápida e contínua é a mudança. Isso torna impossível que as palavras possam ser usadas para definir um conceito instável, dada a instabilidade inerente de todas as coisas. De fenômenos sempre mutáveis e das sensações que os aprendem não pode surgir um conhecimento estável e válido, a ciência é uma impossibilidade para Crátilo[2]. O mundo observável está, portanto, em constante mudança, há um conceito de impermanência nas coisas, uma identidade entre os contrários[3], Trata-se de um mundo que é visto como inconstante, mutável, imperfeito e, em última análise, incognoscível.[4] Para Heráclito, sob influência do dualismo do zoroastrismo[5], o mundo é um fluxo perpétuo de acontecimentos, de mudança das coisas nos seus contrários: “de todas as coisas o Um e do Um todas as coisas [...] o contrário é convergente e dos divergentes nasce a mais bela harmonia, e tudo segundo a discórdia[6]. Existe o dia porque existe a noite, assim como inverno e verão, o bem e o mal, assim como a tensão de uma corda cria as flutuações proporcionais à frequência para produção da harmonia da música, assim o alternar dos opostos cria a vida e lhe confere significado.[7] Para Heráclito o mundo é um perpétuo fluxo (panta rhei)[8]. Platão entende que Heráclito tinha razão no que se refere ao mundo material como algo imperfeito, que não consegue manter a identidade das coisas, mudando sem cessar, passando de um estado a ouro, contrário ou oposto.[9] O mundo se desenvolve pela constante interação dos opostos, dia/noite, saúde/doença, guerra/paz.[10] Rodolfo Mondolfo observa que a conclusão negativa de Crátilo quanto as possibilidades da ciência como critério de verdade é mais radical que a de Sócrates e Platão para os quais a sabedoria pode nos levar ao critério de verdade pela observação das essências universais.[11]


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