terça-feira, 14 de julho de 2020

Heliocentrismo na Grécia

Aristóteles em O contador de areia descreve o modelo proposto por Aristarco em que o Sol é mantido imóvel e a Terra gira ao redor do Sol numa trajetória circular anual, assim como descrevia o movimento de rotação diário da terra para justificar dias e noites. As estrelas fixas também giram em torno do sol, porém, numa esfera tão distante que a órbita da terra seria vista como um minúsculo ponto, o que sugere uma grandiosidade para o universo até então inconcebível. Por haver proposto o sistema heliocêntrico, Aristarco foi denunciado pelo estoico Cleantes de Assos e sua tese condenada, conforme nos mostra Plutarco em De facie in orbe luna, no entanto, suas teses foram acolhidas um século mais tarde por Seleuco o babilônio (sec II a.c.) quando desenvolveu sua teoria das marés baseada na rotação da terra.[1] Cleanto (331-233 a.C.) é mencionado por Paulo nos Atos dos Apóstolos em 17:28 quando o poeta no “Hino a Zeus” se refere a ‘Também somos descendência dele’. Vitrúvio também faz uma referência elogiosa a Aristarco e o tem em alto conceito.[2] Hiparco de Niceia (sec II a.c.) e Ptolomeu (sec II) posteriormente rechaçaram as teses heliocêntricas de Aristarco. [3] Moses Finlay cita o exemplo de Aristarco e o fato de que sua teoria da terra dar voltas em torno do sol não foi nenhum escândalo em sua época, para mostrar que a religião na Grécia antiga não era um empecilho à ciência: “a religião grega carecia de dogmas e de um teologia sistemática, seus ritos podiam estimular as emoções, no entanto suas explicações não passavam nunca das intelectualmente pouco satisfatórias que os mitos proporcionavam. Esta futilidade da religião, e a correspondente ausência de uma igreja institucionalizada, deu a especulação filosófica liberdade de movimento: em seu aspecto positivo porque havia um espaço a ser preenchido; no aspecto negativo porque nem a alma do homem nem seus desejos terrenos se sentiam ameaçados por ideias, qualquer fosse a violência das mesmas”.[4]
[1] POPPER, Karl. A racionalidade das revoluções científicas. In: Problemas da revolução científica, Belo Horizonte:Itatiaia, 1976, p. 96, 105; LLOYD, G. Ciência e matemática In: FINLEY, Moses. O legado da Grécia. Brasília: UNB, 1998, p. 309
[2] SARTON, George. Historia de la ciência, Buenos Aires:Editorial Universitaria Buenos Aires, 1959, p. 59
[3] SARTON, George. Six wings, men of science in the Renaissance, Bloomington: Indiana University Press, 1957, p. 54
[4]FINLEY, Moses. Los griegos de la antiguedad. Barcelona: Editorial Labor, 1966, p. 130

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