sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Ribeiro Sanches e o papel da colônia do Brasil na construção do conhecimento

 

A renovação cultural promovida pelo marquês de Pombal permitiu a maior penetração das teses iluministas em Portugal apesar de seu governo despótico. Em 1746 Luis Verney havia publicado um libelo contra o ensino jesuítico em Verdadeiro método de estudar, e em 1760 Antonio Ribeiro Sanches publicara Cartas sobre a educação da mocidade e em 1763 Apontamentos para fundar-se uma universidade real em que sugere: “Parece que satisfariam ao último fim que deve ter a Universidade que vou propondo, os três Colégios seguintes. O primeiro de Filosofia, Matemáticas e Humanidades. Segundo de Medicina, e Cirurgia, e de todas as partes de que consta esta Ciência. O terceiro da Jurisprudência, governo dos Estados, e Leis do Reino”.[1] Ribeiro Sanches, Luis Verney, José Monteiro da Rocha e Domingos Vandelli participaram ativamente da reforma de ensino em Portugal do século XVIII reflexo da renovação intelectual promovida por D. João V. O médico Ribeiro Sanches, membro da Academia de Ciências de Lisboa, discípulo de Hermann Boerhaave, nos Apontamentos de 173 ele trata não somente da reforma na Univerisdade como mas de políticas de Estado que busquem incentivar culturas agrícolas e a pesquisa de plantas nativas das colônias, em especial o Brasil, que pudessem servir para a Medicina: “Se a America Portugueza estivesse estabelecida desde a sua primeira origem na agricultura unniversal e no commercio, teríamos hoje muitos conhecimentos das suas producções que totalmente ignoramos. Parece que até agora não se avaliou aquelle domínio se não para dominar os gentios, e tirar ouro das suas minas; não considerando por riqueza aquella que provem da agricultura [...] Se uma vez se assentar por cousa certa, que necessita o Estado conhecer as produções dos seus domínios, e tirar delas toda a utilidade possível, ninguém duvidará que lhe são necessários homens instruídos”.  As Expedições Filosóficas para as colônias, coordenadas por Domingos Vandelli, a partir da Universidade de Coimbra reformada, são um reflexo desta política pleiteada por Ribeiro Sanches. Gisele Conceição mostra que Ribeiro Sanches estava inserido em uma intensa rede de comunicação que envolvia cientistas de diferentes nacionalidades, de tal forma que, que mesmo sem nunca ter estado no Brasil, reporta em uma de suas cartas escritas em 1763 as descobertas medicinais sobre a quina, ipecacuanha e o óleo de copaíba, usados na colônia: “Se fecharmos o cerne da discussão no ambiente europeu ou no colonial, excluímos algumas possibilidades de análise e deixamos de lado algumas características singulares do processo de construção do conhecimento científico. No caso de Portugal e do Brasil, isso é evidente. Primeiro, porque a circulação do conhecimento não se dava apenas entre o Reino e a Colônia, mas sim em um universo mais amplo, que envolvia muitos agentes e territórios. Se pensarmos no processo como sendo circulatório e não unidirecional, podemos perceber que o conhecimento se difundia de maneira muito mais complexa e que seus processos de construção de conhecimento se davam em vários momentos, em diversos territórios e pelas mãos dos mais variados agentes produtores”.[2]



[1] http://www.estudosjudaicos.ubi.pt/rsanches_obras/aponts_universidade_reino_conveniente.pdf

[2] CONCEIÇÃO, Gisele. Ciência, poder e circulação de conhecimento no século XVIII: Ribeiro Sanches e o Brasil colonial, Topoi. Revista de História | Volume 20, Número 42 | Setembro – Dezembro 2019 http://revistatopoi.org/site/topoi-42/



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