Ruy Nunes mostra que o método do sic et non em Pedro Abelardo (1120) já estava presente entre os gregos por exemplo no tratado De anima de Aristóteles.[1] O Sic et Non mostra uma argumentação em que os conteúdos da fé não são dados diretamente pela revelação, sempre sujeitas à subjetividade do intérprete humano. O saber cristão deixa de assumir uma especificidade particular e passa a seguir uma epistemologia geral, o que é reforçado com a incorporação dos trabalhos de Aristóteles que ganham nova difusão a partir do século XII.[2] Para Dante, Aristóteles era “o mestre dos que sabem”.[3] Para David Lindberg “a poderosa influência de Aristóteles no final da antiguidade e sua dominância a partir do século XIII através do Renascimento resultou não de uma subserviência intelectual por parte dos eruditos destas épocas ou da interferência por parte da Igreja, mas do extraordinário poder explicativo do sistema científico e filosófico de Aristóteles. Aristóteles prevaleceu através da persuasão, não da coerção”.[4] Abelardo reconhece uma limitação no conhecimento humano que não é capaz de aprender as diferenças específicas das coisas sensíveis a não ser formular hipóteses a partir de diferenças acidentais.[5] Iam Mortimer observa que o impacto do racionalismo de Pedro Abelardo foi muito grande, sendo seguido por inúmeros discípulos e pelas universidades: “por ter contribuído para tornar Aristóteles o mais importante filósofo dos estudos dos intelectuais do século XII, por seu desenvolvimento da teologia, por sua ética, por seu raciocínio crítico e pelo impacto indireto nas leis morais de toda a cristandade por sua influência em Decretum [texto jurídico de Graciano], acho que Pedro Abelardo é o principal agente de transformações do século”.[6] As doutrinas racionalistas de Pedro Abelardo entraram em conflito com as teses de Bernardo de Clairvaux/Claraval tendo sido condenadas no Concilio de Sens em 1140. Para Bernardo de Claraval as teses de Pedro Abelardo não eram passíveis de discussão pois a fé ou se aceita ou se recusa, o dogma deve ser tratado em bloco e não pode ser questionado em suas partes. [7]
[1] NUNES, Ruy Afonso da
Costa. História da educação na idade média, Campinas:Kirion, 2018, p.272
[2] BOUREAU, Alain. Fé. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do
Ocidente medieval. v.I, São Paulo:Unesp, 2017, p. 467
[3] BOWRA, Maurice. Grécia
Clássica, Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1969, p. 122
[4] LINDBERG, David C. The
Beginnings of Western Science. University of Chicago Press. Edição do Kindle. 2007,
p.66
[5] COSTA, José Silveira
da. A escolástica cristã medieval, Rio de Janeiro, 1999, p.40
[6] MORTIMER, Ian. Séculos
de transformações. Rio de Janeiro:DIFEL, 2018, p. 77
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