Em 1789 no engenho Santana na Bahia de 300 escravos, o
escravo Gregório Luís liderou, sem sucesso, uma revolta de escravos. Eles
exigiam entre outras condições a possibilidade dos escravos o direito de
revender no mercado o que conseguissem produzir em hortas a serem cedidas pelo
senhor de engenho Manoel da Silva Ferreira.[1] Ciro
Flamarion identifica este proto campesinato negro que cria oportunidades a que
se chama de “brecha camponesa”. Nos trabalhos “A brecha camponesa no
sistema escravista” (1979), “As concepções acerca do “sistema econômico
mundial” e do “antigo sistema colonial”: a preocupação obsessiva com a “extração
de excedente” (1980) e “Escravo ou camponês? O protocampesinato negro
nas Américas” (1987), Ciro Cardoso procurou enfatizar os elementos econômicos
de ordem interna em especial o papel, ainda que secundário, da economia
autônoma dos escravos, que se destaca em relação ao plantation voltado à
exportação de produtos coloniais, em uma crítica a perspectiva de autores como
Fernando Novaes que se limitam a descrever a economia colonial como um apêndice
da economia europeia. Ciro Flamarion ao contrário do que afirma Jacob Gorender,
destaca que era comum os senhores de engenho concederem aos escravos pequenos lotes
de terras juntamente com o tempo disponível para cultivá-los, sendo raro o
envio de feitores para essas roças no sentido de vigiar os cativos. Segundo
Ciro Flamarion (figura): “Por “brecha” não entendemos de forma alguma, um elemento
que pusesse em perigo, mudasse drasticamente ou diminuísse o sistema
escravista. (...) O que queremos significar (...) é uma brecha para o escravo,
como se diria hoje “um espaço”, situado sem dúvida dentro do sistema, mas
abrindo possibilidades inéditas para atividades autônomas dos cativos”.[2] Jacob Gorender, por sua vez, Gorender nega a existência de uma “brecha camponesa”,
pois a considera parte integrante do que chama de “modo de produção
escravista colonial”. Robert Slenes entende que “não é mais nem brecha
nem, a rigor camponesa”, aproximando-se mais do que os historiadores
norte-americanos chamam de “economia interna dos escravos”, isto é, “um
termo que abrange todas as atividades desenvolvidas pelos cativos para
aumentarem seus recursos, desde o cultivo de roças à caça e, inclusive, ao
furto”.[3] Russel Wood destaca que os escravos rurais por lei tinham garantida um dia
da semana para trabalhar em suas roças , no entanto, na prática normalmente
esse direito era negado pelos seus proprietários que ocupassem esse
tempo vago para cortar lenha, consertar redes de pesca ou limpar o mato.[4] Barickman em estudo sobre os engenhos de
açúcar no Recôncavo baiano entre 1780-1860 mostra que embora fosse comum os
proprietários permitirem aos escravos cultivar suas próprias roças sua produção não
atendia às necessidade de sobrevivência sendo muito pequeno o excedente.[5]
[1] GOMES, Laurentino.
Escravidão, v.II, São Paulo: Globo, 2021. p.276
[2] GARCIA, Simone Pereira.
Ciro Flamarion Cardoso e a questão da brecha camponesa. Revista Tempo Amazônico
| V. 1 | N. 1| janeiro-junho de 2013 | p. 5-16
[3] SLENES, Robert. Na
Senzala, uma Flor: esperanças e recordações na formação da família escrava,
Brasil Sudeste, século XIX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999, p. 199
[4] RUSSELL WOOD, Escravos e libertos no Brasil colônia, Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2005, p.66, 175
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