domingo, 20 de fevereiro de 2022

A invenção da seda chinesa

 

Por volta de 2600 a.c. na China Lei-Tsu a concubina chefe do imperador Huang Ti descobriu que poderia desenrolar um delicado fio de seda do casulo de um inseto (mbobix mori) que ficou conhecido como bicho da seda o que deu origem a um lucrativo comércio inicialmente restrito aos membros da família real e da nobreza[1]. Os métodos previam submergir os delicados casulos em água quente para matar a crisálida e remover a cera que mantém as fibras presas umas às outras.[2] Em 1132 a.c já se tingia a seda para os vestidos na dinastia Shang.[3] Seda chinesa da dinastia Shang foi encontrada em tumbas egípcias, testemunho do comércio na região.[4] Uma pintura em tábua encontrada na província de Xinjiang na China datada de 600 d.c relata a história de uma princesa que escondeu o bicho da seda e sementes de amoreira (as folhas de amoreira são o alimento do bicho da seda) em um enfeite real em sua cabeça para levar a tecnologia ao reino distante da Índia de onde havia sido enviada em casamento[5]. Abbott Usher, contudo, relata que a indústria da seda já estava estabelecida no décimo século a.c.[6] Uma primeira tentativa de produção de seda na Europa teria sido realizada com o imperador Justiniano em 530, em que segundo a lenda ovos de bicho da seda foram transportados para Constantinopla, provavelmente por Khotan, em bengalas ocas ou gomos de bambu[7], de dois monges do Monte Athos[8] nestorianos[9]. Esta história foi trazida por Joseph Needham porém Frances Gies questiona alguns pontos obscuros pois não está claro como os bizantinos teriam aprendido o modo de desfiar a seda e fazer o processamento dos fios apenas com os casulos, ademais o Oriente continuou sendo fornecedor de seda até o século XII[10]. De Bizâncio a técnica foi difundida para a Síria, Grécia e Sicília, no entanto a seda bizantina não conseguir fazer cessar as importações de seda chinesa que continuava com uma qualidade superior, o que mostra que o processo de transferência de tecnologia não foi completo.[11] O monopólio chinês da seda, por sua vez, se manteve até meados do século VI quando seus segredos foram roubados da China, levados para Bizâncio e introduzidos na Europa. De fato, a China foi muitas vezes conhecida como Seres ou Sina, nomes derivados do chinês ssu que significa seda[12].

[1] LOON, Hendrick. História das invenções: o homem fazedor de milagres, Sâo Paulo:Brasiliense, 1961, p.61; COUTEUR, Penny le; BURRESON, Jay. Os botões de Napoleão: as 17 moléculas que mudaram a história. Rio de Janeiro:Zahar, 2006, p.99

[2] GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 83

[3] BARRETO, Elias. Enciclopédia das grandes invenções e descobertas. São Paulo:Cascino Editores, 1971, p.42

[4] https://www.ancient.eu/Silk/

[5] MacGREGOR, Neil. A história do mundo em 100 objetos, Rio de Janeiro:Intrínseca, 2013, p.363; ZISHKA, Anton. A guerra secreta pelo algodão, Porto Alegre: Globo, 1936, p. 18

[6] USHER, Abbott. Uma história das invenções mecânicas, Campinas:Papirus, 1993, p. 81

[7] LOON, Hendrick. História das invenções: o homem fazedor de milagres, Sâo Paulo:Brasiliense, 1961, p.62

[8] SINGER, Charles; HOLMYARD, E. A history of technology, v.II, Oxford, 1956, p.197; DELORT, Robert. Animais. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean Claude. Dicionário analítico do Ocidente medieval. v.I, São Paulo:Unesp, 2017, p. 74

[9] DERRY, T.; WILLIAMS, Trevor. Historia de la tecnologia: desde la antiguidade hasta 1750, Mexico:Siglo Vintuno, 1981, p.147

[10] BRAUDEL, Fernand. Civilização material e capitalismo, séculos XV-XVIII, Rio de Janeiro:Cosmos, 1970, p.264; GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 50

[11] PERROY, Edouard. A idade média: preeminência das civilizações orientais, tomo III, v. I, São Paulo: Difusão, 1974, p. 51

[12] RONAN, Colin. História Ilustrada da Ciência: Oriente, Roma e Idade Média. v.2, São Paulo:Jorge Zahar, 2001, p.28, 29, 64; GIES, Frances & Joseph. Cathedral, forge and waterwheel, New York: Harper Collins, 1994, p. 83



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