segunda-feira, 27 de julho de 2020

Carlos Magno e o feudalismo

A concessão de beneficiium ou seja o direito de usar a terra contra prestação de renda ou serviços praticada pelos reis merovíngios no século VII e a concessão de tais direitos pelos reis carolíngios em recompensa a seus condes e duques e nobres locais em recompensa ao fornecimento de tropas montadas que lutaram contra os mouros intensificou os laços feudais.[1] Diante da abundância de novas terras resultante da expansão territorial alcançada por Carlos Magno inúmeros beneficia foram concedidos. O termo “benefício” foi substituído entre fins do século IX e fins do século XI por “feudo” – “fief, feodum”.[2] Uma economia baseada na troca tinha como seguimento lógico uma sociedade baseada na troca de serviços entre suserano e vassalo[3]. Sônia Mendonça argumenta que a progressiva vassalização no tempo de Carlos Magno foi alcançada na medida em que os benefícios antes pensados como vitalícios tornaram-se hereditários (feudos) ao longo do século IX. A realeza passar a exigir dos condes a prestação de vassalagem fundindo-sea honra com o benefício, concentrando-se poderes em torno da aristocracia fundiária que assumiram um duplo papel de senhores feudais e agentes do poder público como representantes do rei ao qual deviam honra. Para Sonia Mendonça o feudalismo completa um processo histórico já iniciado ao final do império romano: “Com isso, a monarquia, ao esforçar-se para estimular a centralização política, acabou por ampliar as tendências dissociativas de há muito latentes na sociedade”. [4] Segundo Perry Anderson: “O sistema de feudo levou um século a ganhar forma e raízes no Ocidente, mas o seu primeiro núcleo incontestável formou-se com Carlos Magno [...] Assim foi também nesse período que tomou forma a unidade de produção caracteristicamente feudal, cultivada por camponeses dependentes. O império Carolíngio era na realidade uma área fortemente continental, comum comércio externo mínimo, a despeito de suas fronteiras marítimas com o Mediterrâneo e o Mar do Norte e com uma circulação monetária assaz lenta: a sua resposta econômica ao isolamento foi o desenvolvimento de um sistema senhorial (manorial system)”. [5] Com a desagregação que se seguiu à morte de Carlos Magno e as invasões de vikings, magiares e sarracenos que o termo “feudum” começou a entrar em uso sendo toda a França coberta por castelos e fortificações construídos pelos senhores rurais sem qualquer permissão imperial com conter os ataques bárbaros, o que lançou os camponeses no regime de servidão em troca de segurança: “a nova paisagem semeada de castelos era a um tempo uma proteção e uma prisão para a população rural”.

[1] BURNS, Edward McNall. História da civilização ocidental, Rio de Janeiro:Ed. Globo, 1959, p.319

[2] JUNIOR, Hilário Franco. A idade média nascimento do Ocidente. São Paulo:Brasiliense, 1986, p. 68; MICELI, Paulo. O feudalismo, São Paulo: Atual, 1986, p. 27, 36

[3] FREMANTLE, Anne. Idade da fé. Biblioteca de História Universal Life. Rio de Janeiro:José Olympio, 1970, p.17

[4] MENDONÇA, Sonia. O mundo carolíngio. Coleção Tudo é história, n° 99, São Paulo:Brasiliense, 1985, p.36

[5] ANDERSON, Perry. Passagens da antiguidade ao feudalismo, Porto: Afrontamento, 1982, p. 154, 156


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