sábado, 23 de julho de 2022

Alquimia e cabala

Gershom Scholem (figura) mostra que na Cabala, o ouro não é de forma alguma um símbolo do mais alto status. A literatura cabalística afirma que a prata é o símbolo do lado direito, doação masculina; em contraste, ouro, o símbolo do lado esquerdo, representa o feminino, a prata tem predomínio sobre o ouro. Esta divisão aparece pela primeira vez no mais antigo texto cabalístico existente, o Sefer ha-Bahir. A criação de ouro não é considerada essencial, não de acordo com o esquema de mundo cabalístico real, comumente compartilhado e certamente não de acordo com a visão de mundo interna, espiritual e teosófica. O simbolismo da cabala, portanto, neste aspecto dos metais, é oposto ao da alquimia. (p.20). Moses de Leon, por sua vez, faz referências diretas a alquimia especialmente em Zohar 2.23b-24b, mas tais referências não foram incorporadas à cabala. Maria a judia, mencionada por Zósimo, segundo Gershom Sholem é um personagem ficcional (p.37). Apesar disso Gershom Scholem reconhece influências da alquimia na cabala: "É inegável que o simbolismo da Shekhinah, o aspecto feminino do mundo divino das sefirot - que representa o último dos dez passos de emanação dentro da cabeça de Deus, como é ricamente desenvolvido no Zohar - exibe paralelos ao simbolismo alquímico da prima materia", no entanto, existem apenas algumas conexões entre as ideias cabalistas e alquímicas nas gerações seguintes à publicação do Zohar. 

No século XV judeus italianos demonstraram interesse em alquimia, como o  poeta Moses David ben Judah Rieti, porém, sem nenhuma conexão com a cabala. O judeu Knorr von Rosenroth faz uma associação de metais com planetas, mas usa um simbolismo que não se originou nos círculos cabalistas, mas sim em círculos astrológicos, onde a ordem dos planetas é determinada por sua proximidade inversa com a terra, o que atesta sua incompatibilidade com o antigo simbolismo da sefirot da Kabbala. Este simbolismo coincide com o usado pelo cabalista Cornelio Agripa no capítulo 22 de seu livro 2 de De Occulta Philosophia, porém, Agrippa é enfático em dizer que a origem deste simbolismo é o texto mágico do Picatrix. Em nenhum momento ele cita a Kaballah como origem e seria pouco provável ele omitir isso. (p.76) Apesar da incompatibilidade entre a cabala e a alquimia Gershom Scholem mostra que a alquimia e a Cabala tornaram-se amplamente sinônimas entre os teósofos e alquimistas cristãos da Europa a partir do século XVII como nas obras de Thomas Vaughan (1641-1666) e Robert Fludd (1574-1637). Tal mudança pode ser explicada segundo Kopp, pois entre os círculos esotéricos  "a Cabalá foi apenas a isca, principalmente tal como empregado nos títulos dos livros, para atrair leitores curiosos comprar livros de autores que não sabiam nada sobre esse tipo do conhecimento oculto."(p.84). A conexão da Cabala Judaica com um simbolismo alquímico-místico de caráter cristão foi finalmente adotado por Friedrich Christoph Oetinger a partir de textos publicados e interpretados por cristãos do Zohar.[1]

[1] SCHOLEM, GERSHOM. Alchemy and kabbalah, New York: Spring Publications, 2006



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Doação de Constantino

  Marc Bloch observa a ocorrência de falsificações piedosas tais como a pseudo doação de Constantino ( Constitutum Donatio Constantini ) ao ...